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Quinta-feira, Novembro 21, 2024

António Vicente Campinas

Helena Pato
Helena Pato
Antifascistas da Resistência

(1910 – 1998)

Poeta, romancista, cronista e jornalista, prestigiado cidadão da Resistência antifascista, teve um importante papel nos combates pela Liberdade e pela Democracia. Intelectual entrosado na vida da comunidade, foi militante do PCP, desde jovem, e pagou a militância com a prisão e o exílio. Multifacetado, destacou-se sobretudo como escritor, cuja mensagem ficou perpetuada nos seus textos, com a denúncia das dificuldades da população algarvia e as referências à sua constante luta. Era um homem generoso e solidário. A sua tranquilidade e doçura geravam empatia.

Grande paixão: escrita e literatura

Nasceu a 28 de Dezembro de 1910 em Vila Nova de Cacela, concelho de Vila Real de Santo António mas, pouco depois, a família fixou-se nesta vila.

O seu primeiro emprego foi na Tipografia Socorro, na vila onde vivia e, mais tarde, como guarda-livros das firmas Capa, Folque e Rita. A escrita e a Literatura foram sempre a sua grande paixão. Começou por abrir uma pequena livraria na Rua Teófilo Braga e, em 1935, fundou e dirigiu o periódico Foz do Guadiana, em Vila Real de Santo António. Foi colaborador regular do importante semanário de crítica literária e artística “O Diabo”, desde a sua criação (1934), até ao seu encerramento pela polícia fascista (1940).

Andou lado a lado com Alves Redol, Manuel da Fonseca e Fernando Namora, entre outros. Sofreu perseguições políticas, foi preso e esteve exilado em França.

Muitos dos seus livros saíram em edições do próprio autor (alguns sob pseudónimo). Quando exilado, começou por trabalhar como operário da construção civil e contabilista, ate contactar o editor Arsénio Mota que o ajudou na carreira literária[1].

Figura cimeira do neo-realismo português, foi autor de vastíssima obra, abrangendo vários géneros literários, da poesia ao romance, mas também novela e crónica. Alguns dos seus livros foram traduzidos em várias línguas.

Autodidacta de grande talento, tornou-se um escritor muito apreciado, vindo a ser citado em estudos universitários.

Foi também colaborador de vários jornais e fundador do “Jornal do Cinema” que obteve alguma projecção.

Faleceu em Vila Real de Santo António, a 3 de Novembro de 1998.

A obra

Assinalável a sua preocupação em não deixar que se perdesse o património algarvio, através das descrições, mas também na forma de falar e no uso das expressões mais características. Foram a tenacidade e a perseverança que lhe permitiram realizar-se na sua vocação para as letras, numa altura em que a esmagadora maioria da população não sabia ler nem escrever. Vicente Campinas não se preocupava apenas com a escrita _ para ele a literatura só podia ser entendida numa intervenção social permanente. Mas, em Vicente Campinas, também é notório o conflito entre a literatura e a escrita ao serviço das causas sociais, um conflito com o qual conviveu[2].

Entre os seus trabalhos, contam-se:

  • Aguarelas (poesia), 1938
  • Recantos farenses (Livraria Campina), 1956
  • Lisboa, Outono (Livraria Ibérica), 1959
  • Preia-mar, poesias (Ed.do Autor), 1969
  • Reencontro, 1971
  • Escrita e combate – textos de escritos comunistas, 1976
  • Natais de exílio, 1978
  • Homens e cães (contos), 1979
  • Três dias de inferno, (Jornal do Algarve), 1980
  • Vigilância, camaradas (Jornal do Algarve), 1981
  • Gritos da fortaleza, (Jornal do Algarve), 1981
  • Putos ao deus-dará, 1982
  • Rio Esperança, Guadiana, meu amigo (Jornal do Algarve), 1983
  • Fronteira azul carregada de futuro (Ed.do Autor), 1984
  • O dia da árvore marcada (Nova Realidade), 1985
  • Fronteiriços (Nova Realidade), 1986
  • Ciladas de amor e raiva (Ed. do Autor), 1987
  • Segredo do meio do mar (Ed. do Autor), 1988
  • Mais putos ao deus-dará (Orion), 1988
  • O azul do sul é cor de sonho, narrativas, 1990
  • A dívida, os corvos e outros contos (em colaboração com Manuel da Conceição) 1992
  • Guardador de Estrelas, antologia, 1994

O ultimo trabalho que lhe conhecemos.

