O presidente Jair Bolsonaro e o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, estão conseguindo acabar com Fundo Amazônia, considerado o maior programa de combate ao desmatamento e de desenvolvimento sustentável no país.
A crítica é feita pelo coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista da Câmara dos Deputados, Nilto Tatto (PT-SP), para quem as ações tanto do presidente quanto do ministro são no sentido de destruir o programa.
Responsável pelo repasse de 93,8% dos R$ 3,4 bilhões destinados ao fundo, a Noruega anunciou na quinta-feira (15) a suspensão de mais um repasse de R$ 132,6 milhões. A Alemanha já havia suspendido R$ 155 milhões.
Num tom bélico, Bolsonaro debochou da situação: “A Noruega não é aquela que mata baleia lá em cima, no Polo Norte, não? Que explora petróleo também lá? Não tem nada a dar exemplo para nós. Pega a grana e ajude a Angela Merkel a reflorestar a Alemanha”, afirmou Bolsonaro.
O ministro Salles recebeu a notícia apático. Disse que não ficava supresso com a suspensão dos repasses. “O fundo está suspenso. Portanto tem que aguardar o resultado para poder ver se vai ter a destinação”, disse ele.
“Isso é muito sério para toda a luta pelo clima. A Amazônia é o pulmão do mundo e todos nós dependemos inteiramente da proteção da floresta tropical lá. Não há cenários para atingir as metas climáticas sem a Amazônia”, disse o ministro do meio ambiente da Noruega, Ola Elvestuen na entrevista.
“Em poucos dias o Brasil perdeu R$ 155 milhões da Alemanha, mais R$ 130 milhões da Noruega. Recursos que seriam aplicados na preservação da Amazônia. Nada mal para a dupla Bolsonaro e Salles que tramam destruir o Fundo Amazônia”, publicou no Twitter o parlamentar.
Ele lembrou que, por diversas vezes, Bolsonaro chamou o Ibama de “indústria de multas”. “Sinalizou aos desmatadores que podem continuar desmatando. Não por acaso deseja o fim do fundo que financia o deslocamento das equipes do Ibama na região”, criticou.
Recursos do fundo bancaram o aluguel de veículos especiais como helicópteros para o Ibama fazer operações na região. Desde o ano passado, o Instituto recebe recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para essa finalidade. Há um contrato com Ibama com recursos do fundo da ordem de R$ 140 milhões.
O deputado diz que a imagem de Bolsonaro no exterior é de inimigo do meio ambiente. “Em horário nobre, programa da principal rede de televisão pública da Alemanha satiriza o governo brasileiro, criticando suas políticas ambientais e agrícolas e o crescente desmatamento na Amazônia”, diz.
A deputada Professora Marcivânia (PCdoB-AP) diz que a imagem do país está em baixa no cenário mundial. “O que isso expressa é a falta de confiança que o país desperta na comunidade internacional, ou seja, não há credibilidade de que o governo Bolsonaro possa tocar uma política de sustentabilidade. Há que levar em consideração que a Amazônia é essencialmente dos nortistas, do Brasil e do interesse mundial”.
Alegações falsas
Em artigo publicado originalmente no jornal alemão Frankfurter Allgemeine, Adriana Ramos, sócia do Instituto Socioambiental (ISA), que desenvolve projetos no Amazonas e Mato Grosso com recursos do fundo, diz que as preocupações do ministro Salles com a gestão do programa são falsas. “A verdade é que (ele) não tem nenhum interesse no combate ao desmatamento”, diz a ambientalista.
“Enquanto atendia as demandas do ministro, a equipe do Fundo Amazônia paralisou os processos de aprovação de projetos, e com isso o novo governo já conseguiu seu intuito, que é limitar o alcance das iniciativas que enfrentam os desmatamentos”, denunciou.
O instituto de pesquisa Imazon divulgou nesta sexta-feira (16) um aumento de 66% no desmatamento da Amazônia no mês de julho de 2019, em comparação com o mesmo período no ano passado.
Ela lembrou também que o objetivo de Bolsonaro era extinguir a pasta do meio ambiente. “No momento não há sequer clareza sobre que setor do governo tem a responsabilidade de zelar pelos compromissos de redução do desmatamento assumidos pelo Brasil no âmbito da Convenção do Clima”, diz.
Adriana Ramos afirmou que o governo ataca a estrutura de governança do fundo, pois as condições estabelecidas pelos doadores para a criação do programa foi que houvesse “diversidade de atores sociais participando dos esforços de redução de desmatamento”.
“Seguindo uma orientação geral do governo de reduzir a participação da sociedade nos diferentes conselhos que acompanham e definem as diretrizes de cada política setorial, o ministério está atualmente tentando restringir a participação da sociedade civil no Comitê Orientador do Fundo Amazônia”, afirmou a ambientalista.
Para ela, o objetivo do governo é redirecionar os recursos para indenizar a desapropriação de terra aos proprietários rurais cujas terras estão em áreas protegidas. Esse tipo definanciamento não permitido pelas regras atuais do programa.
O Comitê Orientador do Fundo Amazônia (COFA), presidido pelo Ministério do Meio Ambiente, é composto por representantes do governo federal, dos governos estaduais da Amazônia e da sociedade civil, representados pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Confederação Nacional da Indústria (CNI), Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (CONTAG), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) e Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento.
Relatório de atividade
No relatório de atividade divulgado este ano, por conta dos dez anos do programa, o então presidente do BNDES, Joaquim Levy, disse que trajetória do programa “tem se mostrado positiva não só nos aspectos quantitativos, com o crescimento das doações recebidas, dos projetos aprovados e dos desembolsos de recursos; mas também em aspectos qualitativos de sua atuação, como a ampla distribuição territorial”.
Os números divulgados são expressivos. São 190 unidades de conservação apoiadas; 746 mil imóveis rurais inscritos no Cadastro Ambiental Rural (CAR); 162 mil pessoas beneficiadas com atividades produtivas sustentáveis; 687 missões de fiscalização ambiental efetuadas; 465 publicações científicas ou informativas produzidas; 65% da área das terras indígenas da Amazônia apoiadas; 338 instituições apoiadas diretamente e por meio de parceiros.
Em 2018, chegou-se ao total de 103 projetos apoiados. Dos R$ 3,4 bilhões, R$ 1,9 bilhão foi aprovado para os projetos, sendo R$ 1,1 bilhão já desembolsado. Dos recursos arrecadados 93,8% foram doados pela Noruega, 5,7% da Alemanha e 0,5% da Petrobrás.
por Iram Alfaia | Texto original em português do Brasil
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