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Segunda-feira, Novembro 4, 2024

Bruxelas já está a arder?

Mendo Henriques
Mendo Henriques
Professor na Universidade Católica Portuguesa
Faculdade de Ciências Humanas, Universidade Católica Portuguesa
Faculdade de Ciências Humanas, Universidade Católica Portuguesa

Mas boa parte dos europeus sente-se ameaçada por não ver resposta nem fim para a guerra insidiosa movida do interior da Europa por grupos de islâmicos europeus, apoiados por minorias radicalizadas.

A guerra assimétrica é de há muito estudada nos estados-maiores. Lenda ou realidade, David lançou uma pedra de funda que acabou com Golias. As guerras de guerrilhas moeram até que foram perdidas nas mesas de negociações. E com a guerra dos grupos terroristas, como será?

Nesta fase do séc. XXI, as guerras não nascem da potência mas da fraqueza dos estados, como demonstrou Philippe Delmas. O fracasso da política é fonte de conflitos. E as guerras em curso são filhas do caos: ou estouram em áreas de poder enfraquecido, como a Síria, ou aproveitam-se de áreas com dificuldades em definir um rumo, como a Europa.

Mas por detrás de todas a guerras, o pai de todos os conflitos é o conflito entre a animalidade e a humanidade do homem. Quando este assunto está desaparafusado surgem monstros, como Hitler, Estaline Mao Zedong e os seus imitadores de tanga como os terroristas. A política é originariamente biopolítica, como mostrou Giorgio Agamben, em O homem e o animal (2002)

Se há coisa que este início do séc. XXI mostrou é que o modo de enfrentar a animalidade humana leva a percepções muito diferentes de segurança para os diversos agentes políticos. As comunidades supra-estatais sabem definir a segurança mas mal a conseguem implementar; veja-se o apagamento da ONU, vejam-se as dificuldades da Europa.

Com o fim das rivalidades tradicionais na Europa – efeito benéfico – a classe política europeia perdeu ligação aos povos – défice democrático. E uma classe política só é solidária com uma população quando enfrenta uma ameaça comum e mantém coesão económica no território. Quando, pelo contrário, fica refém de interesses financeiros nómadas, quer lá saber da humanidade e da inclusão social.

Os indivíduos, esses procuram a segurança e a humanidade onde ela existir, onde lhes derem pão e paz e abrigo e trabalho, frequentemente fora e por vezes contra o seu Estado. Assim procedem os refugiados económicos e os refugiados de guerra; assim o confirmam os Prémios Nobel da Paz nos últimos 15 anos.

Há quem chame a isto a “sociedade de risco”: não podermos eliminar das nossas vidas os imponderáveis que são as catástrofes provocadas por nós mesmos.

Mas uma “sociedade de risco” só sobrevive se agir de imediato na segurança e se agir sobre as causas profundas, ou seja: se tiver carradas de bom senso, inclusão social, medidas de segurança, e esperança na humanidade.

Comecemos pelo mais difícil: a esperança na humanidade. A Europa criou os direitos humanos que são uma forma de ter fé na humanidade: fé sem religião, mas fé. E essa fé é superior aos fundamentalismos. A Arábia Saudita tem três milhões de tendas junto a Meca usadas cinco dias por ano, mas não as oferece para ajudar os refugiados, seus irmãos em Allah, como lembra Frei Bento Domingues

bruxelasMedidas de segurança. As actuações repressivas que estão a ser feitas, quer sobre as células terroristas, quer na prevenção de novas ações, têm tido êxito. Bruxelas não está a arder. Mas a classe política tem que abandonar o politicamente correto de fazer pouco e tarde e a medo. E tem que envolver no processo os líderes moderados das comunidades islâmicas.

As medidas contra a exclusão social, nomeadamente de cidadãos que chegam à União Europeia, são vitais. Onde houver fome de alimentos ou fome de inclusão, haverá conflito e o animal humano virá ao de cima.

O restante é a longo prazo , são as causas profundas. Conta a evolução no mundo muçulmano, um exame de consciência que já começou entre Os novos Pensadores do Islão; e conta enfrentar a Arábia Saudita wahabista que financia o terrorismo através das mesquitas e madrassas com que procura travar a decadência intelectual do Islão.

A “sociedade de risco” depende de um talvez não numeroso centro, suficientemente grande para jogar em casa, quer nas velhas tradições como nas novas tecnologias e saberes; suficientemente rigoroso para levar a cabo as transições que têm de ser feitas na inclusão social; e suficientemente forte para recusar as meias medidas de segurança e insistir em soluções completas, mesmo que estas tenham que esperar.

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