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João de Sousa

Sexta-feira, Novembro 22, 2024

As ilusões criadas pelo governo e a dura realidade

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

O que espera os portugueses em 2023

Neste estudo, utilizando dados oficiais, mostro O QUE ESPERA OS PORTUGUESES EM 2023: a continuação de uma inflação elevada, uma espiral de cobrança de enormes receitas de impostos que contribui para aumentar ainda mais a escalada dos preços, um crescimento económico anémico a caminhar para uma recessão económica e, como consequência, o desemprego já começou a aumentar, o apoio aos desempregados a diminuir e a pobreza a crescer. É a crise económica e social que se anuncia com força. E perante isto um governo que se carateriza pela imobilidade, pela violação dos princípios éticos, perdendo a credibilidade, e que se revela insensível e cego aos problemas que os país e os portugueses enfrentam, e incapaz de tomar medidas para os enfrentar.

 

Estudo

O que espera os portugueses em 2023 – as ilusões criadas pelo governo e a dura realidade

Neste estudo vamos mostrar, utilizando dados, a maioria oficiais que, contrariamente ao que afirma o governo, inflação vai continuar a ser elevada em 2023, impulsionada, não pela espiral salários/preços, a justificação habitual do governos e patrões para manter baixos salários (e estes e as pensões vão perder poder de compra em 2023 a não ser que a luta dos trabalhadores e pensionistas consiga inverter isso), mas sim também devido à espiral impostos/preços (cobrança de enorme receitas fiscais pelo Estado); que a situação no SNS e na ADSE vai-se agravar; que a estagnação da economia e mesmo a recessão económica é inevitável; que o desemprego vai continuar a aumentar; e que o atraso de Portugal em relação à média da U.E vai-se acentuar. É o cenário real que o país enfrentará se a guerra e as sanções continuarem e também como consequência de um governo que se tem revelado incapaz de responder atempadamente e com coerência com medidas para enfrentar a grave crise económica e social. É necessário não alimentar ilusões e falar verdade aos portugueses.

INFLAÇÃO ELEVADA EM 2023 ENQUANTO A GUERRA E AS SANÇÕES CONTINUAREM

É uma ilusão pensar ou dizer, como faz o governo e Mário Centeno, que a inflação é temporária e que vai diminuir rapidamente. Para concluir isso interessa analisar a subida de preços da energia fundamental paras as famílias e para a competitividade das empresas, e a dos produtos alimentares essenciais para as famílias nomeadamente de médios e baixos rendimentos. O gráfico 1 (dados INE), mostra a variação em 2022.

Em nov.2022, os preços dos produtos alimentares e bebidas não alcoólicas era superior em 20% aos preços de nov.2021. E entre out.2022 e nov.2022, os preços continuaram a aumentar. E os preços dos produtos energéticos em nov.2022 eram superiores aos de nov.2021 em 24,7% embora a evolução tenha sido irregular devido à quebra na atividade económica, e à proximidade de uma recessão económica.

Para se poder avaliar o impacto da guerra causada pela invasão da Ucrânia pela Rússia, e das sanções da U.E. e o efeito ricochete nos países da U.E., bem como da retaliação da Rússia na escalada de preços é necessário conhecer qual a importância da Rússia no quadro dos principais exportadores mundiais de petróleo, de derivados deste, de gás, de cereais e de fertilizantes, e a dependência da U.E. das exportações russas.

A Arábia Saudita é maior exportador de petróleo do mundo com 6,5 milhões de barris por dia, mas o 2º é a Rússia com 5,4 milhões de barris por dia; a nível de derivados do petróleo (ex. gasóleo em que a capacidade de refinação na U.E. é inferior ao consumo) a Rússia é 2º maior exportador mundial com 2,8 milhões de barris por dia (o 1º é os EUA). Em relação ao gás, a Rússia é o maior exportador mundial com 241 milhões de m3/ano (20% do total), sendo o 2º os EUA com 180 milhões m3 (15% do total). A dependência da Europa em relação à energia russa era enorme : cerca de 41% das importações de gás da U.E. eram da Rússia e cerca de metade das exportações de petróleo russo tinham como destino a U.E. É uma ilusão pensar que a U.E. alcançará a rapidamente a independência energética como Bruxelas procura vender enganando os europeus.

