É tempo de abandonarmos lógicas fanáticas e ideológicas e usarmos a nossa inteligência para enfrentarmos os desafios com que nos confrontamos.
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O clima e o Caos
Edward Lorenz, físico e meteorologista ficou conhecido pela sua parábola da borboleta. Seis décadas depois de ser formulada, relembro-a aqui, seguindo o site da ‘American Physical Society’.
Matemático e meteorologista, Edward Lorenz foi pioneiro na utilização de meios informáticos para testar modelos matemáticos baseados em equações diferenciais de previsão meteorológica. Por mero acaso, quando para poupar espaço na impressão resolveu arredondar de seis para três casas decimais um dos dados do sistema (de .506127 para .506) e constatou que, contrariamente à sua expectativa, os resultados obtidos nos dois casos foram radicalmente diferentes. Lorenz concluiu que uma pequena variação numérica, semelhante a um pequeno sopro de vento, poderia ter um impacto brutal nas condições climatéricas, conclusão que ficou conhecida como ‘o efeito borboleta’: ‘as equações não lineares que governam o clima têm uma sensibilidade tão incrível às condições iniciais, que uma borboleta batendo as asas no Brasil poderia desencadear um tornado no Texas’.
A noção de que os fenómenos meteorológicos são de uma extrema complexidade é anterior às descobertas de Lorenz; por exemplo, Stanley Jevons quando fundou a teoria do valor que continua a ser seguida internacionalmente, considerou o fenómeno da determinação do valor com uma complexidade aproximada à meteorológica.
A noção da não-linearidade, e mesmo caráter caótico, dos fenómenos meteorológicos foi a partir dos anos 1960 tida como consensual. Em 1983, por exemplo, no filme de ficção ‘O Dia Seguinte’, o impacto antropogénico no clima levava à disrupção da corrente do Golfo, a tremendas inundações (o essencial do filme passa-se numa cidade de Nova Iorque submersa) e a uma idade do gelo, ou seja, ao resultado oposto ao que sistemas lineares de equações diferenciais (usadas na meteorologia tal como na teoria económica) fariam prever.
Surpreendentemente, uma década depois, por alturas da histórica cimeira do Rio, a perspectiva contrária, segundo a qual se podem encontrar modelos que transformam de forma quase linear toneladas de carbono na atmosfera em graus de temperatura (estes mesmos graus, passíveis de representar de forma igualmente quase linear a complexidade de factores que caracterizam o ‘clima’) tornou-se não só dominante, mas como se transformou mesmo numa nova religião, feita de fé, dogmas, excomunhões e pregações.
No altar da nova religião foi sacrificado o princípio científico da dúvida metódica, o da confirmação pela experiência das teses defendidas – e os supostamente infalíveis modelos construídos têm já décadas de história – ou, mais importante ainda, a sua validação pela história climática. Foram igualmente secundarizadas todas as preocupações ambientais, que passaram a ser tidas em consideração apenas na medida em que servem as teses defendidas.
As Nações Unidas – e na sua sequência a generalidade dos actores sociais – chegaram mesmo ao ponto de falar de orçamentos de carbono e a determinar a altura do ano em que o mesmo seria gasto, a fim de manter uma subida máxima de 1.5° de temperatura, como se tal raciocínio fosse alguma vez possível.
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Os mares e o clima
O fenómeno mais impressionante retratado em ‘O Dia Seguinte’ é o da subida do nível do mar, e os modelos climáticos têm feito da medida dessa subida um dos seus pontos mais importantes. Entre outras coisas, e para tentar esconder o falhanço do que preveem, esses modelos têm-se dedicado a distorcer a realidade, apresentando a subsidência das terras costeiras, devido à sobre-extracção de água do subsolo e areia da costa, como subidas do nível do mar.
A realidade é que, num prazo extremamente curto de tempo, nos últimos 20.000 anos, o nível do mar subiu cerca de 130 metros, sendo mal conhecidas e estudadas as condições em que se deu esta subida e a sua relação com a subida de temperatura (que aqui a NASA relaciona, sem fundamentar, com uma subida de 4° de temperatura).
É difícil de entender que a investigação climatérica não se dedique a estudar essa profunda e recente mudança do clima para encontrar pistas de entendimento para a presente mudança climática, aparentemente, por não poder determinar uma causalidade com o consumo de hidrocarbonetos nessa mudança climática.
