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Domingo, Novembro 3, 2024

A propósito da demissão da jornalista Ana Lourenço

Estrela Serrano
Estrela Serranohttps://vaievem.wordpress.com/
Professora de Jornalismo e Comunicação

Estrela SerranoUma reflexão sobre a transparência (ou a falta dela) nas empresas jornalísticas

A demissão da jornalista Ana Lourenço da SIC Notícias, noticiada há dias, tem sido relacionada por alguns jornais com as alterações introduzidas naquele canal, no horário da noite, período em que Ana Lourenço conduzia a emissão quer apresentando as notícias quer entrevistando pessoas e moderando debates. Ora, a determinada altura, Ana Lourenço desapareceu do ecrã sem que se soubesse porquê e não voltou até sabermos agora que se demitiu por sua iniciativa. A direcção do canal fez um comunicado agradecendo e elogiando o trabalho de Ana Lourenço.

Ana Lourenço era, para muitas pessoas, a principal “marca” da SIC Notícias, tendo criado um estilo próprio na sua maneira discreta e calma de transformar as entrevistas com personalidades políticas ou de outros campos em conversas amenas e distendidas, em que os convidados tinham tempo para expôr as suas ideias sem que ela deixasse de fazer as perguntas que entendia fazer.

Por se tratar de um nome de referência na SIC Notícias, é natural que a demissão de Ana Lourenço suscite curiosidade e especulação, tanto mais que a SIC se limitou a dizer que aceitou a demissão da jornalista sem qualquer explicação adicional. A crer nas notícias, o anúncio da demissão foi retardado para não “estragar” a festa de aniversário dos 15 anos da SIC Notícias, ocorrida há dias.

Este caso é mais um exemplo da falta de transparência existente na quase generalidade das empresas jornalísticas no que se refere à gestão de pessoal, com excepção da RTP, onde qualquer intriga interna salta logo para os jornais.

As demissões e os despedimentos de jornalistas são em geral noticiados por outros media que não aqueles onde elas acontecem. Geralmente os visados recusam-se a falar, talvez porque o “mercado” é restrito e vive uma crise que se tem vindo a agravar, com escassas hipóteses de emprego.

Dá-se o caso de a demissão de Ana Lourenço coincidir no tempo com a decisão tomada pela SIC, pela TVI e também pela RTP (nesta em menor escala), de “transportar” as suas vedetas-pivôs dos principais telejornais dos canais generalistas para os canais informativos do cabo, certamente com o objectivo de ganharem audiências para estes canais.

No caso da SIC e da TVI, os telejornais da noite (20h00) passaram a ser emitidos em simultâneo, na SIC e na SIC Notícias, na TVI e na TVI24, respectivamente, com os apresentadores (Rodrigo Guedes de Carvalho e Clara de Sousa, na SIC e SIC Notícias, e José Alberto de Carvalho e Judite de Sousa, na TVI e TVI24) em regime de alternância. Assistiu-se com estas alterações a uma descaracterização dos dois canais informativos do cabo – SIC Notícias e TVI 24 – emitindo a mesma informação apresentada pelas mesmas pessoas, num horário considerado “nobre”.

A RTP não foi tão longe, mantendo o telejornal das 20h00 em exclusivo no canal generalista – RTP1 – embora tenha “transportado” os dois pivôs principais – José Rodrigues dos Santos e João Adelino Faria – alternadamente, para o canal informativo – RTP3- com noticiário próprio neste canal.

A demissão de Ana Lourenço é associada em alguns jornais às alterações na SIC Notícias, informação que apesar de carecer de confirmação, quer por parte da jornalista quer da SIC, não parece inverosímil. De facto, no formato anterior, a SIC Notícias era o canal informativo mais visto, o que apontava para a ideia muito comum de que “não se mexe em equipa que está a ganhar”. Porém, ainda que a SIC Notícias se mantenha à frente dos outros dois canais informativos, não deixa de ser frustrante sintonizar a SIC para o Jornal da Noite às 20h00 e depois, às 21h00, ao passar para a SIC Notícias encontrar o pivô da SIC a repetir as notícias que o outro pivô acabou de ler na SIC generalista.

Acresce que os telespectadores não foram informados pelas direcções dos três canais sobre a lógica destas alterações, o que em matéria de transparência e lealdade para com os cidadãos, deixa muito a desejar.

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