Embora ainda não disponhamos de números finais para o ano de 2020, as previsões apontam para uma quebra no PIB que, segundo o Banco de Portugal será de 8,1% e de 10% segundo o FMI.
Embora ainda não disponhamos de números finais para o ano de 2020, as previsões apontam para uma quebra no PIB que, segundo o Banco de Portugal será de 8,1% e de 10% segundo o FMI; estes valores, mesmo que provisórios, deviam ser especialmente ponderados no momento em que, em resposta à subida do número de infecções e quando se registam mais de três centenas de surtos activos, a média diária de óbitos ultrapassa a centena e a de infectados chega a ultrapassar os dez mil, se decide o recurso a um segundo período de confinamento.
Os números referidos e a ideia que os hospitais já registam uma elevada pressão terão estado na génese da intenção do regresso à solução do confinamento depois de há cerca de um mês – e quando era bem visível que esta segunda vaga associada às condições climáticas mais adversas apresentava um número de internamentos hospitalares muito superior ao registado na primeira vaga – se ter decidido suavizar as medidas de contenção durante a quadra natalícia e só agora, dois meses depois, se começar a ponderar a hipótese de requisição civil dos hospitais privados.
Claro que resumir este quadro de agravamento àquela decisão seria manifesta má fé, mas se a ela acrescentarmos três factores doutra natureza– o desgaste provocado pelo distanciamento social e o isolamento, o natural cansaço de quase nove meses das notícias diárias sobre a covid-19 e o anúncio da chegada das tão desejadas vacinas – poderemos ter assistido à conjugação das condições para uma tempestade perfeita.
Nos dias que antecederam o já antecipado anúncio de um novo confinamento, várias foram as vozes que tentaram fazer-se ouvir em apelos – que foram desde um não ouçam demagogos, ouçam os especialistas, a alertas deixados por especialistas, como o epidemiologista Henrique Barros, para quem “o confinamento resolve o problema” mas “cria toda uma série de outros problemas”, ou a infecciologista Margarida Tavares, que assegura que “estamos a combater a pandemia com isolamentos e quarentenas, que são respostas de outros séculos, devíamos procurar soluções do nosso tempo” – que os políticos nacionais optaram por ignorar em benefício do velho modelo de “gestão condicionada pelo voto”; o mesmo foi feito quando em finais de Novembro surgiram as primeiras notícias de que a «DGS deixa os mais velhos no fim das prioridades para a vacina da covid-19», contrariada no mesmo dia pelo primeiro-ministro António Costa que rejeitou colocar idosos fora do acesso prioritário às vacinas e reforçado ainda por afirmações, como a do agora comentador televisivo Paulo Portas que não hesitou em proclamar que «É inacreditável que se possa ter dito que os mais velhos ficam de fora», quando uma análise fria da realidade recomendaria que o programa de vacinação respeitasse a prioridade dos trabalhadores da área da saúde (incluindo bombeiros, protecção civil e trabalhadores dos lares), da segurança (forças da ordem), seguindo-se os cidadãos em idade activa – para procurar minimizar os efeitos sobre a actividade económica – e por fim os restantes, aqueles que podem controlar e reduzir contactos e deslocações com menores custos.
Ora olhando a realidade económica que resultou da paragem forçada em Março/Abril de 2020, da qual se disse na comunicação social que:
- as vendas do comércio a retalho caíram 21,6% em Abril, face ao mesmo mês de 2019, tendo-se registado uma redução de 46% nos pagamentos com cartão bancário face ao valor que seria previsto numa situação de normalidade, numa média de menos 56 milhões de euros por dia.
- relativamente ao sector do turismo o INE divulgou que os hóspedes em alojamento turístico terão recuado 97,1% e as dormidas terão diminuído 96,7% em Abril face ao mês homólogo do ano passado, numa “interrupção quase total da actividade” do sector devido à pandemia, enquanto o Banco de Portugal anunciou que em Abril a restauração perdeu 354,4 milhões de euros face ao valor transaccionado com cartão no mesmo mês do ano passado.
- na produção e comercialização de automóveis, a ACAP – Associação Automóvel de Portugal apontou para uma quebra na produção de 46,1% em Março e de 95,7% em Abril, também face aos mesmos meses de 2019, e uma queda de 57% dos veículos matriculados face ao mesmo mês do ano passado.
- no sector dos transportes o cenário não foi diferente, com a NAV Portugal, entidade gestora do espaço aéreo, a anunciar que geriu menos 24,3 mil voos em Março, uma quebra de 36% face ao mês homólogo, valor que diminuiu para 4.018 voos em Abril, correspondendo a uma quebra de 94% face ao mesmo mês do ano passado. Já no transporte ferroviário (CP) registou-se uma queda na procura de cerca de 90%.
Com o próprio primeiro-ministro a dizer que a crise já fez perder 15 mil milhões e que Eugénio Rosa sintetizou, muito melhor que eu alguma vez o faria, no seu «Retrato de um país a caminho do abismo», onde destaca que “baixos salários, riqueza criada insuficiente e a cair, um estado cada vez mais endividado” são “o retrato de um país a caminho do abismo que é necessário também não esquecer nas decisões políticas”, assim contribuindo para formar a ideia que o que todos mais precisamos na actual conjuntura é de decisores políticos que ponderem a informação técnica das mais variadas áreas (com destaque para a saúde, a segurança e a economia) e que depois não decidam apenas em função das sondagens e de meros interesses eleitorais.
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