A regular publicação de notícias pouco optimistas avoluma as nuvens da incerteza sobre a transição verde. Sejam elas provenientes, ou não, dos patrões da indústria (como a todo poderosa dona da Sonae que não deixa de manifestar as suas “dúvidas” sobre a transição verde das empresas sem mais apoios públicos), o certo é que uma conjuntura populista altamente favorável aos seus detractores e opositores tem alimentado um clima de dúvida que as irreflectidas reacções dos seus defensores nada contribuem para acalmar ou inverter.
Assim, parecem cada vez mais distantes os tempos em que, graças ao recurso à energia solar e eólica, a Europa era considerada um modelo para o resto do mundo; a confiança nas novas formas de produção de energia levou à redução progressiva do uso do carvão e ao encerramento de centrais nucleares, mas os recentes eventos geoestratégicos que ditaram o corte abrupto no acesso ao barato gás natural russo revelaram a fragilidade daquela ilusão.
O sucesso da energia verde – ao qual não terá sido estranho o sistema de garantia de preços (subsídio) aos produtores – tornou-se o modelo a seguir para a implementação eólica e solar, que levou a um crescimento superior a 135% na última década…
…mas a súbita subida dos preços da energia veio revelar que a verdadeira fonte de receita da actividade não era a tecnologia, mas sim o mecanismo de incentivo à produção que lhe assegura um preço pré-acordado acima do mercado.
A crescente constatação das limitações da solução eólica e solar como fontes alternativas de produção de energia e a percepção popular da sobrecarga financeira a elas associadas (os subsídios aos produtores de energia verde, estão a ser suportados por uma sobretaxa nas faturas de electricidade de todos os consumidores), alertam para o malogro da transição energética, especialmente no que respeita ao seu regular fornecimento, elevando as preocupações com aquele bem essencial e particularmente sobre os seus custos actuais e futuros.
Os elevados preços da electricidade estão também a virar os interesses das grandes empresas contra a energia e os níveis de investimento industrial em toda a economia europeia estão claramente em queda…
…com as grandes empresas, atraídas por incentivos fiscais (como as centenas de milhares de milhões de dólares prometidos pelo programa norte-americano para a redução da inflação), a reforçarem os seus investimentos noutras economias, incluindo as do próprio sector da energia verde.
Enquanto cresce a incerteza relativamente à exequibilidade e à fiabilidade da opção eólica e solar para a transição energética, os seus promotores recusam admitir sequer outras opções, como a energia nuclear (apesar de recentes notícias darem conta que o governo italiano poderá apostar no nuclear como alternativa aos combustíveis fósseis), persistindo o recurso a generosas políticas de subsídios para tentar alcançar metas climáticas ambiciosas que, por mais justas e necessárias que sejam, parecem não estar a ter sucesso – em especial quando os custos desses subsídios são sistematicamente transferidos para os consumidores e para os sectores mais desfavorecidos das populações (como o confirma a notícia de que os trabalhadores em Portugal estão entre os que mais sofrem com a transição verde) – e a forma quase sobranceira com a UE tem abordado a questão da transição energética (sem alternativas preparadas e sem avaliação prévia das suas consequências) pode resultar no alívio ou no quase abandono dos compromissos climáticos que assumiu, o que poderá desencadear um movimento idêntico por parte de outros países e continuar a adiar as acções necessárias para mitigar as alterações climáticas.
A oposição populista a estas medidas não pode ser reduzida à mera culpabilização por ser negacionista das alterações climáticas enquanto se persiste na actual abordagem à transição energética e na ideia que esta é crucial para alcançar as ambiciosas metas climáticas da UE, porque isso traduz-se na continuação da política de subsidiação às empresas privadas das energias renováveis. Assim, parece restar apenas a opção de aceitar que os problemas enfrentados pela transição energética são a consequência de uma série de erros políticos graves – apoios públicos a interesses “verdes” privados e transferência dos custos dos subsídios para os consumidores – que deviam ter sido evitados.
Posto isto e considerando a importância do combate às alterações climáticas, o que parece mais adequado seria o desenvolvimento de uma alternativa concertada entre todos os parceiros europeus (rede europeia de produção e distribuição), alicerçada na propriedade pública da energia e na extensão do controlo público sobre as cadeias de abastecimento vitais, tanto mais que esta opção de desmercantilização da energia tem sido objecto de estudos, os seus argumentos financeiros, técnicos e sociais são razoavelmente convincentes e, não o esqueçamos, parece comprovado que o investimento previsto é insuficiente para a transição energética. Mas, pelo que temos vindo a assistir, duvido que esse seja o caminho escolhido!