O COVID é um vírus múltiplo – em termos de saúde é um vírus que afeta os sistemas respiratórios das pessoas, mas ele é também um vírus político. É, principalmente, um vírus político! Os detentores do poder perceberam desde o início o potencial político do vírus enquanto instrumento de manipulação política. Não há inocentes nem gente de boa vontade atrás dos ecrãs das televisões!
O vírus é hoje a matéria-prima da manipulação política. Os doentes são simultaneamente as munições e a carne para canhão. É de uma guerra de manipulação que se trata quando surgem “peças” jornalísticas sobre a pandemia. Os números que nos despejam sobre infetados, testados, internados, ligados aos ventiladores, acamados, domicializados, curados, mortos e ressuscitados são idênticos aos das descrições da invasão do Iraque pelos “jornalistas” embed, introduzidos nas unidades americanas, para manipularem a realidade, ou do ministro da propaganda de Saddam. Somos submersos por nuvens de números, deliberadamente. Numa guerra a primeira vítima é a verdade. Paulo Portas comprova.
O vírus COVID 19 é um pretexto para fazer política, política dura, no coração da ideologia.
Ouvir o Paulo Portas na TVI, num programa a que os manipuladores (especialistas em condicionamento da opinião) deram o título dramático de «Estado da Emergência» é aceder a uma lição à distância retirada de um manual de alta vigarice e ministrada por um catedrático. Portas é um manipulador de alto bordo. Chapeau ao Paulo Portas e a quem o contratou, ou a quem conseguiu que ele fosse contratado. Presumo que tenha sido avençado através da organização do “alma negra” do Steve Bannon, porque tenho visto várias réplicas de Paulo Portas (embora nenhuma tão talentosa) até com quadros idênticos, no zapping que faço pelas TV estrangeiras.
Qual é o problema que uma pandemia coloca em termos políticos? A capacidade de um dado Estado, dos seus políticos, dos seus serviços responderem aos efeitos da pandemia, mortos, destruição de bens, de empresas, de modos de vida, de vidas em termos individuais, de laços de família, de economias, de prioridades políticas e sociais. Uma pandemia coloca em causa a ideologia de uma sociedade e de um Estado.
O que fazem Paulo Portas e os manipuladores da sua estirpe? Numa primeira fase deslocam o foco da análise da organização da sociedade para o descritivismo da situação e, numa segunda, a que agora começa, criam culpados exteriores, a velha figura do bode expiatório. O objetivo é manter o essencial das posições anteriores, as relações de dependência, o statu quo!
A ideologia dominante imposta pela potência dominante desde a parelha Reagan-Tatcher é a do neoliberalismo, do Estado mínimo para os cidadãos e máximo para os grandes empresários que vivem à custa do Estado. A ideologia dominante, dita liberal, é que tudo, mas tudo, da saúde à terra de cultivo, da paisagem à poesia, do ar à água, da ciência à paz, da morte às almas penadas, tudo é mercado, tudo é privado, tudo é negócio, tudo é mercadoria. A saúde, a doença, a velhice, a habitação, o ensino, a vida, os sentimentos, estão no mercado.
Ora, uma pandemia coloca em causa o mercado. O vírus faz o trabalho descrito no Novo Testamento da Bíblia do episódio de Cristo a expulsar os vendilhões do templo. O vírus é o azorre de Cristo jovem a zurzir os tendeiros, a virar mesas de cambistas e especuladores. Paulo Portas desempenha o papel do sacerdote da velha ordem que nos vem dizer diariamente que sem vendilhões não há templo e que os compradores gritam vivas e Hossanas aos descendentes do rei David que lhe trocam moedas gregas por romanas!
