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Sábado, Novembro 2, 2024

Crise económica ignorada pelo Governo

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

Uma crise económica, com consequências sociais, que o Governo ainda não compreendeu ou que tenta disfarçar, mas que pode ter efeitos ainda mais devastadores face ao comportamento Governamental: o governo reduziu o investimento público do Estado no Orçamento Suplementar e 9.828 milhões € de Fundos Comunitários ficaram por utilizar


Estudo

Uma crise económica, com consequências sociais, que o Governo ainda não compreendeu ou que tenta disfarçar, mas que pode ter efeitos ainda mais devastadores face ao comportamento Governamental: o governo reduziu o investimento público do Estado no Orçamento Suplementar e 9.828 milhões € de Fundos Comunitários ficaram por utilizar

Como já tínhamos mostrado em estudo anterior (26-2020), o Orçamento Suplementar para 2020 que foi aprovado na Assembleia da República, embora o governo diga que é resposta adequada à grave crise económica e social em que o país está mergulhado, como consequência da crise de saúde publica causada pelo “coronavírus”, a verdade é outra como vamos mostrar neste estudo. Nele iremos analisar  principalmente a insuficiência do investimento público que está a ter consequências graves no investimento total no país, e que vai ter efeitos dramáticos no aumento do desemprego e no alastrar da miséria.

 

O investimento do estado diminuiu no Orçamento de Estado Suplementar de 2020 quando comparado com o do Orçamento de Estado inicial de 2020

Para mostrar a forma como o atual governo está a encarar a grave crise económica que certamente irá ter consequências dramáticas para os portugueses, em termos de desemprego e quebra de rendimentos, observem-se os valores de investimento publico (Formação Bruta de Capital Fixo) previstos no Orçamento de Estado inicial de 2020, portanto elaborado antes da crise do “coronavírus”, e no Orçamento de Estado Suplementar para 2020 que foi aprovado na Assembleia da República, e que o governo diz que é resposta adequada para responder à crise causada pelo “COVID 19”.

 

Quadro 1 – Investimento Público previsto antes da crise do “coronavírus” (OE-2020 inicial) e Investimento Público previsto após a crise “COVID 19 (OE-2020 Suplementar)

Para que o leitor não tenha dúvidas da veracidade dos dados, pois eles causam espanto, indicamos os números das paginas do Relatório do Orçamento Inicial (pág. 289) e do Relatório do Orçamento de Estado Suplementar (pág. 16) para o leitor poder confirmar os dados pois é difícil de acreditar na falta de sensibilidade, por parte do atual governo, à crise que os portugueses enfrentam. E utilizamos dados da Contabilidade Nacional, e não da Contabilidade Pública, pois são eles que dão o verdadeiro investimento previsto a realizar em cada ano. O INE utiliza também os dados da Contabilidade Nacional para calcular o défice orçamental verdadeiro.

Os dados do quadro 1 mostram que o investimento público previsto pelo Estado (Administração Central), no lugar de aumentar entre o Orçamento de Estado Inicial e o Orçamento de Estado Suplementar de 2020, para responder à grave crise económica e social causada pelo “Coronavirus , até diminui em 45 milhões €, e o investimento de todas as Administrações Públicas só aumenta em 35 milhões €, um valor ridículo face à gravidade da crise, apenas porque o investimento público feito pelos governos regionais da Madeira e Açores e pelas Autarquias aumenta em 85 milhões €.

A gravidade deste comportamento por parte do atual governo ainda ganha maior dimensão se se tiver presente que, no período 2016/2019, o investimento público efetivamente realizado nem foi suficiente para o compensar o chamado “Consumo de capital fixo” público, ou seja, para compensar os equipamentos que se degradaram ou deixaram de se utilizar devido ao uso e a obsolescência. Segundo o INE, nos últimos 4 anos de governo PS (2016/2019), o investimento público realizado  somou apenas 14.072 milhões € (em média 4.440 M€/ano), enquanto o “Consumo de capital fixo” público atingiu 21.564 milhões € (em média 5.391 M€/ano), portanto o destruído pelo uso e pela idade foi superior ao novo investimento publico em 7.493 milhões €. E como experiência tem mostrado apenas uma parcela do investimento público previstos no Orçamento do Estado (em 2020 apenas 4.915 M€, que é um valor inferior ao previsto em anos anteriores) acaba por ser realizado devido a cativações e atrasos.

