Jihadismo, ópio e expansionismo
Jihadismo
A moderna ideologia jihadista foi desenhada no século XX por ideólogos como Ala Maududi na Índia ou Hassan Al Banna e Sayyid Qutb no Egipto. A generalidade dos observadores viram no entanto essa moderna vaga como a mera continuidade dos tradicionais movimentos conservadores e reacionários em países muçulmanos.
Os poderes estabelecidos – no quadro nacional ou internacional – tendiam a ver os movimentos islâmicos como uma boa alternativa ao nacionalismo, comunismo ou outros movimentos semelhantes. O Reino Unido seguiu essa política no sul da Ásia ou no Médio Oriente e os Estados Unidos continuaram-na.
O Reino Unido viu positivamente a conquista de Meca e da península árabe pelo clã Saud em aliança com o clero extremista, conquista que deu origem à Arábia Saudita na década de 1920. Igualmente, foi o Reino Unido que incentivou a formação de um Estado baseado no Islão a partir da Índia Britânica na década de 1940, um Estado que iria evoluir rapidamente para um ‘Estado Islâmico’. Na mesma linha, os Estados Unidos apoiaram os massacres jihadistas no Bangladesh em 1971 e apoiaram o lançamento da Jihad no Afeganistão após a queda da monarquia em 1973, na época, principalmente através da Arábia Saudita, Irão e Paquistão – os três seus aliados na região.
A queda do Irão nas mãos do clero fanático islâmico, em 1979, a exibição do seu acérrimo desrespeito pela humanidade, o seu ostensivo terrorismo suicida e o seu ódio antiocidental confesso não levaram o Ocidente a pensar duas vezes sobre o acerto das suas políticas em matéria de jihadismo. O Ocidente considerou que os crimes horrendos dos jihadistas no Afeganistão de 1978 em diante eram um pequeno preço a pagar para enfrentar a invasão soviética.
A propagação do Jihadismo na Argélia e no Sudão na década de 1990 e os seus ocasionais prolongamentos no Ocidente através de actos de terrorismo não alterou significativamente a lógica da acção ocidental até o final do século, altura em que, finalmente, alguns ataques terroristas planeados a partir do Afeganistão, obrigaram os EUA a responder.
Entretanto, o conjunto heteróclito de chefes de guerra jihadistas que tinha tomado conta do Afeganistão tinha sido substituído por um bando de jihadistas mais organizado, embora consideravelmente mais fanático, bando mantido, financiado e organizado pelo Paquistão. Isto não alarmou o Ocidente, que viu até favoravelmente o exílio do grupo Bin Laden no país.
Seria de esperar que o ‘onze de Setembro’ fosse o ponto de viragem ocidental sobre a sua falta de compreensão da Jihad, mas não foi isto o que veio a acontecer. Os EUA, pela primeira vez na história, invocando o artigo cinco da Aliança Atlântica, depuseram os talibãs no Afeganistão, mas esse passo foi sucedido por uma guerra injustificada no Iraque contra um ditador secular, que não teve nada a ver com o ‘onze de Setembro’.
Os talibãs foram depostos, mas mantiveram as suas bases no Paquistão de onde continuam a comandar os ataques contra o seu país. Pouco foi feito para combater o jihadismo como ideologia totalitária. O Irão foi autorizado a montar uma máquina imensa na comunicação social, na academia e outras instituições, de propagação do seu credo jihadista. Os chefes de guerra jihadistas foram autorizados a controlar muito do poder do país. As forças aliadas permitiram uma ‘retalibanização’ ideológica, cultural e educacional do país, que em devido tempo corroeu a base necessária à resistência contra o jihadismo.
Ópio
O ópio já existe há muito tempo no Afeganistão, apesar de ser uma produção proibida; mas a transformação do Afeganistão em centro mundial de produção de ópio, com mais de 90% da produção mundial, é um subproduto da jihad – para a qual o ópio jogou um papel financeiro central – e data somente da década de 1980. O Afeganistão também é hoje o produtor número um do mundo de cannabis. A vista grossa do Ocidente à natureza inumana do jihadismo estendeu-se também às devastadoras consequências do nexo afegão do ‘narco-terrorismo’ para o próprio país e para o mundo em geral.
