Exposição Colectiva no Casino Estoril, patente na Galeria de Arte de 25 de Novembro a 10 de Janeiro. Segundo a organização esta “exposição é pelo número de trabalhos expostos e qualidade dos 31 artistas participantes, uma mostra representativa do estado da Arte em Portugal, nas modalidades de Pintura e de Escultura”.
No dia 25 de Novembro a nossa colaboradora Filipa Oliveira Antunes expôs, em Exposição Colectiva, no XXXI Salão de Outono da Galeria de Arte do Casino do Estoril, um Tríptico, criado especialmente para este Evento.
Filipa Oliveira Antunes é arquitecta, doutorada em urbanismo e professora na Universidade Lusófona. Colabora no “Tornado” desde Fevereiro de 2017, regularmente, aos Domingos, em parceria com João de Almeida Santos, na publicação de poesia com ilustrações inéditas de sua autoria.
Conhecedores da qualidade do trabalho da Filipa Oliveira Antunes tínhamos apostado que o Tríptico seria vendido na primeira hora da exposição. Enganámo-nos por 59 minutos. Foi vendido no primeiro minuto. Reparabéns Filipa!
É, por isso, com redobrada alegria que damos notícia de que a partir de hoje está exposto um NOVO Tríptico da nossa colaboradora, apresentado juntamente com o texto de João de Almeida Santos, cúmplice desta ousadia.
A Janela“
Tríptico de Filipa Oliveira Antunes
Dimensões:
- Cada elemento do tríptico: 60X60
- Totalidade do tríptico: 180X60
Características técnicas:
- Acrílico e verniz sobre tela
Um comentário sobre…
A JANELA
Tríptico de Filipa Oliveira Antunes
A janela é uma mina infindável de inspiração. Picasso, Dalí, Matisse e tantos outros pintaram janelas. De dentro para fora. Porque, de dentro, ficamos mais envolvidos. O pintor convida-nos a olhar na sua perspectiva, pilotando e mapeando a viagem, uma visão do mundo a experienciar com todos os sentidos. Da janela vemos o mundo e não só o exterior. Também vemos o nosso. Como projecção de desejos e de liberdade, às vezes sufocados. A janela é vida e sonho! E Peter Pan, quando voou da janela para a Terra do Nunca, não queria crescer por fora para crescer muito por dentro. Uma dinâmica entre o exterior e o interior da nossa própria humanidade. Mas a janela também ilumina e sinaliza vida: nela projectamos a nossa visão imaginária do que se passa no seu interior. As janelas dialogam entre si e como comunidade, por exemplo, em torno de um pátio. São espelho umas das outras. Vimos com Hitchcock como se desenvolve esta dialéctica entre janelas!
Filipa Oliveira Antunes retomou aqui este tema, deixando a janela aberta para a praça circunstante e inspirando-se na de Palazzo Adriano, tão bem evocada por Tornatore em “Cinema Paradiso”. Duplo acesso: directo ou indirecto, através dos reflexos da praça na vidraça. Estar na praça sem sair da janela… sequer com o olhar! Incluída a visita à árvore, em explosão de cores, ou ao feixe de luz que atravessa a janela para se reflectir nessa porta luminosa evocativa do Velázquez de “Las Meninas”. Riqueza intertextual, portanto, com vestígios de classicismo e com algum sabor a De Chirico. Não se trata, pois, de uma janela abandonada à força evocativa ou invocativa das formas ou à pregnância das cores. Na janela há um diálogo quase imperceptível entre uma transparência feminina e uma silhueta em fuga reflectida na vidraça, um adeus indiciado na sobreposição em reflexo e forma das duas silhuetas! Nele domina esse perfil feminino em posição estática, quase hierática, sobre a silhueta que se esfuma, dinâmica, num horizonte que se vislumbra apenas como reflexo. O ambiente é algo desértico, silencioso e melancólico, iluminado por uma multiplicidade difusa de cores, e de rigorosa proporção – ancorada na “secção áurea” fibonacciana – de formas e figuras. A linguagem estética e a semântica estão ancoradas nas transparências impressas na vidraça e na centralidade do perfil feminino. O vidro funciona como transparência e espelho. Toda a obra parece, pois, estar ancorada neste diálogo, abraçado pela tonalidade variegada das cores e pela exacta geometria das formas, e sobretudo nesse perfil de mulher em relação polissémica com o conjunto.
Transparências, cores múltiplas em diálogo, reflexos baços, silêncio induzido por formas “frias” em rigorosa proporcionalidade e pela nudez do ambiente, uma certa planeza do conjunto, mas também por uma relação humana que, na dinâmica das transparências e reflexos, parece desfalecer – tudo poderia aludir a uma visão fria e melancólica do mundo não fosse o jogo policromático que se insinua e dissemina na geometria do espaço. Nota-se na dialéctica das superfícies planas a presença de algum pós-modernismo. Mas é na Gestalt cromática e geométrica do Tríptico que reside a beleza, na proporção das formas e no suave equilíbrio policromático donde se desprende uma certa melancolia crepuscular. Esta janela, na sua beleza “fria”, é um pouco simulacral e por isso devolve ao nosso olhar uma visão do mundo plana, sem fugas ou profundidade, apesar da praça e da velazquiana porta que indicia uma saída/fuga – Ausgang. A própria silhueta em fuga vive apenas como reflexo…
No “fim” do percurso, assistimos a uma suave explosão cromática, manto explosivo que invade como chuva o conjunto, transformando essa frieza aparente em exuberante performance sensorial que “resolve” o processo construtivo e analítico da obra, conferindo-lhe forte unidade expressiva. Este discurso sensorial revela-se, com autonomia, também em cada secção, num exercício que aspira simplesmente à beleza, tornando-se, além de belo – pela leveza, exactidão das formas e harmonia policromática -, muito expressivo pela multiplicidade relacional dos seus elementos compositivos, referenciais e intertextuais. Este resultado, assente em camadas sobrepostas que evoluem para uma forte unidade expressiva, reforça uma característica essencial da obra de Filipa Oliveira Antunes: a exigência de mediação reflexiva para um acesso integral do observador ao valor expressivo e polissémico da obra.
Estoril, 11 de Dezembro de 2017. João de Almeida Santos