O combate à corrupção na China deixou de ter como alvos os altos funcionários do sector estatal. Agora, também os executivos do sector privado e altos cargos universitários passam a ser escrutinados pelas autoridades chinesas, caso existam suspeitas de abuso de poder e de dinheiros públicos.
O Nikkei Asian Review menciona um exemplo: o caso de Zhou Chengjian, bilionário e fundador da Shanghai Meterbonwe Fashion & Accessories, que desapareceu do radar público em Janeiro, despoletando uma série de rumores. Pouco depois, a empresa anunciou a suspensão de negócios nos mercados de Shenzhen até que o assunto se resolvesse.
O bilionário reapareceu em meados de Janeiro e a empresa retomou a actividade na bolsa em Fevereiro. Chengjian é apenas um dos casos de empresários de grandes empresas que desaparece durante algum tempo para parte incerta.
Esta vaga de combate à corrupção é liderada pela Comissão Central para a Inspecção Disciplinar, do Partido Comunista chinês, sendo o seu responsável máximo Wang Qishan, um dos mais próximos do presidente do país, Xi Jinping. Até recentemente, revela o jornal, os únicos alvos eram as instituições do Estado, tanto os altos funcionários (apelidados de “tigres”) como os mais baixos (“moscas”), uma vez que as companhias privadas eram consideradas peças-chave no crescimento económico chinês. Agora, essas empresas privadas deixaram de ser “intocáveis”, e um executivo de uma empresa estrangeira a operar no país admitiu que “os riscos de investir numa empresa privada na China aumentaram”.
Mas o chefe de Estado do país vai estender a luta anti-corrupção também ao sistema de ensino: num encontro do PC chinês em Janeiro, Xi Jinping anunciou: “temos de deixar o povo perceber e sentir os resultados dos nossos esforços ao lidar com firmeza com a corrupção nas margens”.
Desde Novembro, mais de uma dezena de altos funcionários de quatro universidades em Pequim foram demitidos ou punidos. Uma das mais prestigiadas universidades do país, a Peking University, vai ser monitorizada pela Comissão a partir da Primavera, para despistar eventuais abusos. Fontes internas das universidades avançaram ao Nikkei Asian Review que existe relutância em aprovar novos projectos de investigação, por temor de que isso chame a atenção das autoridades de vigilância.
Algumas das universidades estão mesmo a considerar devolver ao Estado chinês as dotações orçamentais que receberam. Um professor confessou que “o ambiente que se vive dificulta o estudo e o ensino livres”, enquanto outro admite que “se o ministro da Educação souber que alterámos o currículo ainda que de leve, vamos ter problemas”.
Esta cruzada anti-corrupção pode levar a uma fuga de cérebros para fora da China, o que levaria à ausência da força de trabalho necessária para ajudar ao desenvolvimento económico. Entre 2000 e 2014, estima-se que 1,5 milhões de pessoas tenham saído do país para estudar no estrangeiro, e não regressaram. Uma proporção maior começou a regressar em 2008, quando o governo de Pequim lançou um programa para o regresso dos jovens qualificados, mas a tendência inverteu-se em 2014 quando o governo de Xi Jinping endureceu a luta anti-corrupção. Nesse ano, o fluxo de pessoas que saíram do país aumentou 11%, enquanto que os que regressaram foram apenas 3%.
Anatoly Oleksiyenko, professor associado na Universidade de Hong Kong, disse ao jornal que a responsabilidade da fuga de cérebros chinesa é do governo. Para o docente, Pequim poderia implementar políticas que “estimulassem a abertura, mobilidade e liberdades internas e fazer a China mais atractiva tanto para talentos nacionais como internacionais”.
A decisão governamental chinesa de apertar o controlo na rede de ensino pode levar ao aumento da contestação nos movimentos pró-democracia; mas outro problema é o facto das restrições de liberdade nas investigações poderem estagnar a inovação de que o país necessita para o crescimento económico.
Como consequência da política apertada de Xi Jinping para “iluminar as margens”, cinco membros da Causeway Bay Books, uma editora que publica livros críticos ao sistema chinês, desapareceram em Dezembro. Um deles surgiu em público a confessar que se tinha entregue às autoridades depois de ter sido condenado por conduzir embriagado. Contudo, estas declarações não calaram os rumores de que os cinco membros da editora tinham sido presos.