O ópio tornou-se o principal pilar financeiro do terrorismo e corrupção do governo dentro do país. Todas as campanhas de ‘boa governação’ que não considerem a droga como o âmago do problema, não têm hipótese de ser bem-sucedidas.
Em relação ao ópio, temos de ter em consideração que se o Afeganistão é o produtor de matéria-prima, o Irão controla a sua refinação e comercialização. Existindo várias rotas de exportação para o ópio afegão, a maior parte dele é enviado para o Irão, onde é processado e reencaminhado para todo o mundo.
O Irão é também a principal plataforma para a produção e distribuição de drogas sintéticas tais como as metanfetaminas que agora estão a ganhar maior quota no mercado das drogas, ameaçando inclusivamente a quota de mercado dos opiáceos.
Tendo em conta que o Ocidente não conseguiu aproveitar a queda dos talibã para levar a cabo uma política coerente relativamente à droga, agora é incomensuravelmente mais difícil fazê-lo.
Expansionismo
O Afeganistão tem sido visto como puro instrumento de interesses estrangeiros, e isto tem sido a terceira maldição do país. Sendo certo que o Ocidente foi certamente culpado pelo apoio acrítico que deu ao jihadismo com base em puros objetivos geopolíticos, outros continuam a praticar uma política destrutiva, pensada numa perspectiva egoísta e míope.
O Paquistão continua a pensar que apenas um Afeganistão governado por fantoches por si manobrados – como os talibãs – é uma opção aceitável, caso contrário, o melhor é ter o caos instalado como forma de garantir que a linha Durand, dividindo a nação dos Pashtun e fortemente contestada pelo Afeganistão, não seja seriamente desafiada.
A Política iraniana para o Afeganistão não é substancialmente diferente daquela que está a desenvolver no Iraque ou na Síria, e caracteriza-se pela propagação dos valores da Jihad, alimentando a sua própria milícia afiliada e patrocinando uma infinidade de actores estatais e não-estatais, com o objectivo estratégico de assegurar que o Afeganistão não se tornará num estado funcional.
A China era o mais promissor parceiro estratégico para o Afeganistão, mas infelizmente essas expectativas não se concretizaram. A política de segurança da China para o Afeganistão: pode ser descrita como a da ‘instabilidade controlada’; ou seja, uma solução mínima que proteja os interesses imediatos chineses. A China está agora abertamente apoiando diplomaticamente os talibã e oferecendo um mercado para as suas operações de mineração ilegal. Aparentemente, a prioridade da China é a de acomodar a política externa do Paquistão com desprezo pelos interesses do Afeganistão.
A Rússia com a China e o Paquistão delinearam uma estratégia comum de segurança para o Afeganistão, onde os talibãs desempenham um papel decisivo. Aparentemente, a Rússia e a China acham que eles podem fazer com o jihadismo no Afeganistão o mesmo que o Ocidente fez no passado, agora com os papéis invertidos; o alvo a abater sendo a presença ocidental no país.
Quadratura do triângulo
Contra esta armadilha mortal, tem havido um raio de esperança, feita pela cooperação Indiana, a mais eficaz no país e a que mais consistentemente tem tentado defender os seus interesses nacionais, reforçando as capacidades de estado do Afeganistão, em vez do contrário.
Os Estados Unidos e a Europa devem ter como prioridade trabalhar com a Índia para construir uma alternativa positiva ao ‘triângulo da maldição’ do Afeganistão. Um dos aspectos mais importantes da construção desta alternativa, será a posição do triângulo Centro-Asiático vizinho; Tajiquistão, Uzbequistão e Turquemenistão. Os três são naturalmente influenciadas pelo eixo russo-chinês, mas eles não podem ignorar os seus próprios interesses, dado que eles serão os primeiros a sofrer as consequências de uma política mal elaborada que alimente a conexão ‘Narco-Jihadista’ do Afeganistão.
O triângulo EU-EU-Índia deveria assim pensar no acoplamento do triângulo Centro-Asiático vizinho para a constituição de um quadrado que afaste a tripla maldição do Afeganistão.