A teocracia iraniana é hoje o principal apoio aos talibã afegãos, e comanda um exército internacional que actua na Síria, constituído por recrutas afegãos, paquistaneses, iraquianos, libaneses, sírios e iemenitas.Tal como foi explicado pelo então número dois do regime, o Ayatollah Hashemi Rafsandjani, uma guerra nuclear com Israel poderia levar à eliminação recíproca de sete milhões de pessoas, sendo que isso quereria dizer o fim de Israel por um lado, e por outro, o martírio de sete milhões de iranianos o que ele considerou um preço aceitável.
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O terrorismo como arma de Estado
Desde que em 1979 o Ayatollah Khomeini se instalou no poder e instituiu o primeiro sistema contemporâneo de poder teocrático, uma das suas principais imagens de marca foi a promoção de ataques terroristas contra os seus opositores ou os seus adversários fora do seu território, e na verdade nunca o deixou de fazer até aos nossos dias.
Realizando o principal grupo de oposição iraniano a sua conferência anual em Paris de 29 de Junho a 1 de Julho deste ano, com a presença de muitas dezenas de milhares de participantes e incluindo numerosas personalidades políticas internacionais, resolveu o regime promover um ataque bombista.
A operação foi dirigida por um conselheiro da Embaixada iraniana em Viena, contou com a participação de iranianos em Paris e tinha como principais operacionais dois iranianos que tinham obtido nacionalidade belga pretendendo ser refugiados. A espionagem ocidental – provavelmente a americana – desmontou-a e as autoridades na Alemanha capturaram o diplomata iraniano (a imunidade diplomática não atravessa fronteiras), os cúmplices em Paris, e os operacionais belgas com os explosivos e mecanismos de deflagração no seu veículo em Stockel (Bruxelas).
Poucos dias depois, as autoridades dos Países Baixos anunciaram a expulsão de dois diplomatas iranianos sem dar explicações públicas, um gesto antecipado, e com toda a probabilidade em resultado das provas que incriminavam os dois diplomatas pelo assassínio nos tempos recentes de dois oposicionistas iranianos em Haia.
Tratou-se de terrorismo promovido por um Estado estrangeiro em território europeu noticiado em primeira página pela imprensa internacional, mas que foi sintomaticamente silenciada pela imprensa portuguesa.
A imprensa ocidental pró-Teerão, onde não lhe foi possível esconder as notícias, papagueou a propaganda da teocracia iraniana, protestando a sua inocência e reclamando que tudo se tinha tratado de um complot.
O que os publicistas da teocracia iraniana não conseguem explicar é porque razão o regime iraniano não se distanciou dos seus diplomatas (pelo contrário, assumiu plenamente a sua defesa) e porque razão um regime que durante quase 40 anos sistematicamente promoveu atentados terroristas no estrangeiro sem os assumir e argumentando sempre com complots ou que as vítimas se teriam autoflagelado, haveria agora de mudar de argumentos.
Afirmam ainda os publicistas que não faria sentido o regime desencadear ataques terroristas quando está a tentar obter mais concessões da Europa, como se não tivesse sido isso o que ele tem feito sistematicamente, frequentemente com bons resultados, porque os dirigentes ocidentais preferem recuar, fazer de conta que não se passa nada, a assumir as suas responsabilidades.
Os publicistas da teocracia apostam na falta de memória das pessoas e, claro, no conspiracionismo que serve para defender o indefensável. Enquanto no passado a teocracia utilizou as suas células libanesas (Hezbollah) ela utilizou agora nacionais iranianos porque sabia que eram necessários nacionais iranianos para poder facilmente infiltrar a conferência iraniana de Paris. Nos Países Baixos, a teocracia contratou profissionais do crime, porque foi essa a opção mais adequada. Com o Hezbollah libanês classificado hoje como organização terrorista em solo europeu, tornou-se provavelmente difícil utilizá-lo para estas operações. Trata-se de decisões operacionais que em nada condicionam os objectivos estratégicos de sempre.
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O expansionismo iraniano
A teocracia iraniana é hoje o principal apoio aos talibã afegãos, e comanda um exército internacional que actua na Síria, constituído por recrutas afegãos, paquistaneses, iraquianos, libaneses, sírios e iemenitas.
No Médio Oriente, a teocracia iraniana alimentou o caos e a guerra civil na Síria, no Iraque, no Líbano e no Iémen, onde intervém através de milícias ideologicamente formadas por si, treinadas e financiadas pelos seus guardas revolucionários. Não há praticamente canto nenhum do mundo onde não esteja presente através de redes de culto fanático, tráfico de substâncias ilícitas ou células combatentes.
