Representantes de 195 países, aprovaram em Paris um acordo global sem precedentes para combater as alterações climáticas, que em 2020 vai substituir o Protocolo de Quioto. Aclamado como acordo histórico pelo secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, e pelo presidente francês, François Hollande, o texto do acordo final está longe de ser o passo revolucionário anunciado.
O verdadeiro teste para o acordo de Paris começa na Primavera de 2016, quando o processo de ratificação pelos parlamentos nacionais terá início.
Os países participantes na 21ª Conferência do Clima da ONU (COP21), conseguiram aprovar, no Sábado, um acordo-quadro para limitar o aquecimento global, concordando em coordenar esforços para conter a subida da temperatura do planeta a 1,5ºC. A cerimónia de assinatura do acordo terá lugar no dia 22 de Abril, na sede da ONU em Nova Iorque.
Depois de anos de negociações e hesitações, seis anos depois do fiasco da cimeira da Copenhaga, foi conseguido um documento universal que permitiu ultrapassar divergências, mas o acordo é criticado por falta de ambição, face à grave situação climática.
A organização Avaaz – Le Monde en Action, organizadora da Marcha para o Clima que afinal não foi autorizada pelas autoridades francesas, chama ao acordo um ponto de viragem na história do combate das ONGS a favor de soluções para a crise climática.
O texto deve ajudar a reorientar a economia global para um modelo de baixo carbono, mas não prevê o abandono dos combustíveis fósseis nem o limite das emissões de CO2. Todos os países devem adoptar planos nacionais de redução das emissões de gases de efeito de estufa e de adaptação às alterações climáticas. A primeira avaliação global terá lugar em 2023.
Nas 31 páginas do texto final algumas das obrigações definidas são redigidas de forma a deixar desconfiados os ambientalistas que seguem de perto este processo. “Antes de deitar foguetes, esperemos para ver como os estados vão aplicar este texto a nível nacional”, tempera Tim Gore, responsável da Oxfam International, uma confederação de 13 organizações que em vários países do mundo desenvolvem acções de combate à pobreza e em prol do desenvolvimento sustentável.
O preâmbulo do acordo sublinha, pela primeira vez na história das Conferências das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, o objectivo de longo prazo de “limitar o aumento da temperatura a 1,5ºC”, apesar de o primeiro objectivo ser permanecer nos 2ºC, mas Mohamed Adow, da ONG Christian Aid, ressalva que “o resto do texto não está conforme à meta de um aumento máximo de 1,5ºC”, fazendo notar que não foram apontados compromissos a curto prazo que permitam alcançar tal objectivo. Para mais, o documento não faz referências à descarbonização evocada antes da cimeira de Paris pela ministra federal do Meio Ambiente, Barbara Hendricks, ou ao desenvolvimento de energias renováveis.
A ONG Action Aid adverte entretanto que o quadro financeiro traçado em Paris não é suficientemente claro. Para Brandon Wu, assessor da organização, “aqueles que clamam sucesso deveriam prestar mais atenção aos detalhes relativos à questão financeira”, pois o texto final é “pior, no que diz respeito a este aspecto, que o projecto anterior”. O texto de Paris limita-se a prever um possível aumento dos valores destinados aos países pobres, tornando os 100 mil milhões previstos em 2009, um simples patamar que os países ricos podem elevar, sem ser a isso obrigados.
Uma secção inteira do documento é dedicada às obrigações dos países desenvolvidos no que toca à assistência a prestar aos países mais afectados pela mudança climática no sentido de os ajudar a enfrentar o problema. O acordo sublinha que uma parte dos fundos verdes (100 mil milhões de dólares por ano a partir de 2020) devem ser dedicados a esta questão, mas a formulação escolhida decepciona. Os países mais pobres queriam que metade deste dinheiro fosse aplicado aos esforços de adaptação e a outra metade às medidas de redução de emissões. Os países desenvolvidos conseguiram porém que no texto final não tenha sido escrito nenhum objectivo com um valor preciso, o que provocou críticas de várias ONGs.
O documento final refere-se no preâmbulo a “obrigações em termos de protecção dos direitos do homem”, que não eram mencionados no acordo anterior. Teresa Anderson, da Action Aid, reconhece que esta referência cria “uma certa base jurídica” para defender os direitos das vítimas de abusos em conflitos de carácter ambiental, como nos casos de desflorestação ilegal, mas lamenta que os direitos humanos tenham sido confinados ao preâmbulo, lembrando que “Se esta referência figurasse no próprio acordo, haveria uma obrigação legal mais forte”.
As promessas de redução de emissões assumidos pelas partes que discutiram o acordo antes do início da cimeira não são suficientes para garantir a permanência abaixo da fasquia de um aumento de 2°C da temperatura em 2100. Foi por isso necessário introduzir um sistema de revisão periódica dos compromissos a cada cinco anos. Um mecanismo positivo que alguns países queriam evitar, como as potências petrolíferas, mas a primeira revisão obrigatória dos compromissos não tem que ser feita antes de 2024, uma data que algumas ONGs e os países pobres consideram ser tarde demais.
Esta é a primeira vez que um acordo climático inclui um parágrafo inteiro sobre o reconhecimento das perdas e danos, o que equivale a reconhecer que a poluição emitida pelos países desenvolvidos teve impactos negativos irreversíveis sobre outros países. Um reconhecimento que Gerry Arrances, coordenador do Movimento Filipino pela Justiça Climática, considera vazio de consequências, pois o artigo que aborda esta questão exclui a possibilidade de responsabilizar um Estado poluidor e de exigir uma indemnização, resultado da oposição dos Estados Unidos a esta eventualidade legal.