Crianças,montes delas. As nossas, as únicas e as melhores, tenham seis anos ou 50, sempre meninos e meninas a amar eternamente.
Malditos ingleses que deixam os putos à solta. Uma vez até o primeiro-ministro perdeu a filha, deixou-a no restaurante.
No que toca a cuidar de miúdos, não há quem bata os latinos. Olho neles, palmada pronta a sacudir o pó. Esta é a maioria.
Temos razão. Entre o misto pedófilo dos gregos e o descuidado da roda de outrora, os portugueses serão daqueles que mais amam os seus filhos. Tirando as excepções, somos mesmo bons nisto. Amamos e cuidamos, tirando aquilo de os deixar horas em frente à consola e ao tablet.
Outros tempos houve de um Portugal que agora emigrou todo para o Bangladesh, onde perto de cinco milhões de crianças entre os cinco e os 14 anos costuram a nossa roupita: a da GAP, da Zara, da Nike, da Desigual, de tudo o que é carito e popular – essa que se calhar trazes vestida, enfim. Um festival.
Mas isso cá já passou. Agora aponta-se aos maus: Argentina, Azerbaijão, Brasil, Burkina Faso, China, Egito, Índia, Cazaquistão, República do Quirguizistão, Mali, Paquistão, Paraguai, Turquia, Tadjiquistão, Turquemenistão, Uzbequistão e Zâmbia. Ou ainda Camboja, China, Índia e Nepal Bangladesh, Jordânia, Malásia, Vietname e Tailândia.
Tá fixe? Vamos a coisas doces, então.
O chocolate tem imensa mão de obra infantil escrava. Só na Costa do Marfim o cacau é retirado por uma esmagadora maioria de crianças que são vendidas pelos pais aos traficantes e, depois, o cacau que colhem acaba nas nossas prateleiras, a derreter-se na boca e com o sangue dos putos a derreter-se também, mas nas mãos. Deles, que somos gente boa.
O mar, pode ser? Colónias de férias? Barquinhos?
Há 10 milhões de crianças registadas pela ONU como refugiados de guerra, só nos últimos anos. Toda a população nacional, assim para dar uma ideia, tem menos de 14 anos e está fugida à guerra, sem pai nem mãe. Vieram pelo mar e, em média, diz a ONU, DUAS CRIANÇAS afogam-se por dia no mar Mediterrâneo, a quem passámos a chamar Mare Vostrum, decerto, que lá ficam os cadáveres dos putos enquanto aqui na cidade nos preocupamos em criar “nãos” aos refugiados. Essa gentalha que vem pôr bombas nos colégios privados.
Já chega, portanto, de desgraças. Só dizer que desapareceram 10 mil crianças no último ano que se estima estejam a ser exploradas em trabalho escravo na Europa. Coisa pouca, uma vez que na Europa se estima existirem um milhão e duzentos mil escravos, muitos deles (delas) dedicadas à indústria do sexo e do “rapto de noivas”. Em Portugal, diz-se, há 12 800 escravos.
Mas comemoremos o dia mundial da criança dando vivas e oferecendo até um relógio, um telemóvel, um colar ou uma pulseira aos nossos.
Pode bem ser que dentro dessa prenda esteja o ouro, a prata, a saúde e a vida de um menino de nove anos, forçado às minas na República Centro-Africana, em Angola, noutros filões, onde aos 11 vais para debaixo de terra com picaretas e pneumáticos sacar o vil metal.
Se há dias uma guia das minas do Lousal, Grândola, afirmava que a mina foi fechada porque “não era viável” devia ser porque não havia alentejanos de oito e nove anos que quisessem mergulhar nas águas fortes do lucro belga.
Enfim, beijem os putos, amor e carinho, palhaçada e estímulo. Nós, como geração, ainda não fomos capazes de acabar com a maior vergonha civilizacional que nos resta: explorar as nossas crias para garantir o nosso futuro.
E tentem comprar roupa na feira, certificando-se que vem das fábricas do Norte onde já só trabalham velhas e boas tecedeiras. Raios parta se continuam a alimentar o ego com roupinhas fashion de mãos infantis. É que o sangue invisível fica lá.
Viva a criança, viva a infância e a juventude, vivam os amores de verão!