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Sábado, Novembro 2, 2024

A passividade do Governo agrava a situação do desemprego e da economia

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

Um país e uma economia em dificuldades e não preparada para enfrentar a crise do “coronavírus”, um governo que adia atuar, e a situação dramática dos desempregados cujo número não para de aumentar

Para se poder compreender a verdadeira situação que o país e portugueses enfrentam atualmente, assim como as dificuldades que se verificam para a ultrapassar, é necessário ter presente alguns dados importantes que dão uma ideia clara, objetiva e global da situação do país e da economia determinada por politicas seguidas durante os últimos anos. Neste estudo disponibilizamos alguns desses dados para reflexão do leitor e para que depois forme a sua própria opinião, que é o mais importante.

 


Estudo

Um país e uma economia em dificuldades e não preparada para enfrentar a crise do “coronavírus”, um governo que adia atuar, e a situação dramática dos desempregados cujo número não para de aumentar

Para se poder compreender a verdadeira situação que o país e portugueses enfrentam atualmente, assim como as dificuldades que se verificam para ultrapassar uma crise grave como é atual, é necessário ter presente dados importantes que dão uma ideia clara, objetiva e global da situação do país e da economia determinada por politicas seguidas durante anos que fragilizou muito o país que agora a crise causada pelo “coronavírus” veio apenas tornar visível.

 

O desinvestimento na educação em Portugal é causa para que mais de 405 da população empregada tenha só o ensino básico ou menos, quase o dobro da média dos países da U.E.

O quadro 1, com dados oficiais do INE, mostra a situação real do país neste momento.

 

Quadro 1 – O Emprego em Portugal segundo os níveis de escolaridade – 2011/2020 – INE

Anos Com ensino Básico Milhares Com ensino secundário Milhares Com ensino superior Milhares Emprego Total Milhares Básico % do Total Secundário % do Total Superior % do Total
2011 2 913 935 891,8 4 740 61,5% 19,7% 18,8%
2012 2 671 950 926 4 547 58,7% 20,9% 20,4%
2013 2 474 1 010 945 4 429 55,9% 22,8% 21,3%
2014 2 343 1 081 1 076 4 500 52,1% 24,0% 23,9%
2015 2 282 1 133 1 133 4 549 50,2% 24,9% 24,9%
2016 2 227 1 182 1 196 4 605 48,4% 25,7% 26,0%
2017 2 264 1 260 1 233 4 757 47,6% 26,5% 25,9%
2018 2 234 1 329 1 304 4 867 45,9% 27,3% 26,8%
2019 2 134 1 405 1 374 4 913 43,4% 28,6% 28,0%
2º Trimestre 2020 1 929 1 380 1 422 4 731 4 40,8% 29,2% 30,1%
FONTE: Inquérito ao Emprego 2011/2º Trimestre de 2020 – INE

 

No 2º Trimestre de 2020, ainda 1.929.000 portugueses empregados tinham apenas o ensino básico ou menos, o que corresponde a 40,8% da população total empregada. A média nos países da U.E. é pouco superior a 20%. Contrariamente também ao que acontece em outros países da U.E. a população empregada com o ensino superior é mais elevada do que a  com o ensino secundário, o que revela uma distorção causada por um sistema de ensino não adequado ao desenvolvimento do país. Segundo os Relatórios do OE, entre 2010 e 2020, a despesa publica com o  funcionamento do ensino básico e secundário, a preços constantes de 2010, sofreu uma redução de 2.200 milhões €.

O desinvestimento dos sucessivos governos no aumento do nível de escolaridade e de qualificação dos portugueses é claro, quando é o mais importante para desenvolver o país. Para além disso, durante as crises os mais atingidos pelo desemprego são os trabalhadores de baixa escolaridade. Entre 2011 e 2015, com a “troika” e com Passos Coelho, o emprego diminuiu em 191.000, mas os trabalhadores com o ensino básico ou menos que perderam o emprego atingiu 631.000. Com a crise atual, entre o 4º trim. 2019 e o 2º trim. 2020 já foram destruídos 205.000 empregos mas o número de trabalhadores com o ensino básico ou menos que perderam o emprego já atinge 182.000.