A doutrina climática afirma também a urgência e a prioridade absoluta das suas equações carbónicas sobre qualquer outra questão, sem se dar ao trabalho de explicar porquê. Como tenho repetidamente dito, é inaceitável que a religião climática sirva de cobertura para a indústria nuclear com o argumento implícito de que um aumento de temperaturas é mais perigoso do que uma catástrofe nuclear sem dar qualquer argumento relativo aos perigos colocados pela indústria nuclear para justificar essa posição.
A doutrina climática tem uma atitude semelhante perante qualquer outro facto que ponha em causa a linearidade da catástrofe carbónica. Por exemplo, estudos recentes concluíram que uma série de extinções em massa ocorridas há trezentos milhões de anos resultaram da eutrofização dos Oceanos, num processo que se está hoje igualmente a desenvolver como resultado da intensificação agrícola.
Em vez de constatar o óbvio – que é preciso olhar para a intensificação agrícola como um problema pelo menos tão importante como o do carbono atmosférico – a doutrina climática, invertendo os termos da realidade, conclui que a eutrofização exacerba os efeitos do aumento de temperatura, quando manifestamente é o aumento da temperatura que pode exacerbar os efeitos da eutrofização.
Para além da eutrofização, há o seu equivalente em terra, que é o da desertificação por via de salinização, que é totalmente ignorado pelas projecções climáticas.
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O impacto da desertificação terrestre e aquática
Mas a mais importante questão ambiental camuflada pela religião climática – e isto porque, entre outras coisas, pode ter um impacto climatérico mais importante do que qualquer emissão de carbono – é a da utilização massiva de nitratos para a intensificação agrícola que ocorreu a partir de meados do século passado, coincidindo, mais do que qualquer emissão de dióxido de carbono, com aumentos globais de temperatura.
O óxido e o dióxido de nitrogénio (conhecidos pela sigla NOx) são gases extremamente nocivos para a saúde. Um estudo científico publicado em 2018 concluiu que, na Califórnia, a agricultura intensiva dava uma contribuição para a emissão destes gases estimada entre 20% e 51%.
Em determinadas circunstâncias – em especial nas zonas marinhas eutrofizadas a que fizemos referência, mas também em solos agrícolas – a partir dos NOx ou de outras formas, forma-se o óxido de nitrogénio (N2O) que é 300 vezes mais produtor de efeito de estufa do que o dióxido de carbono, e que, de acordo com as estimativas oficiais, devido à sua concentração, ocupa o terceiro lugar nos gases com efeito de estufa. Entre outros problemas causados por este óxido está o facto de, em altitude, destruir o ozono que nos protege para formar de novo NOx.
Este terceiro lugar não tem em conta, o facto de tanto o dióxido de nitrogénio como o metano (segundo contribuinte para esse efeito de estufa, parcialmente também resultado da intensificação agrícola) estarem a aumentar mais rapidamente do que o dióxido de carbono; que este dióxido de carbono tem impactos positivos no ambiente (alimenta mais vigorosamente o crescimento das plantas) e, salvo o efeito de estufa, sem impactos negativos na saúde, enquanto o dióxido de nitrogénio não tem qualquer impacto positivo e tem vários negativos.
Não tem em conta tão pouco que a desertificação que resulta da salinização, outro dos efeitos da intensificação agrícola, diminui a capacidade de absorpção de dióxido de carbono pela vegetação. A eutrofização das águas resulta igualmente na produção adicional de dióxido de carbono (e de metano).
Avaliar todos estes impactos apenas em função do aumento das temperaturas é um erro que se pode revelar catastrófico por duas razões. A primeira é que se escondem todos os restantes impactos negativos das agressões ao ambiente, que podem, por si mesmas, levar a consequências catastróficas como já aconteceu no passado. A segunda é que, como bem entendeu Lorenz, aquilo que sabemos é apenas que é provável que o aumento de emissões de gases de estufa levem a mudanças climáticas potencialmente catastróficas, mas não sabemos medir linearmente essas consequências.
A pregação como certos de efeitos que se podem ou não verificar, com o absurdo argumento de que só assim se assustam as pessoas, pode levar facilmente ao conhecido efeito da fábula de Pedro e o Lobo, descredibilizando os esforços necessários para preservar o ambiente.
É tempo de abandonarmos lógicas fanáticas e ideológicas e usarmos a nossa inteligência para enfrentarmos os desafios com que nos confrontamos.