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João de Sousa

Sexta-feira, Novembro 22, 2024

As vidas ceifadas

A meia altura voou uma bala saída do cano de uma espingarda.

Não hesitou o dedo da mão treinada para o efeito que premiu o gatilho e a que se seguiu o estouro de um fulminante que incendiou o rastilho da pólvora propulsora da  bala projetada ar fora!

Dentro de uma vala, o homem fardado, limpou o suor na testa, respirou fundo, e poisou a cabeça na terra do campo, antes de trigo, e agora de batalha.

No outro lado da estrada havia uma escola aonde brincavam crianças durante a hora do recreio. Uma delas caiu, redonda.

Foi atingida pela bala disparada pelo soldado acoitado na vala aberta no campo situado do outro lado da estrada em frente à escola. No meio da estrada, o desespero de sua mãe já não tem mais lágrimas para derramar. Secaram.

Já não tem voz para chorar. Atrofiaram as cordas vocais.Já não tem coração para sentir. Morreu com o seu filho. Já não tem um sopro de vida que lhe valha. Esse sopro esfumou-se na chama da angústia.

Correm agora rua afora, como corre o desespero, deixando sulcos rasgados na face lisa de uma jovem mãe.

Nesse seu trajeto, as lágrimas, levantam nuvem de pó da estrada despojada do asfalto por bombas traiçoeiramente lançadas por militares.

Em suma:

A jovem mãe também morreu, sem morrer.

Entrincheirou-se por detrás de uma fortaleza mascarada com todas as máscaras apropriadas para seguir em frente num mundo onde a hipocrisia é o maior disfarce para a sobrevivencia.

  • Ficaram-lhe os sulcos.
  • Ficou-lhe a raiva.
  • Ficaram-lhe os vazios.
  • Ficou-lhe a guerra.

… E, assim, a sua vida se esvaiu com a do filho num palco de um teatro de guerras à escala global a que os povos e os seus direitos, são alheios.

Um grande tabuleiro na mesa dos negócios nacionais e internacionais, onde a moeda de troca são sempre; as pessoas:

  • as mortes;
  • os estropiados;
  • os enfermos;

Sejam crianças, adultos, idosos, independentemente do sexo; das crenças; das ideologias políticas; de tudo o mais que constrói a diferença entre as pessoas, marcas indeléveis da liberdade e da democracia; desde que os superiores interesses de uma minoria de criminosos, com ou sem gravata, saiam reforçados e com garantia assegurada de continuidade por mais umas quantas décadas.

Porque uma guerra nunca acontece em resultado de um conjunto de birras individuais.

Uma guerra acontece sempre em defesa de um conjunto de interesses associados a grupos cartelizados com denominadores comuns. Até porque, enquanto que a birra é alicerçada em motivo fútil e por isso passageira.

O interesse tem motivo alicerçado na manutenção e conquista de objetivos de grupo aonde todos os meios servem para  justificar os fins a conseguir.

Estamos por isso perante duas condicionantes estruturais distintas. A primeira por, estruturalmente, resultar de circunstância. A segunda por, estruturalmente, resultar de condicionante formativa do intelecto associada a interesses transitado ou, a conseguir.

Os dividendos dos crimes, cometido por terceiros subjugados, é o premio que os mentores factuais  desses crimes recebem para vanglória da vida faustosa de que usufruem.

E por isso, e para isso, vão fabricando guerras pelos quatro cantos de um mundo de homens pequenos aonde proliferam as mães de cara lavada por lágrimas e crianças subnutridas condenadas a uma forma de viver que não merecem.

Os homens grandes, esses, morrem nos campos das batalhas.


Por opção do autor, este artigo respeita o AO90

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