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Sábado, Novembro 23, 2024

Alban Berg: do corpo que fala ao silêncio que mata

Yvette Centeno
Yvette Centeno
Licenciou-se em Filologia Germânica, e e doutorou-se com uma tese sobre A alquimia no Fausto de Goethe. É desde 1983 Professora Catedrática da Universidade Nova de Lisboa, onde fundou o Gabinete de Estudos de Simbologia, actualmente integrado no Centro de Estudos do Imaginário Literário.

No caso da ópera Wozzeck, inspirada por outro expressionista, Georg Buechner, iremos encontrar uma outra figura de mulher infiel, mas o personagem que concentra todo o drama, toda a tragédia em si mesmo é o pobre soldado Wozzeck.

No artigo anterior, dedicado à ópera Lulu, sobre libretto fiel aos dois dramas de Wedekind que lhe dão o suporte literário e temático, Berg explora de modo inspirado esta ideia a que me refiro de um corpo que fala, melhor, que grita, levado como é por pulsões incontroláveis de um ego sexualizado até ao limite da própria pulsão da morte, que provoca e a que na verdade se entrega.

No caso da ópera Wozzeck, inspirada por outro expressionista, Georg Buechner, iremos encontrar uma outra figura de mulher infiel, mas o personagem que concentra todo o drama, toda a tragédia em si mesmo é o pobre soldado Wozzeck, enganado, é certo, mas sobretudo constantemente humilhado pelos seus superiores, entre eles o médico que faz dele um objecto das suas experimentações cruéis sobre um pobre de espírito.

O sucesso desta obra deve-se também, sem dúvida, ao que nela se antevê de um futuro que estava ao virar da página, com a ascensão do nazismo numa Alemanha emudecida, como o pobre soldado.

Mas consideremos o tema: é na minha opinião o de uma voz que se cala, se vai calando, incapaz de articular num protesto coerente o tumulto que lhe vai na alma, até uma explosão final, e fatalmente destrutiva: Wozzeck, o humilhado, acaba por matar a mulher que foi mediadora de tanta humilhação.

Estas óperas, e já as próprias peças de teatro permitem, na questão do terceiro intérprete que seria o encenador, discutir algo de interessante: actualizar ou não para um tempo mais próximo o tratamento das figuras e situações principais.


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