Ficou conhecida a frase de Clausewitz – Carl Phillip Gottlieb von Clausewitz (1780-1831) general prussiano, autor de «Da Guerra», considerado um grande estratega militar e teórico da guerra – em que este associou guerra e política, quando afirmou que “A guerra nada mais é que a continuação da política por outros meios”. Com o advento da industrialização da guerra talvez seja hoje igualmente curial que as guerras não serão apenas sobre estratégia militar, pois a economia nunca está longe.
O cenário de guerra que actualmente vivemos no leste europeu encontra óbvias semelhanças com conflitos anteriores (no cenário europeu e não só) e até a chantagem que hoje o ocidente exerce sobre os hidrocarbonetos russos se afigura numa clara reminiscência do choque do petróleo causado pela Guerra do Yom Kippur (episódio do conflito israelo-árabe em 1973) ou até com o boicote petrolífero imposto pelos EUA ao Japão durante a II Guerra Sino-Japonesa (1937-1945), conflito que se fundiria com a II Guerra Mundial (1939-1945) e que hoje muitos historiadores consideram como o início desta.
Mas a industrialização da guerra e o crescente peso dos interesses económicos nos conflitos remonta a meados do século XIX e à consolidação da hegemonia do Império Britânico – ditada pelo resultado das Guerras Napoleónicas (1803-1815) – seguida da deslocação dos interesses da burguesia mercantil britânica para a Ásia que levou às Guerras do Ópio (1839-1842 e 1856-1860), assim chamadas por terem determinado a abertura dos portos chineses ao comércio inglês do ópio. Não que os conflitos anteriormente vividos um pouco por todos os continentes não tivessem também eles uma forte componente económica (iluda-se quem ainda pensar que mesmo a mítica Guerra de Troia se ficou a dever apenas ao desejo das cidades gregas reaverem a bela Helena e não à natural necessidade de eliminar a séria concorrência comercial que os troianos representavam), mas foi inegavelmente o despontar da industrialização dos exércitos que fez crescer a importante aliança industrial-militar que subjaz até à actualidade e ampliou os objectivos reais (normalmente não declarados) dos conflitos.
Se originalmente os seus objectivos eram sobretudo políticos, outros, como a apropriação de matérias-primas e de mão-de-obra, a expansão de mercados, ou até mesmo o cancelamento de dívidas, rapidamente ganharam expressão, não sendo, pois, de estranhar que a própria economia se tenha transformado numa arma, seja mediante o bloqueio às trocas comerciais do oponente, seja recorrendo a políticas de sanções económicas, mas principalmente através da mobilização da indústria e da tecnologia para aquisição de ascendente.
Outro facto histórico a ter em linha de conta é o da importância dos conflitos na superação de crises económicas. Ainda recentemente tivemos um bom exemplo disso com a recuperação económica da Grande Depressão de 1933 a resultar principalmente do esforço de produção de armamento e provisões necessárias para a II Guerra Mundial e não das políticas de Franklin D. Roosevelt, através do programa do New Deal (1933-1937), ou das teorias económicas de John Maynard Keynes.
Depois de uma guerra, a economia de vencidos e vencedores não volta a ser o que era; na fase da reconstrução, o Estado assume frequentemente um papel mais importante do que antes e no cenário internacional, novos actores começam a ganhar destaque.
Foi isto que vimos no final das Guerras Napoleónicas, com a ascensão do Império Britânico, e mais recentemente com o final da II Guerra Mundial e a ascensão dos EUA ao papel de potência hegemónica, assegurada pela quase completa destruição dos aparelhos produtivos das principais economias mundiais. O que o futuro nos reserva poderá não ser igual, mas os seus contornos já se estão a desenhar…