 

O “stock” de capital, ou seja, o investimento em equipamentos e outros meios necessários à produção por trabalhador tem diminuindo em Portugal

O desinvestimento em Portugal em equipamentos e outros meios necessários ao aumento da produtividade do trabalhador tem sido enorme com revelam os dados da Comissão Europeia.

 

Gráfico 1 – Stock capital liquido (investimento) por trabalhador empregado em Portugal a preços constantes Fonte: AMECO – Base de dados da Comissão Europeia

Entre 2013 e 2019, o “sotck” de capital líquido por trabalhador em Portugal diminuiu em 11,7%, pois a preços constantes passou de 124.564€ para apenas 110.034€. No lugar do investimento em equipamentos e outros meios materiais aumentar para que a produtividade por trabalhador aumentasse, o que se tem verificado em Portugal é precisamente o contrário. O novo investimento nem tem compensado aquele que desaparece por obsolescência e pelo uso.

E o Estado tem dado o pior exemplo. Entre 2015 e o 2019, o investimento publico (FBCF) somou 18.192 milhões € mas o Consumo de Capital Fixo (amortizações), ou seja, o que se desgastou ou foi destruído pelo uso ou degradação somou 26.444 milhões €, portanto investiu-se  menos 8.252 milhões do que se “consumiu”.

É essa a causa da degradação profunda de muitos equipamentos públicos (escolas, hospitais, transportes, etc.).Como consequência, a produtividade aparente do trabalho (PIB por trabalhador) teve a evolução revelada pelos dados do INE do gráfico 2.

 

Gráfico 2 – PIB (riqueza criada) por empregado em cada Trimestre a preços constantes – 1.º Trim. 200 / 2.º Trim. 2020 Fonte: INE

A produtividade aparente do trabalho que já tinha diminuído no 1.º trimestre de 2020, caiu no 2.º trimestre de 2020 para apenas 8.876€, ou seja, um valor que é praticamente o verificado no 1º trimestre de 2000 (neste trimestre a riqueza criada em média por trabalhador – PIB por trabalhador – foi apenas de 8.821€), portanto no 2º trimestre de 2020 verificou um recuo de 20 anos.

 

O ganho médio líquido dos trabalhadores em Portugal era apenas 980€ em 2019, o mais baixo da U.E., e com  crise ainda por cima sofreu uma forte redução

Consequência do desinvestimento verificado na educação e em equipamentos, quer da administração publica quer do setor privado, o nosso país tem um perfil de economia assente em baixa produtividade e em baixos salários. O quadro 2  completa o gráfico anterior.

 

Quadro 2 – Ganho médio mensal liquido em Portugal e nos países da União Europeia – 2019

Região / País 2019 Ganho médio mensal liquido (14 meses) ganho liquido mensal em relação a Portugal (base=100%)
União Europeia (média 28 países) 1 808 € 184,4%
Zona Euro (média 19 países) 1 899 € 193,7%
Bélgica 2 149 € 219,2%
Dinamarca 2 643 € 269,6%
Alemanha 2 262 € 230,7%
Irlanda 2 584 € 263,5%
Grécia 1 129 € 115,1%
Espanha 1 546 € 157,7%
França 1 897 € 193,5%
Itália 1 544 € 157,5%
Luxemburgo 3 042 € 310,2%
Holanda 2 671 € 272,4%
Áustria 2 309 € 235,5%
Portugal 980 € 100,0%
Finlândia 2 263 € 230,8%
Suécia 2 347 € 239,4%
Inglaterra 2 546 € 259,6%
Noruega 3 240 € 330,4%
Fonte: Eurostat (o Eurostat publica ganhos médios anuais dividi por 14 para serem mais facilmente entendido as diferenças de país para país e nomeadamente em relação a Portugal)

 

Segundo o Eurostat, em 2019, o ganho médio liquido mensal em Portugal era apenas de 980€, enquanto a média na União Europeia era de 1808€ (+84,4%), na Zona euro de 1.899€ (+93,7%), na Alemanha de 2.262€ (+130,7%), no Luxemburgo de 3.042€ (+210,2%), na Noruega de 3.240€ (+230,4%), etc., etc.. As diferenças de ganhos líquidos entre Portugal e a maioria dos países das União Europeia constantes do quadro 2 são enormes. É evidente que Portugal é um país em que a esmagadora maioria da população tem ganhos muitos baixos, quando comparado com outros países da U.E., o que causa que o impacto da crise económica e social seja maior e mais grave.