Ao excluir o gás, o petróleo e os seus derivados russos do mercado de compras da U.E., a oferta reduz-se, pois, a Rússia é tem o peso muito grande, devido ao volume das suas exportações, e como a pressão da procura aumenta verificar-se-á uma subida inevitável dos preços das importações de energia dos países da U.E. O limite de 60€ para o barril de petróleo aprovado pela CE só funcionaria se a Rússia aceitasse tal imposição, mas o governo russo já respondeu decretando que a partir do início de fev.2023 a Rússia deixará de vender petróleo a todos os países que tentarem impor tal limite. E a Rússia vai desviar a sua oferta para outros países (China, India, Turquia, etc.) que não aderiram as sanções. Esta fuga para a frente da U.E. perante o fracasso das sanções anteriores virar-se-á contra os países da U.E. O gás e o petróleo de xisto exportado pelos EUA, associado aos elevados preços dos transportes, tem um custo muito mais elevado. Por isso a escalada de preços de energia vai continuar na U.E., incluindo em Portugal. E a U.E. ficará cada vez mais dependente dos EUA, cuja preocupação principal é a defesa dos seus interesses (ex.: o “Ato de Redução da Inflação” de Biden prejudica os interesses europeus) A vida dos europeus vai se agravar e a economia europeia perderá competitividade.

A Rússia e a Ucrânia são também grandes exportadores mundiais de cereais. Em 2020, segundo a FAO, em relação ao trigo, essencial à alimentação humana, a Rússia foi o maior exportador com 37, 2 milhões de ton./ano, seguida pelos EUA com 26,1 milhões de ton/ano e pela Ucrânia com 18 milhões de ton/ano. No milho, essencial para a alimentação animal, o maior exportador são os EUA com 51,8 milhões ton./ano e logo a seguir a Ucrânia com 27,9 milhões de ton. Nos fertilizantes, as exportações russas representam 15,6% das exportações mundiais, o Canadá 14,5% a China 10% e a Bielorrússia 7,4%. É evidente que a exclusão da Rússia dos mercados onde a U.E. adquire estes bens devido às sanções, e da Ucrânia causado pela guerra, determinará um aumento significativo de preços. Se associarmos a isto, o disparar das taxas de juro, que vão continuar a aumentar em 2023 como o BCE já anunciou, afirmar neste contexto que o aumento de preços é temporário e vai diminuir rapidamente é criar ilusões e enganar os portugueses. Para 2023, o governo prevê uma inflação de 4%, que não merece crédito. A previsão da OCDE é de 6,6% e o próprio Banco de Portugal prevê 5,8%.

A ESPIRAL DE IMPOSTOS/PREÇOS E NÃO DE SALÁRIOS/PREÇOS

A subida enorme das receitas de impostos tem contribuído fortemente para o aumento de preços.

Quadro 1 – Aumento das receitas de impostos previsto para o ano de 2022 e o obtido só até novembro 2022

O Orçamento do Estado inicial de 2022 aprovado pela Assembleia da República, previa um aumento de receitas de impostos de 3000 milhões (6,6%) relativamente a 2021. No entanto, como revelam os dados do Ministério das Finanças, o aumento de receitas fiscais só até nov.2022 quando comparado com igual período de 2021, já atingiu 7053 milhões €, ou seja, 2,35 vezes mais do que o aumento previsto no orçamento inicial.

No IRS, o aumento de receita cobrada até nov.2022 é já 1140 milhões €, que é superior em 75,4% ao aumento previsto no orçamento inicial deste ano. Em relação ao IRC, que incide sobre os lucros das empresas, o aumento arrecadado até nov.2022 é 10,2 vezes superior ao aumento previsto no orçamento inicial, o que prova que os lucros das empresas disparam em 2021. A nível de IVA o aumento arrecadado até nov.2022 (3188M €) é já 65,3% superior ao aumento previsto no orçamento (1818M€). Esta subida de receita de IVA é também conseguida à custa de uma taxa de IVA de 6% sobre os produtos alimentares quando em Espanha é de 4%, e o governo espanhol decidiu reduzi-la a ZERO. Mas Costa/Medina continuam a querer manter esta taxa para brilharem em Bruxelas com a redução do défice embora à custa dos mais de dois pobres que pagam também esta taxa de IVA sobre o que comem. A escalada de preços está a causar a perda continuada do poder de compra dos salários como provam os dados do INE do quadro 2. E das pensões a analisar em outro estudo.