Homenagens

Em 1994, quando já se encontrava imobilizado e muito doente, a autarquia vila-realense prestou-lhe uma digna homenagem pública e o seu nome foi dado a uma artéria da cidade.

Em 2011, voltou a ser homenageado em Vila Real de Santo António, por ocasião do centenário do seu nascimento. A vida e obra do escritor foram evocadas numa cerimónia promovida pela Câmara Municipal, que decorreu na Biblioteca com o seu nome. As comemorações do nascimento de António Vicente Campinas começaram em 2010 com a inauguração de duas exposições na Biblioteca Municipal[3], mas prolongaram-se por todo o ano de 2011.

A Biblioteca Municipal de Vila Real de Santo António teve patente duas exposições integradas nas comemorações do centenário do nascimento do escritor: uma mostra filatélica organizada pela Secção de Coleccionismo dos Bombeiros Voluntários, bem como a exposição “Vicente Campinas – O Homem e o Escritor – 100 Anos”, organizada pela própria biblioteca e composta por documentos do escritor, notas manuscritas e diversos painéis explicativos. Foi também lançado um selo e um postal comemorativos do centenário do nascimento do escritor. E, por ocasião do 109ª aniversário do nascimento de Manuel Cabanas, a Liga dos Amigos da Galeria Manuel Cabanas levou a cabo um programa de comemorações que incluía Vicente Campinas, conterrâneo e amigo daquele outro ilustre vila-realense: “Manuel Cabanas e Vicente Campinas – Uma Relação de Amizade”. Em Abril, na Biblioteca Municipal, realizou-se uma palestra com Teresa Rita Lopes e Rui Moura (que musicou poemas de Vicente Campinas); e, por fim, em Setembro, teve lugar, também na biblioteca, uma tertúlia com familiares, amigos e conhecidos de Vicente Campinas.

 

Vicente Campinas publica em Bruxelas,1967, com ilustração e capa de Miguel Flávio. o primeiro livro escrito sobre Catarina Eufémia

Preia-mar, poesias (Ed.do Autor), 1969

Homens e cães (contos), 1979

 

Gritos da fortaleza, (Jornal do Algarve), 1981

 

Fronteiriços (Nova Realidade), 1986

 

[1]  Sem o conhecer pessoalmente, pediu-me para receber em minha casa umas quantas caixas com livros da sua biblioteca, que depois lhe enviaria, em pequenos pacotes, pelo correio normal para o seu endereço parisiense. Campinas sentiu-se grato (deixara de trabalhar na dureza do “bâtment”, arranjara por fim lugar de contabilista, já tinha consigo sua mulher) e convidou-me a ir visitá-lo e… conhecê-lo no aeroporto.

Ele sabia da colaboração que, como “parteiro” de edições eu dava à Nova Realidade, de Tomar, e pediu-me para o ajudar de tal jeito. Arranjei tipografia e orçamentos, fiz as revisões de cada livro, recebia a tiragem pretendida e despachava-a para o endereço indicado e pagava a factura com o dinheiro que me mandava. O caso repetiu-se, que me lembre, desde Proa ao Vento, 1966, Preia-mar, 1969, Raiz de Serenidade e Reencontro, 1971, entre outros.

Campinas era autor compulsivo. Colaborou intensamente na imprensa, fundou o “Jornal do Cinema” e o “Foz do Guadiana”. E apenas quando regressou do exílio, após o 25 de Abril, pude verificar que o recém-chegado era militante comunista». 

in Vicente Campinas: evocação

[2] O historiador António Rosa Mendes (1954 – 2013) sublinhou na obra de António Vicente Campinas a importância dos retratos da vila pombalina (no tempo do escritor), hoje cidade: Não vivi esses tempos, mas ao ler a obra de Campinas é como se os tivesse vivido. É esse o poder da literatura. E temos que agradecer a quem nos lavrou essas páginas, as quais contribuíram para que, hoje em dia, possamos saber ainda melhor como se vivia em Vila Real de Santo António há meio século”.

[3] Tiveram um dos pontos altos no dia 8 de Janeiro de 2011, quando dezenas de pessoas encheram a sala de sessões da Biblioteca Municipal, que tem aquele escritor como patrono, para ouvirem o vereador José Carlos Barros e o historiador António Rosa Mendes falar sobre a vida e a obra do escritor vila-realense.


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