 

Em Jul. 2020 apenas 32 em cada 100 desempregados recebiam subsídio de desemprego

E esta gravidade da crise económica e social é ainda aumentada pelo crescimento rápido do desemprego e pelo reduzido número de desempregados que que recebem subsídio de desemprego.

 

Gráfico 3 – O aumento rápido do desemprego em Portugal e o número de desempregados a receber subsidio de desemprego Jan./Jul. 2020 Fonte: INE e Segurança Social

Em apenas 4 meses (março/julho de 2020), o desemprego real em Portugal aumentou de 519.500 para 678.500, enquanto o número de desempregados a receber subsídio de desemprego subiu apenas de 173.815 para 221.765. O aumento do número desempregados em apenas 4 meses (+159.000) foi três vezes superior ao número daqueles que receberam o subsídio de desemprego (+47.950). A miséria está a alastrar rapidamente em Portugal.

 

A necessidade urgente de retomar a atividade e de normalizar a economia mas com segurança caso contrario é o caminhar para o abismo

Os últimos dados divulgados pelo INE revelam uma preocupante quebra na atividade económica. No 2º trimestre 2020, quando comparado com idêntico trimestre de 2019, registou-se uma quebra no PIB de -16,3% (menos 8.500 milhões € de riqueza produzida), uma quebra no consumo privado de -14,5% (sem consumo o país não recupera), uma quebra no investimento de -10,8% (sem investimento o pais não se moderniza nem aumenta a produtividade) e uma quebra nas exportações de -39,5%. São quebras que a continuar conduzirão inevitavelmente o país a um desastre económico e social.

É necessário inverter este caminhar para o abismo, mas o governo tem-se revelado incapaz de falar com a verdade que é necessário e de tomar as medidas adequadas que permitam uma retoma gradual do país à normalidade possível mas com a segurança mínima que é indispensável. Mesmo nas áreas de sua responsabilidade direta, como é a Administração Pública, o governo parece ausente, deixando ao arbítrio das respetivas chefias não havendo ainda qualquer orientação clara por parte do governo.

É urgente a reorganização do trabalho de toda a administração publica integrando de uma forma planeada e organizada o teletrabalho, construindo instrumentos de enquadramento, de acompanhamento e de avaliação do trabalho realizado pelos  trabalhadores que não existe, assim como o respeito dos seus direitos (ao descanso, à sua vida privada, ao horário de trabalho, etc.), mas até a esta data nada foi feito deixando tudo à deriva com consequências graves nos serviços prestados à população cujo acesso é cada vez mais difícil.

É urgente normalizar a economia com um mínimo de segurança. Para isso:

  • é necessário introduzir horários desfasados quer na administração publica quer no setor privado para reduzir os ajuntamentos nomeadamente nos transportes públicos, e assim tornar possível o distanciamento físico mas até à esta data nada foi feito; é
  • preciso, pelo menos a nível da Administração Pública, em muitos serviços, em que o teletrabalho foi introduzido de uma forma desorganizada, improvisada e sem qualquer preparação, dividir os trabalhadores em dois grupos que se alternam (regime  presencial/teletrabalho) de forma a existir sempre trabalhadores em regime presencial para assegurar pelo menos um mínimo de normalidade no funcionamento dos serviços que não existe atualmente e garantir  aos  trabalhadores o distanciamento físico necessário indispensável à sua segurança.

Mas tudo isto está por fazer, e o governo tem-se revelado incapaz de o fazer. Até parece  que nem pensa nisso ou que tem medo de atuar porque teme perder popularidade. E são os cidadãos que sofrem com a desorganização dos serviços públicos. Mas assim é o caminho para o abismo.



 

 


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