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Terça-feira, Dezembro 24, 2024

Amnistia condena União Europeia por mortes no Mediterrâneo

A taxa de mortalidade no Mediterrâneo triplicou este ano face a 2015 devido às más políticas europeias.
A conclusão é da Amnistia Internacional (AI) que adianta: “O cada vez maior crescendo no balanço de pessoas mortas na zona central do mar Mediterrâneo e os abusos horríveis que enfrentam milhares de refugiados e migrantes em centros de detenção na Líbia estão indubitavelmente relacionados com as fracassadas políticas da UE.

No relatório intitulado “Uma tempestade perfeita”, publicado esta quinta-feira, a organização dos direitos humanos estima que 2017 pode vir a tornar-se no ano mais mortal na fatal rota de migração. Ao referir que mais de duas mil pessoas morreram desde janeiro passado, o documento diz que a Europa “virou costas” aos refugiados e aos migrantes dando prioridade a “acordos imprudentes” com a Líbia que os impede de chegarem a Itália.

A AI conclui ainda que “os governos europeus estão a falhar na prevenção dos afogamentos e a fechar os olhos a abusos – incluindo tortura e violações –, ao passarem a maior parte da responsabilidade pelas operações de busca e salvamento a organizações não-governamentais e ao aumentarem a cooperação com a guarda-costeira da Líbia”.

John Dalhuisen, director da AI para a Europa, frisa que “os Estados europeus têm progressivamente virado as costas a uma estratégia de buscas e salvamento que estava a reduzir a mortalidade no mar a favor de uma outra em que se tem assistido ao afogamento de milhares de pessoas e que deixou homens, mulheres e crianças desesperados completamente encurralados na Líbia, expostos a abusos horríveis”.

“Em última análise, a única forma sustentável e humana de reduzir os elevados números de pessoas a arriscarem fazer viagens tão horríveis é criar mais rotas seguras e legais para migrantes e refugiados chegarem à Europa”, defende o activista.

O último balanço da Organização Internacional para as Migrações (OIM) revela que cerca de dois mil imigrantes e refugiados morreram no Mar Mediterrâneo este ano

De refugiados a torturados

Relatos dão conta de que os membros da guarda costeira líbia “conspiram com traficantes” e que “põem frequentemente refugiados e migrantes em risco”. Também um relatório das Nações Unidas, publicado no mês passado, reporta que houve guardas-costeiros líbios “diretamente envolvidos no naufrágio de barcos de migrantes com o recurso a armas de fogo”.

A investigação reporta que um nigeriano, que ficou num barco à deriva e a deixar entrar água, com outras 140 pessoas, descreveu aos investigadores: “Todos estávamos a rezar. Quando vi as luzes pensei: por favor, por favor, que não seja a polícia líbia”.

Outro testemunho de um homem do Bangladesh narra o que lhe aconteceu quando a embarcação em que seguia foi interceptada pela guarda costeira líbia: “Éramos 170 a bordo, num bote de borracha. Fomos levados de volta para a prisão e perguntaram-nos se tínhamos dinheiro. Disseram-nos: ‘Se pagares ninguém te deterá desta vez, porque nós somos da guarda costeira’… e, enfim, as prisões na Líbia são o inferno”.

Ainda um homem oriundo da Gâmbia contou à ONG que passou três meses na prisão. “Dormíamos nas celas como sardinhas, deitados de lado, porque não há espaço. E batem-nos se não nos deitarmos da forma certa. A água das sanitas era também a água que tínhamos para beber… Vi três pessoas serem torturadas quando estive preso. Um rapaz morreu durante a tortura… eles batem nos presos com canos. Eu era espancado à noite”.

“Quem é resgatado pela guarda costeira é levado de volta à Líbia, onde estas pessoas são detidas e torturadas e onde nem sequer existe um sistema nem leis de asilo. E quem está encurralado na Líbia fica vulnerável a violações e abusos de direitos humanos, incluindo a morte, tortura, violações, raptos, trabalhos forçados e detenções arbitrárias e por tempo indefinido em condições cruéis, desumanas e degradantes”, pode ler-se no relatório.

Quem está encurralado na Líbia fica vulnerável a violações e abusos de direitos humanos, incluindo a morte, tortura, violações, raptos, trabalhos forçados e detenções arbitrárias e por tempo indefinido em condições cruéis, desumanas e degradantes”, pode ler-se no último relatório da AI

Cinco mil mortes em 2016

Também Pedro Neto, director executivo da Amnistia em Portugal explica que a aposta Europeia em apoiar a guarda costeira líbia nas acções de salvamento e vigilância não está a resultar. Depois de ser conhecido o relatório, Pedro Neto alertou que se o segundo semestre de 2017 tiver o mesmo número de mortes que o primeiro semestre, “então estaremos no pior ano em termos de perda de vidas humanas no mar Mediterrâneo”.

O último balanço da Organização Internacional para as Migrações (OIM) mostra que cerca de dois mil imigrantes e refugiados morreram no Mediterrâneo este ano. Do início do ano até 18 de Junho, a OIM registrou um total de 81.292 entradas pelo mar na Europa e 1.985 mortos. No ano passado e de acordo com a mesma organização, cerca de cinco mil pessoas perderam a vida a tentar chegar às costas europeias, nomeadamente a Itália, Grécia, Chipre ou Espanha. Uma média de 20 mortes por dia no caminho mais perigoso do mundo.

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