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Sábado, Novembro 2, 2024

Belchior canta: “Voz da América”

Em 1979, o clima de ditaduras ainda pesava sobre a América do Sul. A repressão tolhia a liberdade de pensamento e de expressão. Tolhia as vozes.

Em 1979, o clima de ditaduras ainda pesava sobre a América do Sul. A repressão tolhia a liberdade de pensamento e de expressão. Tolhia as vozes.

Belchior, entretanto, lançou naquele ano a canção Voz da América, na qual reivindicava que sua voz pudesse ser ouvida: no rádio, pelo alto falante, na fúria das cidades. Ouvido por todos, por quem chega do trabalho, por quem “teve que partir para um país distante”, por “Inês, posta em sossego a sós”. Sua voz era, enfim, sua ferramenta: “Cantar, como quem usa a mão; para fazer um pão; colher alguma espiga”.

Uma ironia da música é o fato de ele falar em “El condor” em uma época em que a Operação Condor, que coordenava a repressão e a aniquilação de líderes de esquerda nos países do Cone Sul, ainda vigorava. Sua referência, entretanto, embora isso possa não ser uma coincidência, é a música de Paul Simon, El Cóndor Pasa, que, por sua vez, se refere a um musical, composto em 1913 pelo peruano Daniel Alomia Robles e Julio de La Paz.

Não à toa, Voz da América, traz um sentimento de unidade e solidariedade sul-americana. Como em outras canções, ele frisa que é um rapaz “latino-americano”, conclamando esta irmandade entre os povos “e o amor que traz a luz do dia; e deixa que o sol apareça; sobre a América; sobre a América, sobre a América do Sul”.

Voz da América

Composição: Belchior/1979
Intérprete: Belchior

El condor passa sobre os Andes
e abre as asas sobre nós.
Na fúria das cidades grandes
eu quero abrir a minha voz.
Cantar, como quem usa a mão
para fazer um pão,
colher alguma espiga;
como quem diz no coração:
– Meu bem, não pense em paz,
que deixa a alma antiga.
Tentar o canto exato e novo,
que a vida que nos deram nos ensina,
pra ser cantado pelo povo,
na América Latina.
Eu quero que a minha voz
saia no rádio, pelo no alto falante;
que Inês possa me ouvir, posta em sossego a sós,
num quarto de pensão, beijando um estudante.
Quem vem de trabalhar bastante
escute e aprenda logo a usar toda essa dor
quem teve que partir para um país distante
não desespere da aurora, recupere o bom humor.
Ai! Solidão que dói dentro do carro…
Gente de bairro afastado,
onde anda meu amor?
Moça, murmure: Estou apaixonada,
e dance de rosto colado, sem nenhum pudor.
E à noite, quando em minha cama
for deitar minha cabeça,
eu quero ter cabeça
eu quero ter daquela que me ama
um abraço que eu mereça;
um beijo: o bem do corpo em paz,
que faz com que tudo aconteça;
e o amor que traz a luz do dia
e deixa que o sol apareça
sobre a América,
sobre a América, sobre a América do Sul.


Texto em português do Brasil

Exclusivo Editorial Rádio Peão Brasil (Centro de Memória Sindical) / Tornado

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