É tempo de tomar em mãos o movimento ecológico, purga-lo das tendências obscurantistas e milenaristas e sobretudo dos inúmeros demagogos que querem prosperar à sua custa. Depois da chuva de plástico, o que nos espera?
Há cerca de três décadas, o meu caro amigo José Mateus Cavaco Silva – episodicamente editor de um destacável do Expresso – convidou-me a escrever sobre os desafios enfrentados por Portugal no ano 2000, tendo eu na altura escrito que o melhor critério de desempenho do país seria o de ver a quantidade de plásticos e hidrocarbonetos que iriam continuar a juncar as praias do país.
E se é verdade que as marés de nafta e o número de detritos plásticos vindos da navegação costeira poderão ter diminuído, a situação continua longe de ser boa nas praias portuguesas, e muito pior ainda um pouco por todo o lado no mundo como podemos hoje constatar peles redes sociais.
A mim impressionou-me especialmente o Vale do Bekaa e o deserto iraquiano que conheci anos mais tarde, antes de finalmente a humanidade parecer ter acordado, com imagens horríveis de animais mortos cheios de plástico.
Leio agora que nos pontos do planeta que julgávamos mais imunes à poluição industrial, como as Montanhas Rochosas, os Alpes, ou o Ártico, chove plástico. E na verdade, se quando não o metemos borda fora ou o enterramos em lixeiras, queimamos o plástico, o que haveria a esperar?
Do local onde escrevo esta crónica – perto de Hudiksvall, a meio da costa sueca do Báltico – os plásticos e o papel dos resíduos domésticos nem sequer são triados, e isto num país que pretende dar lições de gestão ambiental ao mundo.
A invasão de plástico é um entre muitas outros dos problemas ambientais com que nos confrontamos e que se eternizam e aprofundam por não termos por parte das nossas elites intenção de os resolver.
Temos por um lado a ecologia conservadora que considera que a solução é andar para trás. Pregar a redução do número de seres humanos e a privação universal é meio caminho andado para levar uma parte substancial ou mesmo maioritária da população a reagir contra o ideário tido por ambiental.
Em casos extremos, o movimento torna-se mesmo numa versão contemporânea das seitas milenaristas que vêm no progresso industrial o pecado cuja expiação exige sacrifício.
Depois, temos todos os demagogos que se apresentam como heróis da ecologia para se aproveitar do movimento para os seus fins particulares que pouco ou nada têm a ver com o ambiente, e que frequentemente são contrários ao ambiente.
O mais importante desses passos demagógicos foi o de separar o ‘clima’ (e com isto quer-se dizer o que se pensa ser o impacto indirecto da acção humana na transformação climatérica) do resto da agenda ambiental e social no âmbito da qual ela se situou até à histórica conferência do Rio.
Foi assim possível pensar que seria boa ideia aumentar a probabilidade da maior ameaça ambiental à sobrevivência da humanidade – uma hecatombe nuclear – promovendo a energia nuclear como a solução para o ‘clima’. Depois disso passou-se às mais extravagantes ideias como as de enterrar gases carbónicos em minas ou no fundo do mar e as mais diversas soluções de engenharia climática.
Se calcular a dispersão do plástico na natureza e tomar as medidas necessárias para a evitar é algo relativamente óbvio e simples, o mesmo não acontece com a relação entre as mais diversas actividades humanas a o seu potencial impacto climático, matéria sujeita a mecanismos complexos que não são de forma alguma plenamente conhecidos.
Apesar de o aumento de dióxido de carbono na atmosfera ter sido apontado logo nas primeiras estimativas como sendo potencialmente responsável por metade do efeito de estufa, as Nações Unidas, com o protocolo de Quioto, largamente inspirado em Al Gore, criou um sistema absolutamente aberrante que passou pela redução de todos os gases com efeitos de estufa a equivalentes dióxido de carbono, estimar a produção de todos eles universalmente, atribuir direitos históricos de poluição e criar uma bolsa para transacionar esses direitos.
A ideia peregrina resultou num imenso gasto burocrático a fazer contas impossíveis, um subsídio a muitas indústrias altamente poluidoras e a um Casino de direitos de carbono que nunca teve qualquer efeito útil, que não fosse golpes pouco claros.
Tivemos depois a brilhante ideia de vender a exploração de gás de xisto – fala-se menos no petróleo de xisto, mas normalmente ambos andam associados – com o peregrino argumento de que por unidade de energia fornecida esse gás produzia muito menos dióxido de carbono.
O ex-Presidente Barack Obama tem reclamado a justo título o facto de ter conseguido compatibilizar os acordos de Paris com o aumento exponencial da produção de gás e petróleo. Só não foi claro quanto ao facto de o ter feito à custa da mais pura hipocrisia, que fez esconder os níveis de emissão atmosférica de metano. Contas feitas o ano passado, levam à conclusão de que não há vantagens na utilização do gás de xisto em relação ao carvão, em termos de emissões de gases com efeito de estufa.
Mas quem olhar para as redes sociais vai ver Barack Obama transformado em herói da ‘luta pelo clima’ e não um dos vários protagonistas internacionais responsáveis por utilizar demagogicamente a retórica do clima para agravar os problemas ambientais do planeta (incluindo as de gases com efeito de estufa muito mais danosos que o dióxido de carbono, como o metano) sem dar nenhum dos passos necessários na agenda ambiental.
Passados trinta anos, creio que nos encontramos mais longe de enfrentar os desafios ambientais que temos pela frente.
É tempo de tomar em mãos o movimento ecológico, purga-lo das tendências obscurantistas e milenaristas e sobretudo dos inúmeros demagogos que querem prosperar à sua custa.
Depois da chuva de plástico, o que nos espera?
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