“Que diferença faz quem fala?”
Michel Foucault
No adro da Igreja Matriz e sob o olhar atento do Anjo Gabriel juntara-se o povo em círculo.
As mulheres vestidas de preto, os homens com os seus fatos cinzentos. A maior parte estivera na missa de corpo presente por alma do inventor.
– Mas qual a razão desta morte? Dissera a vizinha de Pepe Mão de Fada.
– É necessário alguma razão para morrer? Disse com certa rispidez o dono da tasca frequentada de longe em longe pelo inventor. Bagaço, só bebia bagaço, nada mais do que um bagacinho para as noites mais frias.
– Falavam de quê? Insistiu a vizinha.
– De tudo e de nada. Do tempo. Do sol. Da chuva. Da música, da música da floresta, obsessão maior do inventor. (Do vento a silvar entre as ramagens dos pinheiros e eucaliptos.).
A vida do inventor continua um enigma difícil de entender.
(Mas o que é que ele inventou quando ainda não era este cadáver que assiste impávido e sereno à missa de corpo presente?).