Quadro 2 – A perda de poder de compra das remunerações ilíquidas dos trabalhadores do setor privado e do setor público – jan.2022 a set.2022


Segundo o INE, em set.2022, o poder de compra das remunerações ilíquidas dos trabalhadores do setor privados era inferior ao de set.2021 em -3,9% e o poder de compra dos trabalhadores do setor público era inferior em -6,3% em relação ao de 2021. Esta perda de poder de compra vai continuar em 2023 (os patrões não vão cumprir o aumento de salários que assinaram na concertação social, e o aumento de 52€ ou 2% aos trabalhadores da Função não compensa a inflação em 2023), a não ser que os trabalhadores com a sua luta consigam a inverter.

A ESTAGNAÇÃO DA ECONOMIA PORTUGUESA E O CAMINHAR PARA RECESSÃO ECONÓMICA

Os dados do INE referente aos três primeiros trimestres de 2022, revelam que a economia estagnou.

Quadro 3 – Variação trimestral do PIB português a preços constantes em 2022

A partir do 1º Trim.2022, a economia portuguesa praticamente deixou de crescer, pois, a subida trimestral do PIB foi mesmo inferior a meio por cento (0,12% e 0,38%), o que é um indicador do que acontecerá em 2023.

Várias entidades internacionais e nacionais preveem um crescimento económico em 2023 que varia entre 0,1% (COSEC/Allianz-Trade), 0,7% (FMI e CE), 1,3% (governo) e 1,5% (Banco de Portugal). E está ancorado numa taxa de crescimento do investimento (FBCF) muito superior à do consumo privado (respetivamente 2,9% e 0,2%), quando a experiência tem mostrado que o que acontece é precisamente o contrário. É mais do que certo que tal previsão de crescimento económico mesmo anémico não será atingida. Em 2022, o do investimento publico previsto em novembro apenas tinha sido realizado 51%, cerca de metade Esta conclusão é reforçada pelo facto de se prever que o preço de energia vai continuar a aumentar devido às novas sanções aprovadas por Bruxelas, o que determinará que a economia europeia, incluindo a portuguesa, perderá competitividade face a outras economias que têm energia mais barata. E o aumento da taxa de juro que o BCE já anunciou associada à perda de poder de compra da população reduzindo o consumo criarão mais um obstáculos à recuperação da economia pois o consumo interno é que tem sido o “motor” principal.

O DESEMPREGO JÁ COMEÇOU A AUMENTAR, O APOIO AOS DESEMPREGADOS A DIMINUIR, E A POBREZA A SUBIR

O gráfico 2 (dados oficiais) resume com clareza o que acontece nesta área importante para os trabalhadores.


Entre jun.2022 e out.2022, o desemprego real aumentou de 416600 para 446700 (INE); o número de desempregados a receber subsídio, segundo Segurança Social diminuiu de 163772 para 161815 (46,5% dos desempregados estão na pobreza segundo o INE); o número de desempregados que se inscrevem nos Centros de Emprego subiu de 32505 para 50580 por mês, e os desempregados que os Centros de Emprego conseguiram arranjar trabalho diminuiu de 7754 para 6756 por mês. É a crise económica e social a iniciar-se com força que se agravará em 2023 perante a passividade do governo só interessado em reduzir o défice.