O objectivo iraniano no Golfo tem sido claro: o de desfazer as potências que lhe possam fazer frente (foi o que fez com o Iraque e o que tenta fazer com a Arábia Saudita) de forma a controlar a principal área exportadora de hidrocarbonetos do mundo e os principais locais de culto islâmico.
Erigindo-se como vanguarda do antissemitismo, Teerão tem mobilizado todos os movimentos fanáticos muçulmanos e conseguiu já chegar às fronteiras do território israelita, através do Iraque e da Síria.
O expansionismo iraniano é tão óbvio quanto a condescendência ocidental perante ele, não raras vezes a pretexto da pseudodefesa do regime em relação a jihadistas de obediência sunita. Na verdade, a teocracia iraniana tem sido mestre em fomentar o jihadismo sunita e, sempre que isso lhe convém, combate-lo para fingir ser uma força de moderação.
Para isso, o regime iraniano tem sido hábil a manobrar a lógica tradicional dos poderes do Médio Oriente, que não têm sido capazes de inteligência estratégica e são facilmente manipuláveis.
A concessão ao regime iraniano de biliões de dólares pela Administração Obama – incluindo em aviões cargueiros com numerário, forma mais simples de facilitar o apoio armado iraniano aos seus satélites – com o risível argumento do “acordo nuclear”, deu um novo impulso ao expansionismo iraniano e mostra até que ponto os nossos dirigentes ocidentais foram incapazes de entender a teocracia.
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A nuclearização
Desde o final da guerra com o Iraque nos anos oitenta que os dirigentes iranianos têm dado prioridade ao seu armamento nuclear, visto como o meio infalível de vergar o mundo a seus pés.
Tal como foi explicado pelo então número dois do regime, o Ayatollah Hashemi Rafsandjani, uma guerra nuclear com Israel poderia levar à eliminação recíproca de sete milhões de pessoas, sendo que isso quereria dizer o fim de Israel por um lado, e por outro, o martírio de sete milhões de iranianos o que ele considerou um preço aceitável.
Foi uma equação feita há quase três décadas, que naturalmente se foi adaptando ao tempo, mas que nada mudou quanto à lógica do regime. É a mesma lógica que levou à morte de milhares de crianças iranianas a rebentar minas na fronteira irano-iraquiana, e que mostra um desprezo pela vida humana de que é difícil encontrar outro registo histórico.
O acordo nuclear iraniano, feito nos mesmos moldes e com a mesma lógica insana com que foram feitos os acordos com a Coreia do Norte, na melhor das hipóteses, acaso não venha a ser furado pelos fracos dispositivos de controlo, adiaria de uma década a bomba iraniana, e torná-la-ia então inevitável.
Tratava-se de um péssimo acordo que em boa hora foi posto em causa pela nova administração americana que exigiu garantias sérias e possíveis de fiscalização da desnuclearização iraniana e, na sua ausência, levou ao fim do acordo.
A maior parte dos dirigentes ocidentais mostrou-se no entanto de uma cegueira total, mesmo quando a espionagem israelita obteve e divulgou os planos precisos e inequívocos do plano nuclear iraniano.
Do lado da Rússia e da China, as coisas têm sido diferentes, para pior. Uma das partes menos publicitadas da iniciativa internacional chinesa conhecida como ‘Rotas da Seda’ é a da venda a inúmeros países (incluindo alguns que dificilmente podem ser considerados como países no sentido funcional do termo) de centrais nucleares que facilmente se podem tornar em pontos de partida para programas nucleares militares.
Sem recorrer ao mesmo tipo de propagação em massa dos perigos nucleares, a Rússia tem mostrado um igualmente arrepiante desdém pelas consequências potenciais das armas nucleares no mundo.
É difícil de entender o que pretendem os estrategas chineses ou russos. Se é mais fácil compreender da parte da Rússia um jogo apenas táctico sem leitura estratégia, é mais difícil entender o que se passa na cabeça dos líderes de Pequim, aparentemente despreocupados com a alta probabilidade de a sua acção conduzir dentro de algumas décadas a um mundo onde dezenas de tiranetes, psicopatas, ou actores de não-Estados terão na sua mão a possibilidade de provocar holocaustos nucleares.
Mas se é difícil entender essa aparente ausência de leitura estratégica, é mais fácil entender que, comparado com o que estão a fazer com a venda de centrais nucleares, a sua aquiescência ao plano nuclear iraniano é uma preocupação secundária.
A ameaça nuclear que pesa sobre as nossas cabeças precisa de ser entendida se queremos ter esperança na continuação da humanidade. Começar por rejeitar a aceitação do plano nuclear iraniano, é do meu ponto de vista, o passo imediato mais importante a dar neste momento.
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