Os custos políticos trazidos pela subida do preço dos combustíveis deveriam constituir um alerta especial para os dirigentes ocidentais.
Primeiro porque, ao contrário do que normalmente se anuncia nos meios de comunicação social, essa alta nos preços não deriva da situação de guerra na Ucrânia, pois desde o surto da COVID-19 (1º trimestre de 2020) que os preços têm vindo a aumentar de forma consistente e, como se pode ver no gráfico seguinte, descontado o pico provocado pela guerra, a cotação actual segue aquela tendência.
A natural insatisfação das populações está a ser instrumentalizada por populistas e detractores das políticas ambientalistas, mas a realidade é que a alta generalizada dos preços pode sinalizar um novo normal que actuais e futuros dirigentes políticos terão que enfrentar, pelo menos enquanto não chegar a muito anunciada queda na procura dos combustíveis derivados do petróleo.
Uma das explicações possíveis para a actual situação prende-se com uma redução da capacidade de refinação norte-americana (desde o início de 2020, a capacidade de produção de combustível nos EUA caiu cerca de 5%, ou seja, mais de um milhão de barris por dia), uma tendência que parece irreversível face à pressão originada nas políticas para contrariar as mudanças climáticas, embora a procura interna por combustíveis continue constante e contra todas as previsões de um futuro repleto de carros eléctricos. Para já o resultado é um abastecimento doméstico de gasolina instável, altamente vulnerável a pânicos de abastecimento que alimenta a inflação e enfurece os eleitores, agravado pela referida redução na capacidade de refinação de uma indústria envelhecida e que implica necessidades de reparação cada vez mais frequentes.
O preço do crude é a principal componente na formação dos preços dos combustíveis, mas a redução da capacidade de refinação pode criar estrangulamentos na produção de combustíveis que agravam os picos de preços, especialmente em conjunturas de alguma redução da oferta. Os preços médios da gasolina normal atingiram um pico de quase 2,2 euros por litro, no princípio de Junho, e embora tenham caído desde então para 1,88 euros por litro (valor desta semana), os preços de revenda caíram mais lentamente do que o custo do petróleo (crude), como o atestam recentes notícias sobre os lucros das gasolineiras.
De um modo geral os governos têm actuado no sentido de tentar limitar as consequências económicas e políticas da alta dos preços, recorrendo a redução das reservas estratégicas ou a reduções fiscais temporárias. É claro que também procuraram capitalizar a recente queda de preços, fenómeno que pode ser temporário, seja pela evolução do conflito ucraniano seja pela flutuação de uma capacidade refinação que se sabe debilitada pelo envelhecimento das estruturas (instalações e maquinaria), pela transferência em curso de novos investimentos para projectos de energia alternativa e pela expectativa de redução na procura, determinada pelo aumento da eficiência dos combustíveis e pela crescente tendência para o aumento do número de veículos eléctricos nas estradas da Europa, dos EUA… e da China.
As pressões combinadas das mudanças climáticas, das políticas governamentais orientadas para a redução das emissões e das previsões para uma mudança para veículos eléctricos traduziram-se em menores incentivos (leia-se perspectivas de lucro) para manter as unidades de refinação a laborar, mas pelo menos no curto prazo, a queda esperada na procura por gasolina ainda não surgiu. Os fabricantes de veículos eléctricos, limitados pelos seus próprios problemas na cadeia de fornecimentos, não conseguiram prouzir veículos suficientes para compensar um grande choque nos mercados ocidentais de combustíveis e agora já se começa a fazer circular a ideia que a concorrência internacional e a queda na capacidade de refinação aconteceram de forma tão abrupta que novas paralisações (temporárias ou não) podem fazer com que os preços subam consideravelmente…
E assim se vai preparando um novo ciclo de subida do preço dos combustíveis – numa clara repetição do fenómeno registado no rescaldo da crise dos combustíveis na década de 1970, quando a OPEP cartelizou os preços do crude e os combustíveis nunca mais regressaram aos níveis das décadas anteriores – e comprovando que o fenómeno da subida dos preços (inflação) continua a ser habilmente manipulado no sentido do aumento dos benefícios do factor capital e do agravamento do desequilíbrio na distribuição da riqueza.