UM GOVERNO PASSIVO, SUBSERVIENTE À COMISSÃO EUROPEIA, INDECISO E INCAPAZ DE TOMAR MEDIDAS NECESSÁRIAS PARA ENFRENTAR A GRAVE CRISE ECONÓMICA E SOCIAL, E AINDA POR CIMA DESGASTADO POR INUMEROS CASOS DE ÉTICA

O país vive já os efeitos de uma grave crise económica e social que é previsível que se agrave em 2023 como já mostramos neste estudo, e o governo dá provas claras de que é incapaz de tomar as medidas necessárias e atempadas integradas num plano coerente para minorar os seus efeitos quer nas famílias quer na economia. Como revelamos no estudo 52-2022 de 3/12/2022, a DIVIDA DO SNS a fornecedores privados atingia, em out.2022, 2350 milhões € e o governo anunciou recentemente a transferência de apenas 1000 milhões € para a pagar, ficando por pagar mais de 1350 milhões € pois a divida do SNS não parou de crescer depois de out.2022.

O ministro da Saúde fala que o ORÇAMENTO DO SNS DE 2023 é suficiente, mas se se analisar esse orçamento conclui-se que a previsão de aumento das despesas correntes, que garantem o funcionamento do SNS, é 3,8% e nas despesas de pessoal, fundamentais para pagar remunerações dignas aos profissionais de saúde, o crescimento previsto é somente de 2,9% em relação ao despendido em 2022, portanto aumentos muito inferiores à inflação que se verificará em 2023. E inflaciona-se o orçamento com despesas com investimento de 914 milhões € em 2023 que depois não se realizam. A provar isso está 2022 , em que estão previstos 509,2 milhões € de investimento no SNS e até outubro só foi realizado 168,5 milhões € (33%). O SNS só tem conseguido funcionado mesmo deficientemente à custa de um enorme endividamento aos fornecedores privados. Até parece que o ministro da Saúde não leu nem conhece o orçamento do SNS para 2023. O estrangulamento do SNS continuará devido à falta de recursos pois o novo diretor executivo do SNS não é um santo milagreiro, nem “transforma pedras em pães”.

Em relação ao AUMENTO DA POBREZA no país, consequência da escalada de preços, o que se verifica por parte do governo são medidas pontuais, autênticas esmolas (agora em dez.2022, os 240€), que atenuam no momento a situação das famílias pobres (mais de 2 milhões de portugueses) mas não de uma forma permanente. Os desempregados a receber subsídio de desemprego diminuem, mas o desemprego aumenta e 46,5% estão na pobreza segundo o INE.

A nível de INVESTIMENTOS e de utilização dos fundos comunitários do “Portugal 2020”, do “PRR” e do “Portugal 2030” os atrasos e adiamentos acumulam-se por falta de técnicos competentes para analisar os projetos apresentados pelas empresas e famílias e entidades. São os próprios responsáveis que dizem que não conseguem contratar. Com as remunerações praticadas na Função Pública é evidente que se consegue contratar pessoal competente. Mas o governo mantém-se passivo, não resolve nada e o país corre o risco de não utilizar eficiente e atempadamente ou até de perder fundos tão necessários para combater a grave crise económica e social.

Na ADSE, o bloqueamento é enorme é um ex. do que acontece em toda a Administração Pública. O Departamento de Consultoria Clínica, que aprova cirurgias e medicamentos que os beneficiários necessitam, está sem diretor há 6 meses, e não se consegue contratar um novo diretor porque se está à espera de um despacho da Secretária de Estado da Administração Pública há vários meses que adia e é incapaz de fazer um simples despacho. Também está parado na mesma Secretaria de Estado a Tabela do Regime Convencionado da ADSE com os novos preços, apesar de por lei ser da competência do Conselho Diretivo da ADSE, mas a Secretária de Estado ignora a lei e quer controlar tudo, embora não tenha conhecimentos para o fazer, perante a passividade dos 2 membros do conselho diretivo nomeados pelo governo, correndo-se o risco de no início de 2023 de mais atos e mais médicos saírem das convenções da ADSE como já ameaçaram os grandes prestadores , o que teria consequências graves para os beneficiários pois teriam menos médicos e menos cirurgias. DEIXO JÁ AQUI ESTA ALERTA AOS BENEFICTÁRIOS DA ADSE É o “quero, posso e mando” da maioria absoluta a funcionar no seu esplendor e o país e os portugueses a sofrerem.


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