Médica dentista; desempenhou diversos cargos autárquicos, incluindo o de vereação em Cascais entre 2013-2017.
Dirigente Associativa do Movimento Não Apaguem a Memória e membro da Plataforma Cascais-movimento cívico. Militante do PS.
“Portugal é um dos países mais perigosos do mundo na Covid-19” ?!
Caro Pedro,
Conhecemo-nos já há algum tempo e até travámos batalhas conjuntas. Poupo-te a referências aos meus pergaminhos porque não sou desse género. Lembro-te apenas que também os tenho e que, sobretudo, não estão associados à indústria farmacêutica. Trabalho – como sabes sou médica dentista – no sentido de continuar a prover os cuidados de emergência à população a quem dizes ter tanto “amor profundo”. Eu continuo a trabalhar e milhares de outros profissionais de saúde (e não só) continuam a fazê-lo para que não somente a saúde seja acautelada, mas também para que haja serenidade com vista ao desenvolvimento social e económico.
Compreendo que do teu “exílio” (como lhe chamas) possas ter uma interpretação enviesada do que por Portugal se passa, mas (para incredulidade minha), enveredaste por um caminho no qual não te reconheço, nem sequer cientificamente. Pelo tom do teu artigo não me parece que estejas sensível a verificar que entre a “verdade” que queres apresentar e a realidade de factum existe uma diferença considerável – há dados (“factos” como lhe chamas) que omites e, misteriosamente, desconsideras outras fontes de informação epidemiológica – diria que é grave para quem é tão diplomado e acusa outros de estarem na “idade das trevas”.
Mas vamos à informação da Johns Hopkins (e de outra fonte) recorrendo aos mesmos dados que utilizas (normalizados pelo tamanho da população e, sempre que possível, no mesmo dia que consideras 14.04.) para aferir sobre as tuas conclusões “científicas”:
Começas por concluir que “Portugal é um dos piores países do mundo em número de casos confirmados de doentes infectados com COVID-19”.
Em primeiro lugar falta-te esclarecer que este número depende do número de testes realizado. É obvio – qualquer pessoa de 5 anos o sabe – que quanto mais testes forem realizados, mais casos encontras. Na tua interpretação da realidade proporcionas a que se considere que o Zimbabwe está epidemiologicamente melhor que Portugal porque há data de 14.04 tinha 1.1 infectados por milhão de pessoas ainda que tivessem sido realizados menos de 48 testes por milhão, quando, por comparação, em Portugal já se haviam realizado perto de 8.000 testes por milhão de pessoas permitindo a identificação dos tais 1700 infectados por milhão que hipervalorizas.
De acordo com a informação, internacional e comparada, sobre o número de testes realizados por milhão de pessoas constata-se que Portugal se encontra quantitativamente acima de um conjunto significativo de países, incluindo da Alemanha; da Áustria; dos Países Baixos e da República Checa.
Em segundo lugar não referes o comportamento da curva epidemiológica. Para fazeres valer o teu argumento de que “Portugal é um dos piores” tentas fazer esquecer uma variável basilar: o tempo. Na tua análise fixista, na qual Portugal nem sequer está no top 10 dos casos confirmados (Vaticano; San Marino; Andorra; Luxemburgo; Islândia; Espanha; Suiça; Bélgica; Irlanda; Itália; Portugal) falta-te referir que chegámos ao dia 14.04 com um achatamento da curva melhor que o de todos os outros países com que anteriormente se comparou.
Em seguida concluis que “somos dos mais letais países por Covid-19”. Nada mais falso!
Quando excursas sobre os “50 mortos por cada milhão de habitantes” estás a confundir – lamento ter que to apontar – os conceitos de mortalidade e de letalidade. A mortalidade refere-se às fatalidades por Covid-19 na população; enquanto a letalidade são as fatalidades por caso positivo – o denominador é diferente, como sabes.
Considerando, em primeiro lugar, a mortalidade até ao dia 14.04 constata-se que em Portugal os 55.2 mortos por milhão de população são inferiores aos de estados soberanos como: São Marino 1072.3; Andorra 399.8; Espanha 383.4; Bélgica 360.7; Itália 349.7; França 256.3; Reino Unido 182.6; Países Baixos 169.4; Suiça 136.7; Luxemburgo 109.1; Suécia 87; Irlanda 82.5 e Estados Unidos da América 78.4.
Ou seja, Portugal está melhor que 12 países europeus – e não apenas 6 como referes – entre os quais países como o Reino Unido; Suécia e Países Baixos que apostaram inicialmente numa abordagem de imunidade de grupo, ao contrário de Portugal.
No que à letalidade se refere – este sim, um indicador associado à preparação política e à qualidade da assistência em saúde – importa realçar-te que em Portugal morrem 3,3% dos infectados havendo 65 países piores que Portugal, dos quais 20 são europeus.
Embora não compreenda a linguagem científica que utilizas quando dizes “estamos logo no segundo pelotão dos mais perigosos”, posso apontar-te que, de acordo com a mesma fonte de dados que utilizas:
a taxa média da letalidade em todos os países considerados (quase mundial) é de 7,9%;
na Europa a taxa média de letalidade é 8,6%
em Portugal a letalidade é muito menor: 3,3%.
A tua terceira conclusão é a mais surpreendente: “até o Brasil parece estar bastante melhor que Portugal com muito menos mortes por milhão de habitantes”. De facto, se se atender aos dados que reportas parece ser verdade, mas por que motivo desconsideras que a taxa de letalidade no Brasil é de 6,3%?! Descartas com ligeireza a análise à subnotificação do número de casos confirmados no Brasil que foi apresentada no dia 11 de abril?!
Acreditarás tu que uma política pública baseada no descontrolo da infecção dará bons resultados clínicos e sociais?!
Um indicador que não referes, mas me parece interessante, é o da média de novas mortes por covid-19 numa semana. Este indicador associa-se ao agravamento da sintomatologia e, mais uma vez, de forma indirecta, dá indícios sobre o funcionamento dos cuidados de saúde.
Mais uma vez se constata que a curva epidemiológica em Portugal se está a comportar “melhor” que a de muitos países Europeus (São Marino; Bélgica; Andorra; Reino Unido; França; Espanha; Itália; Mónaco; Suécia; Países Baixos; Luxemburgo; Suiça e Irlanda) e que a dos Estados Unidos da América.
Morre menos gente por semana em Portugal quando comparado com 13 países Europeus e os EUA.
O sentido crítico que te conheci exigir-te-ia a consideração de outras variáveis que são importantes numa avaliação epidemiológica, nomeadamente: a estrutura demográfica da população; o número de casos em cuidados intensivos; o número de casos cujo teste deu negativo vs positivo; o número de casos recuperados… (tudo normalizado para 1M/pop claro!).
Entristece-me ver-te amargurado, mas estares no “exílio” não justifica nem desculpa comportamentos incendiários. Não sei se a fármaco-epidemiologia de Harvard e de Oxford ensina que incitar à desconfiança institucional e ao pânico social traz qualquer vantagem, mas é possível que a indústria o estime…
Pedro, aceita um conselho amigo: não é assim que chegas a ministro da saúde.
Com estima (esperando que o Pedro que conheci reapareça) despeço-me, camarada.
Teresa Gago
Por opção do autor, este artigo respeita o AO90
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