Já tínhamos assistido a esse autêntico caso de polícia que foi o “concurso” da privatização da TAP e a sua entrega de mão beijada ao Sr. David Neeleman (e que lhe permitiu salvar temporariamente da falência iminente a sua Companhia Azul, que até Setembro de 2015 já acumulara prejuízos de 267 milhões de reais, ou seja, de cerca de 60 milhões de euros) e sobre o qual os Tribunais portugueses, quer os administrativos, quer os criminais, decerto apenas virão a decidir daqui a uma década.
Como já tínhamos presenciado esse verdadeiro escândalo de o Governo do Sr. António Costa recorrer à prestimosa ajuda do seu amigo Diogo Lacerda Machado, coveiro da TAP, porque foi com a Geocapital (empresa de Stanley Ho de que ele era administrador) que a TAP celebrou o ruinoso negócio da compra da VEM – empresa de engenharia e manutenção do Brasil que tem representado um buraco financeiro de mais de 500 milhões de euros nas contas do Grupo. E recorrer a tal prestimosa ajuda para… precisamente impedir a reversão e antes chancelar e procurar legalizar a “privataria” em curso.
E, mais recentemente, também já víramos esse autêntico desaforo – a ser formalmente confirmado na Assembleia Geral de 6ª feira, 30 de Junho – de o mesmo Diogo Lacerda Machado (juntamente com o ex-Secretário de Estado do PSD Miguel Frasquilho e a ex-Presidente da Fundação de Serralves, Ana Pinho) ser nomeado pelo Estado para administrador da mesma empresa que ajudou a enterrar financeiramente e a entregar aos privados, ao mesmo tempo que estes mantêm, com a concordância do Governo, Fernando Pinto (o grande responsável pela desastrosa operação do Verão de 2014) como membro da nova administração.
Tudo isto com o arrogante e provocatório sentimento de impunidade de quem, como o dito Diogo Lacerda Machado – que nenhum rebuço ético, por mínimo que seja, abala e que se mostra ciente de que nenhuma entidade inspectiva ou judiciária lhe vai à mão – afirma que não só não tem vergonha alguma como até sente muito orgulho em todas estas façanhas.
Que, todavia, não deveremos permitir que sejam esquecidas ou branqueadas!
Mais! A TAP, desde há anos a fio, sistematicamente, não contrata o número de tripulantes necessários para efectuar, com respeito por todas as regras, quer as de segurança, quer as de serviço de transportes, as operações de voo, em particular nos picos de actividade.
Violar o Acordo de Empresa
Mas agora tem mesmo o autêntico e inaudito descaramento de, através do seu Director de Operações Jason Ward, que enviou neste final de Junho um mail nesse sentido a todo o PNC – Pessoal Navegante de Cabine, a pressionar os referidos trabalhadores de cabine para que aceitem “colaborar” com a Administração e violar o Acordo de Empresa prestando serviços aos passageiros que, com as tripulações reduzidas aos chamados mínimos de segurança, aquele instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, e muito justamente, não permite, precisamente porque tal situação poderá prejudicar ou interferir com o exercício da função prioritária dos tripulantes, que é a salvaguarda e garantia da segurança do voo e dos passageiros!
Dito de outra forma, a TAP – que cobra aos seus passageiros (agora pomposamente denominados de “clientes”) preços que, sobretudo nos voos sem real concorrência (como é o caso dos voos para as Regiões Autónomas), são absolutamente exorbitantes – procura justificar tais preços (também) com a prestação de serviços de bordo, designadamente refeições.
Ora, como a TAP pretende fazer “omeletes sem ovos” e realizar as respectivas operações de voo sem o número suficiente de tripulantes, a “solução” que encontrou foi a de diminuir o número de tripulantes até aos níveis mínimos de segurança, ou seja, o número mínimo de tripulantes para assegurar apenas as tarefas de salvaguarda da segurança do voo e dos passageiros, estando neste caso excluída, e bem, pelo Acordo da Empresa, a prestação de serviços como vendas a bordo, refeições, etc.
E depois procura criar a situação de, apesar de eles já terem sido pagos, não prestar tais serviços aos passageiros (frequentemente avisando estes últimos apenas quando se encontram já embarcados e não têm qualquer alternativa!). E ainda por cima, trata de procurar responsabilizar por tal incumprimento o pessoal navegante de cabine que tenha justamente recusado “colaborar” com a referida violação do Acordo de Empresa!
Voar sem descanso. Literalmente!
Mas há mais! É que a violação do Acordo de Empresa e a quebra das regras de segurança estão também a passar pelo desrespeito sistemático dos tempos de repouso planeados a que os tripulantes têm legítimo direito e pela permanente pressão por parte do Planeamento e Escalas da Empresa para que os mesmos tripulantes aceitem ir voar sem ter descansado o tempo que está legal e contratualmente estipulado. Tempo de repouso esse que se prende não apenas com o basilar direito ao repouso e com o respeito das condições de segurança e saúde no trabalho, mas também com a própria segurança de voo (valor que, todavia, e quando tal lhe convém, designadamente para atacar lutas e greves dos seus trabalhadores, a Administração da TAP tanto gosta de apregoar).
Ora, com a sistemática falta de tripulantes e não obstante todas estas violações das normas, esta situação – que habitualmente se verificava (apenas) no Médio Curso mas que este ano já está a afectar também o próprio Longo Curso – já levou à não realização de diversos voos e ameaça mesmo agravar-se ainda mais à medida que o cansaço e as inerentes situações de exaustão e de doença se forem acumulando, como já está hoje a acontecer.
A completa irresponsabilidade e o estatuto de arrogante impunidade por parte da Administração da TAP está bem à vista quando apenas nos inícios de Maio último começou a formação de 93 novos tripulantes, absolutamente indispensáveis mas ainda assim claramente insuficientes, e que, ainda por cima, somente serão integralmente colocados ao serviço em 20 de Julho quando a chamada época de Verão já se iniciou há muito.
E quando neste Verão os voos – que todavia os passageiros já pagaram, e a peso de ouro, tendo-se chegado ao cúmulo de a TAP até já cobrar 10€ por o passageiro fazer ele próprio online a marcação prévia do seu lugar – começarem a ser cancelados, a culpa será ou de “motivos de ordem técnica” ou então dos malandros dos trabalhadores que não cederam às pressões para violar o Acordo da Empresa!…