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Quarta-feira, Julho 17, 2024

Carta à minha memória

Filipa Vera Jardim
Filipa Vera Jardim
Mantém o blogue literário “Chez George Sand” onde escreve regularmente.

I . Sapatos de Verniz

Minha Memória,

Não sei o que aconteceu. Tinha-os guardado no armário entre o bibe de todos os dias, e a saia que trouxe da festa… E agora desapareceram!

Lembras-te certamente. São os pretos, de verniz. Não aqueles de sempre, herdados da prima, com a presilha meio rebentada que já decoraram todo o caminho da escola, mas os outros, de botão de festa.

Quase não sabem nada esses sapatos. Acho que nem nunca saíram de casa.

Foram comprados na Sapataria Ratinho para um Natal. A avó escolheu-os e tentou enfia-los várias vezes nos meus pés que balouçavam no carrossel que rodava, e rodava e rodava, enlouquecido, a meio da loja.

Eu sei que te lembras, estavas lá, junto à porta, não fosse a avó se esquecer da cor, ou do número, ou então os meus pés se lembrarem de crescer justamente naquele instante e ser preciso uma memória para entender. Os pés das crianças crescem tantas vezes num único instante e só as memórias os entendem.

E agora que não os encontro…

Ainda vou procurar melhor numa cómoda cá de casa onde se guardam coisas insignificantes, coisas importantes, chapéus e se calhar sapatos de verniz. Pode ser que lá estejam. Pelo menos um… Mais não seja, um.

O outro, lembro-me agora, tinha aquela mania de se esconder debaixo da cama… Não, já não está lá.

Sabes memória, já são muitos anos. Eu e tu, nesta coisa de te perguntar o que não se acha, o que nem sequer se sabe se existiu.

Eu sei que vives de recordações. Acho que é exactamente por isso que te escrevo.

Tenho saudades sabes. Muitas saudades e, além disso, preciso das recordações.

Vê se me mandas dizer dos sapatos. De um, ou dos dois, se puderes.

Agora vou selar a carta. Com um selo deste tempo e deita-la num qualquer marco da vida. Vai chegar num instantinho ou, se calhar, não. Mas isso não é nada importante. O tempo, será apenas o das tuas e das minhas recordações.

Saudades, mil minha memória.

 


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