Assinalando a substituição da essência pela aparência a tecnologia fundamenta o fim da razão ante o espectáculo de existir sem alma. A isso Alfieri apelidou do “meio mais certo de viver longamente em segurança”.
Dostoievsky, em seu socorro, garantiu que a “liberdade dá medo. Os homens são pássaros que amam o voo, mas têm medo dos abismos. Por isso abandonam o voo trancando-se em gaiolas… As gaiolas são o lugar onde as certezas moram”.
E quem é, afinal, este adorador de certezas? Para a maior parte de nós, responder à pergunta “quem sou eu?” é tarefa para várias vidas. Contudo, bastará mudar a questão para “quem não sou eu?” e tudo estará bem mais facilitado.
Então. Eu tenho medo mas eu não sou o medo. Eu errei mas eu não sou o erro. Do mesmo modo, eu tenho um corpo mas não sou o corpo. E, assim começamos a perceber a diferença entre “eu” e “meu”.
Surge, agora, um estado de lucidez resultante do entendimento do processo do “eu sou”. Esta consciência, instância subjectiva que consente a percepção que a alma tem da sua própria existência, permite que cada um de nós o seja intrinsecamente. Isto é, a experiência pura “do que realmente sou”.
No tempo presente, a indústria dos consensos sustentada pela tecnologia e pela ciência, arrasta-nos para um mundo onde o indivíduo surge por oposição a si mesmo, tornando-se deus de si próprio. Ou seja, na versão contemporânea daquele que foi outrora, o homem lobo de si mesmo.