A passagem de Bolsonaro por Nova York no início da semana que vem dará a medida da decadência do Brasil no chamado concerto das Nações.
Nas ruas, os protestos começarão já no domingo mas diplomatas receiam que muitos governantes retirem-se do plenário, quando ele for discursar na abertura da Assembléia Geral da ONU, no dia 24, em número bem maior que o dos seis presidentes latino-americanos que bateram em retirada quando Michel Temer começou a falar, em 2016, por considerá-lo golpista e usurpador.
Na segunda-feira, a prova viva de que o Brasil perdeu o protagonismo e a relevância que conquistou nas últimas décadas na questão ambiental. Vetado pela ONU, nenhum representante do país discursará na Cúpula do Clima.
No dia seguinte, Bolsonaro pode ser recebido por um plenário esvaziado. Agora, mais países têm razões mais fortes e consistentes que aqueles de 2016 para não quererem prestigiar a fala do presidente brasileiro, temendo serem associados com qualquer uma das marcas negativas que lhe conferem uma quase “unanimidade na repulsa”, como o antiambientalismo, a defesa de ditaduras, o homofobismo e o misantropismo e a vulgaridade extrema no exercício do cargo. Certamente ele contará com Trump, que como segundo a falar, já deve estar no plenário.
A diplomacia acha também que terá enorme dificuldade, neste ambiente, para marcar encontros bilaterais paralelos, atividade a que todos os governantes se dedicam durante a Assembleia Geral. Bolsonaro, por sinal, já fez circular a notícia de que deixará Nova York logo depois de discursar para comparecer a um encontro empresarial no Texas. Muito oportuno.
O recente ataque de Bolsonaro à Alta Comissária da ONU para Direitos Humanos, a ex-presidente chilena Michele Bachelet, também deve contribuir para o que ambiente na instituição não seja exatamente amigável ao visitante brasileiro. Como vimos há poucos dias, por ter ela declarado que o espaço democrático no Brasil se reduziu, algo sabido até pelas ararinhas azuis, que são tão poucas, Bolsonaro desferiu-lhe um ataque sórdido, louvando a ditadura de Pinochet por ter liquidado com os comunistas que tentavam fazer do Chile uma Cuba, entre eles o pai dela – torturando até à morte pelos torcionários.
Ao confirmar a viagem, após autorização médica, ele disse que vai lá “enfrentar os europeus”. Seja lá o que isso signifique, os europeus são mesmo os que têm menos razões para prestigiar sua fala. Noruega e Alemanha foram destratadas com a recusa dos recursos do Fundo Amazônia. Da Europa partiram e continuam vindo as críticas mais duras ao aumento das queimadas e do desmatamento da floresta, que culminaram nos atritos com o presidente francês Emmanuel Macron. Da Austria veio a notícia de que o Acordo União Européia-Mercosul foi para o vinagre. O parlamento austríaco determinou ao governo nacional que vete o acordo no Conselho Europeu. E sem unanimidade no conselho, não haverá acordo. Bolsonaro poderá atacá-los à vontade com a retórica da “Amazônia é nossa” mas é mesmo bastante provável que fale para mais cadeiras vazias do que ocupadas.
Nas ruas, a coisa será quente. Nesta sexta-feira, houve protestos em várias partes do mundo contra as mudanças climáticas. Na segunda-feira, em Nova York, entidades farão um “ato de resistência” contra Bolsonaro na cidade e protestos acontecerão também durante seu pronunciamento, na terça-feira, sob a égide da campanha nas redes “cancelBolsonaro.
Texto original em português do Brasil
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