O episódio envolvendo o presidente da República, Jair Bolsonaro, na convocação de um ato contra a institucionalidade democrática do país deixa claro, definitivamente e de forma inconteste, que o risco para o regime democrático é real. Desde a sua posse, essa ameaça existe. Vem numa crescente e, agora, se agrava.
Em diversos momentos Bolsonaro aplicou a tática de realizar ataques contra a democracia para testar o grau de resistência e a capacidade de resposta do campo democrático e progressista. Conforme a reação, ele faz movimentos de tergiversação e nega suas intenções para em seguida reincidir na mesma prática.
É o que se vê agora. O presidente tentou dar um passo atrás após endossar a convocação do ato contra o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF), iniciativa a partir de declarações contra o Congresso Nacional feitas pelo general Augusto Heleno, titular do Gabinete de Segurança Institucional, um dos seus ministros mais próximos de Bolsonaro.
A resposta ampla e rápida impôs o seu recuo.
Formou-se um coro de repulsa que uniu um espectro político que foi da esquerda à direita. O repúdio passou por lideranças dos movimentos sociais, das centrais sindicais, e da sociedade civil, por ministros do Supremo e por três ex-presidentes da República – Fernando Henrique Cardoso (FHC), Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.
Como disse o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, criar tensão institucional não ajuda o país a evoluir. “As autoridades têm o dever de dar o exemplo de respeito às instituições e à ordem constitucional”, asseverou. No mesmo tom, o presidente do STF, Dias Toffoli, enfatizou que não existe democracia sem um parlamento atuante, um Judiciário independente e um Executivo legitimado pelo voto.
Diante dessas e de outras reações, como a do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, de governadores de diferentes posições políticas – como Flávio Dino (PCdoB-MA), Paulo Câmara (PSB-PE) e João Doria (PSDB-SP) –, Bolsonaro fez mais uma de suas manobras diversionistas. Sua afirmação de que “qualquer ilação” seria “tentativas rasteiras de tumultuar a República” encerra uma hipocrisia sem limites.
Bolsonaro jogou gasolina na fogueira e culpou a floresta pelo incêndio. Não há ilação alguma. Ele está, sim, tumultuando a segurança política e jurídica do país. As forças democráticas e progressistas não podem, de modo algum, dar como resolvida uma crise institucional grave, tendo como referência esse falso recuo do presidente.
Se Bolsonaro está testando a capacidade da sociedade de defender o regime democrático, a resposta só pode vir com um amplo e contundente rechaço. É imperativo dizer não ao golpismo, em uníssono, repelindo essa ofensiva contra duas instituições indispensáveis ao regime democrático: o Congresso Nacional e o STF.
Nesse sentido, a reunião marcada para a próxima terça-feira na Câmara dos Deputados, que pretende reunir representantes de todas as legendas que se dispõem a defender o Congresso Nacional e a democracia, se reveste de grande importância. Relevância semelhante tem a tomada de posição de representantes da sociedade civil, que não podem se omitir nessa hora.
Uma ação ampla e eficaz para repelir mais essa ameaça de Bolsonaro e de seus apoiadores é inadiável. Sem resposta aos seus arroubos, o bolsonarismo se sente com ânimo redobrado para fazer novas investidas para coagir as instituições da República.
A defasa da democracia só se completa com o povo na rua. Daí a importância da agenda de mobilizações, como as do 8 de março – Dia Internacional das Mulheres – e dia 18 de março, quando haverá uma paralisação nacional em defesa da educação e do serviço público.
Texto original em português do Brasil
Exclusivo Editorial PV / Tornado