Paulo Portas é o deputado dos vendilhões para classes superiores (outros e outras dedicam-se às classe baixas), garante-lhes que pagando o dízimo e a dívida o vírus vai bater à porta dos infiéis. Mas ele é, e convém recordar, o vidente, juntamente com Durão Barroso, que viu as armas de destruição em massa de Saddam Hussein, que justificaram a invasão do Iraque. Ele é o amigo de Donald Rumsfeld, o ministro dos negócios estrangeiros do regime de Bush filho e de de Dick Cheney o Vice Presidente (vejam o filme Vice), dois dos maiores escroques mundiais, os longa manus, como os romanos referiam os homens de mão, os assassinos que cometiam crimes a soldo, neste caso a soldo dos grandes interesses do complexo militar industrial e dos comerciantes de petróleo americanos. Portas é um lobista, um mestre lobista, desses interesses em Portugal. Tudo o que diz nos ecrãs deve ser lido a esta luz: ele está a vender uma mensagem. Está no templo da manipulação a vender armas de destruição em massa como em 2003 ao serviço de Bush e de Blair.
Que areia nos atira Portas aos olhos? Números de infetados e, desde há dias, a narrativa americana da origem do vírus e dos culpados pela epidemia, exatamente pela mesma sequência de Trump: o vírus é chinês (origem do mal), os chineses donos do vírus atrasaram a comunicação da amplitude da pandemia (o inimigo é mau e insidioso) e a incapacidade da OMS de lidar coma situação (o bode expiatório). O fascinante das suas pregações evangélicas na TVI – de que sou atento espetador – é a capacidade de convencimento que ele consegue, sendo muito mais eficaz, em termos de difusão e mortalidade, do que o COVID 19.
As predicas de Paulo Portas sobre a pandemia assentam na falácia de que o problema de uma guerra é o inimigo. Na realidade o problema da guerra são as nossas tropas. São estas que têm de vencer a guerra. Um velho cabo de forcados – Manuel Faia, dos profissionais de Vila Nova da Barquinha, a terra onde nasci e de que tanto gosto – afirmava que os toiros se pegam como saem dos curros. O general Patton, herói americano da Segunda Guerra Mundial, afirmava não querer que os seus soldados morressem pela sua Pátria, mas que fizessem o inimigo morrer pela Pátria deles. Paulo Portas, como Donald Trump, entende que a América estava bem – por isso não se preparou para a guerra -, os inimigos é que são maus, very bad! Paulo Portas foi ministro da Defesa de Portugal!
Não é estúpido, nem ignorante, é apenas um eficaz e despudorado manipulador. Estúpidos são os que acreditam que ele lhes fala da epidemia de modo sério e para ajudar a ultrapassá-la. Ele está na TVI a aproveitá-la e a controlar os danos na imagem dos EUA enquanto potência imperial e das teorias do Estado mínimo! A pandemia do coronavírus revelou que o Estado mínimo, neoliberal, que substituiu o welfare state, não responde às necessidades de segurança e bem-estar dos seus cidadãos. É um Estado de oligarcas, corrupto, desigual, ineficiente, exceto para desenvolver negócios com saúde e armamento. Logo, há que vender a tese da maldade do inimigo (é da natureza do inimigo ser mau, ou não?) e do bode expiatório. É o que Paulo Portas, de fatinho e gráficos em Power Point faz e bem!
Jamais Paulo Portas referiu as fragilidades (morbilidades, para usar um termo da época) dos sistemas de saúde e segurança social americano para a maioria da população, os 40 milhões sem seguro de saúde e a trabalhar ao negro. Em termos de apoio social à maioria da população, os EUA estão ao nível de muitos países do Terceiro Mundo! Jamais Paulo Portas referiu a percentagem de afroamericanos mortos e infetados (nem de hispânicos), nem de sem abrigo enterrados em valas comuns! Mas todos vimos os seus magníficos gráficos (elaborados e fornecidos por quem, sendo do domínio público que Portas é um analfabeto informático?) sobre as datas de entrada em vigor de medidas de contenção, de confinamento, de resposta.
Através de Portas sabemos tudo sobre a pandemia, exceto a razão pela qual aqueles que ele defende diariamente (os que também estão em Estado de Emergência em Washington, ou Londres) não construíram uma sociedade minimamente eficaz (já não falamos em justiça) que tenha aplicado parte da sua imensa riqueza na defesa da saúde e do apoio social aos seus cidadãos, mas que construiu e paga a mais evoluída panóplia de armas do planeta e está em guerra em metade do mundo!
O Portas é um ilusionista e nós somos o seu iludido e anestesiado público!
Por opção do autor, este artigo respeita o AO90
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