Os tipos espertos seguem um princípio: como vencer na vida sem fazer força. A receita é a imagem. Ter uma imagem. Vasco Pulido Valente criou uma imagem com várias máscaras: um rebelde, um intelectual não orgânico, um oposicionista independente, em resumo: um tipo inteligentíssimo! Um tipo esperto, na realidade.
Na coluna de VPV no Público, na sua apreciação semanal, ele escreve um apontamento contra a regionalização, a propósito de uma entrevista de João Cravinho, e faz uma confissão demolidora para a respectiva imagem: João Cravinho foi seu controleiro! VPV tinha um controleiro!
O rebelde, afinal andava pela mão e ia recolher ensinamentos de um controlador. Um padrinho a quem antigamente os meninos pediam a bênção. A bênção padrinho. A quem os padrinhos ofereciam os sapatos nos dias de aniversário, para terem boas bases!
Mas o falso rebelde VPV também afirma que a esquerda (leia-se, quem lutou contra a ditadura) não consegue conviver com a democracia.
Ele sim. Com o devido controlo, claro. Pressupõe a afirmação. Na realidade não há registo de VPV na luta contra a ditadura, a não ser a pertença a uns grupos que publicavam umas revistas de jovens universitários de bom nascimento, de reduzida difusão e menor intervenção. Inócuas. Quanto à rebeldia limitou-se a ser castigado no liceu por mau comportamento e a família colocou-o no Colégio Nun´Alvares, de Tomar (onde eu também estudei). Passou pela Universidade Portuguesa, teve bolsa de estudos em Inglaterra, concedida pela Gulbenkian. Não cumpriu o serviço militar, nem, menos ainda, passou pelas guerras coloniais, não integrou nenhuma das lutas académicas do final dos anos 60 e início dos 70. Vivenciou-se, como hoje se diz, em Oxford.
Após o 25 de Abril, finda a guerra e derrubada a ditadura, VPV apresenta-se em Portugal com as credenciais de inteligente, culto e intrépido lutador pela liberdade para dar o seu contributo à democracia, num lugar de professor/investigador nas novas escolas de estudos humanos, com a imagem de intelectual livre-pensador. Independente, ainda mais. Tanto que colocou a sua inteligência ao serviço de Sá Carneiro, necessitado de uns pós de rebeldia e de cultura na imagem cinzenta e paroquial da AD que reunia a direita que sobrevivera da ANP.
VPV foi secretário da cultura sem história a não ser a informalidade snob com que despachava no gabinete. Ainda foi deputado pela direita. Sem registo de esforço, nem caroço. O país não o merecia. Continuava a estrumeira de que se queixara o rei Carlos de Bragança. VPV entendia-se o Eça de Queiroz do novo regime, mas dava trabalho… ficou-se pela intenção e pela pose de desdenho.
Registo um bom, um excelente romance – Glória – e uma tese inovadora sobre as campanhas de Mouzinho de Albuquerque em Moçambique e a prisão de Gungunhana no argumento do magnífico filme/série Aqui-del-Rei, de António-Pedro de Vasconcelos. Que a direita colonialista não entendeu, ou nem sequer leu, ou viu. Tratavam ambos do colonialismo.
Mas VPV sempre projectou de si a imagem de um rebelde a quem ninguém colocava coleiras. Incompreendido sempre que foi necessário justificar a sua inaptidão para o trabalho continuado e estruturado ao serviço de uma ideia. Na realidade nunca se rebelou. Foi sempre de uma azeda mansidão. Um maldizente que por vezes tinha graça.
Através desta confissão no Público, ficamos a saber que, afinal, VPV tinha um controleiro, que era afinal membro de um rebanho, provavelmente reduzido, mas que aceitava o pastoreio. Embora também saiba do humor de João Cravinho, creio que as sessões de controlo deste sobre VPV não deveriam ser muito penosas para este, pouco dado a incomodidades e secas. Também de humor cáustico, mas sempre sem espelho.
Se VPV era mesmo dotado de uma excepcional inteligência (de que em Tomar, num ambiente de grande exigência para os alunos do Colégio, a todos os níveis, do intelectual ao da personalidade, ninguém deu nota) esta confissão revela a sua decadência. VPV, com a confissão da sujeição ao controleiro Cravinho, destrói a imagem com que viveu e bem durante toda a vida, sem fazer grande força: a do pensador livre.
Afinal o Vasco ia à catequese e cumpria os mandamentos. É uma desilusão para os crentes. De facto, ele, no CNA portou-se sempre benzinho. Não havia ali pão para malucos, nem paciência para meninos mimados.
Que ele, que tão comodamente conviveu com a ditadura, afirme que a esquerda convive mal com a democracia é apenas o reflexo de um carácter muito moldável e dado às comodidades, digamos assim. O carácter de um videirinho, como tantos. Lá se foi a imagem do rebelde.
Que a direita defensora da ditadura, do colonialismo, da guerra colonial, da Pátria e da Família tenha adoptado o VPV como seu intelectual orgânico também é sintomático da congénita pobreza de carácter da direita portuguesa, de quem o VPV se diverte a expor os podres e as baixezas.
Estão, o VPV e a direita, muito bem uns para os outros. Com controleiros e tudo.
Um apontamento final: sou um opositor decidido de qualquer programa de regionalização de Portugal. Mas nunca tive controleiro.
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