Entre os indicadores económicos mais usados conta-se, seguramente, o PIB, não havendo dia nem ocasião em que se abordem questões como o crescimento económico ou o estado das economias, para ele não servir de referência e de argumento na discussão.
Quando se avolumam os sinais da aproximação de mais uma crise económica e quando estas assumem uma regularidade cada vez maior na vida dos cidadãos, é mais que imperioso renovar o debate em torno do uso e abuso de indicadores como o PIB, ou da sua variante PIB per capita (rácio do PIB pelo número de habitantes, criado para minimizar os desvios provocados pelas dimensões geográficas e populacionais), especialmente quando estes são utilizados para fins que pervertem a sua própria finalidade.
É verdade que ao longo do tempo e graças a organizações não governamentais, académicos e profissionais de várias disciplinas, têm sido feitos esforços para corrigir o PIB, nomeadamente através de tentativas de contabilização dos “factores externos” e do trabalho produtivo não remunerado que é ignorado pelo PIB e existe em todas as sociedades.
Indicadores de áreas que vão além da economia, como por exemplo, a saúde, a educação, a sustentabilidade e meio ambiente têm sido propostos como alternativas ou complementos ao PIB; entre estas conta-se o Índice de Desenvolvimento Humano da ONU (IDH), desenvolvido pelo paquistanês Mahbub ul Haq com base nos trabalhos conceptuais do indiano Amartya Sem, prémio Nobel de Economia em 1988 pela sua contribuição para as teorias da escolha social e do bem-estar social.
Modelos de Qualidade de Vida e indicadores determinantes
Autor dos Modelos | Indicadores Determinantes |
Indicador de Felicidade Interna Bruta – FIB (1972) | Bom padrão de vida económica; boa governança; educação de qualidade; saúde; vitalidade comunitária; protecção ambiental; acesso à cultura; gestão equilibrada do tempo e bem-estar psicológico |
Índice de Desenvolvimento Humano – IDH (1990) | Rendimento, longevidade e educação |
Indicadores de Qualidade de Vida da OMS (1992) | Domínio físico, domínio psicológico, nível de independência, relações sociais, ambiente e aspectos espirituais/religião/crenças pessoais |
Indicadores de Qualidade de Vida Calvert–Henderson (2000) | Educação, emprego, energia, meio-ambiente, saúde, direitos humanos, rendimento, infra-estrutura, segurança nacional, segurança pública, lazer e habitação |
Fonte: Everton Fernando Alves in «Qualidade de vida: considerações sobre os indicadores e instrumentos de medida»
Mais recentemente, em 2011, também a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento (OCDE), anunciou o seu índice de bem-estar, que usa como indicadores a habitação, o rendimento e a riqueza, os postos de trabalho, a comunidade, a educação, o meio ambiente, a forma de governo, a saúde, a satisfação de necessidades vitais, a segurança e o equilíbrio entre trabalho e nível de vida; nele, como na maioria dos novos indicadores para corrigir o PIB, procura evitar-se um confronto directo com os pressupostos do PIB, mas o recurso a indicadores cada vez mais subjectivos e estreitamente dependentes do modelo ocidental de vida talvez não esteja a contribuir para a sua rápida difusão e aceitação.
Por outro lado, a também crescente complexidade poderá tornar os resultados mais opacos e até difíceis de escrutinar, facilitando a tarefa aos que querem que tudo fique como está, pelo que talvez a melhor opção seja o modelo do IDH proposto por Mahbub ul Haq e cuja aplicação a dados de 2020 mostra os países europeus nos primeiros lugares (8 entre os 10 primeiros), o território chinês de Hong-Kong como o primeiro não europeu e Portugal a ocupar um 38º lugar entre os 66 mais desenvolvidos.
As críticas ao IDH, bem ao sabor dos tempos, focam-se sobretudo na falta de uma perspectiva de natureza ecológica ou por se centrar demasiado na dimensão nacional, como se o FIB ou o Calvert-Henderson fossem muito diferentes nessa matéria. Mais consentânea pode ser a crítica que envolve a metodologia de cálculo e que aparenta prejudicar os países mais ricos, embora outros críticos o descrevam como redundante e arbitrário.
A sua aparente simplicidade leva ainda outros críticos a classificá-lo de reducionista e a sugerirem a inclusão de mais vectores do desenvolvimento humano, mas a inclusão desses outros factores de desenvolvimento significará apenas a sua aproximação às demais alternativas.