 

A taxa de utilização dos fundos comunitários do Portugal 2020 no fim do 1.º trimestre de 2020 era apenas de 48,6% do total, tendo ficado por utilizar 9.828 milhões € até 1.º Trim. 2020

O insuficiente investimento público está também associado a uma baixa utilização dos fundos comunitários, ou seja, dos fundos disponibilizados pela U.E. a Portugal para ser utilizado pelas empresas e pela Administração Pública. A baixa taxa de execução dos chamados “Programas Operacionais” é mais uma prova da incapacidade para executar/utilizar atempadamente esses fundos, o que acarreta elevados custos ao país. O “Portugal 2020” estava programado para ser executado no período 2014/2020, mas a execução, ou seja, a utilização dos fundos comunitários até ao fim do 1.º Trim. 2020 é a que consta do quadro 2 (ADC).

 

Quadro 2 – Nível de execução/utilização dos Fundos comunitários do Portugal 2020

Para os 14 Programas Operacionais constantes do Quadro 2, a União Europeia disponibilizou fundos comunitários a Portugal para utilizar, no período 2014/2020, no montante de 24.793 milhões €, segundo a Agência para o Desenvolvimento e Coesão (ADC, IP). No entanto, Portugal até ao 1.º Trim. 2020 apenas tinha utilizado 12.054 milhões €, ou seja, 48,6% daquele total. E estamos no último ano do “Portugal 2020”.

Se a análise for feita não para o período 2004-2020, período total deste quadro comunitário, mas sim para o período já decorrido (Jan. 2014 a Março de 2020), conclui-se que estava programado para serem utilizados 21.882 milhões € mas foram executados (despesa validada) somente 12.054 milhões €, ficando por utilizar do programado para este período, 9.828 milhões € de fundos comunitários, o que corresponde a 44,9% do previsto para este período que não foi aproveitado pelas empresas privadas e pelas Administrações Públicas portuguesas. E se se fizer uma análise mais fina – por Programas Operacionais – conclui-se que Programas fundamentais para a modernização e o desenvolvimento do país, como são o Programas de Competitividade e Internacionalização (POCI), “Capital Humano” (POCH),  “Sustentabilidade de Recursos” (POSER) e os Programas Regionais do Norte (PORN) e  Centro (ORC), só nestes 5 programas ficaram por utilizar, até ao 1.º trim. 2020, Fundos Comunitários no montante de 6.842 milhões€. O grau de ineficiência das empresas e do Estado que não tiveram capacidade para utilizar atempadamente os fundos comunitários disponibilizados pela União Europeia é assustador e preocupante. E isto num país com um aparelho produtivo e com equipamentos públicos, na sua esmagadora maioria, degradados ou desatualizados, e com um baixo desenvolvimento que carece de investimento.

 

Um país cuja economia e sociedade foram e estão profundamente desorganizadas devido à crise causada pelo Coronavírus, com baixa produtividade (antes da crise o PIB por habitante era cerca de 66% da média da U.E.) que caiu ainda mais devido ao Lay-off, ao teletrabalho e ao desemprego em que o Governo reduz o investimento público feito pelo Estado

Segundo o Ministério do Trabalho, até 1 de julho de 2020, as empresas entregaram documentos para colocar em “lay-off” 1.359.622 trabalhadores, cujas remunerações mensais somavam 1.378,5 milhões € com uma remuneração média de 1.014€ por mês. A estes há que acrescentar o desemprego real, ou para utilizar a linguagem obscura e pouco clara do INE a “Subutilização do trabalho” que, no fim do 1º Trimestre de 2020, segundo este Instituto público, atingia 694.700 trabalhadores (desemprego oficial: 348.100; Subemprego  forçado a tempo parcial: 159.000; Inativos disponíveis e indisponíveis, que são também desempregados reais,: 187.600). A todos estes há ainda a adicionar milhares de trabalhadores em teletrabalho, cujo numero se desconhece porque não há estatísticas (nas Administrações Públicas são muitas dezenas de milhares) cuja produtividade, da esmagadora maioria, diminuiu significativamente.

E isto porque, contrariamente ao que tem sido difundido, excetuando certas profissões que trabalham com base em projetos, com metas claras e com sistemas de avaliação organizados, ou então com metas quantificadas, diárias ou mensais, que é possível avaliar, o teletrabalho na forma como está ser introduzido em Portugal está a conduzir à desorganização do sistema de trabalho, como instrumento de dignificação do trabalhador, e de progresso do país, e da vida familiar do trabalhador; à fragilização da organização dos trabalhadores e de cada trabalhador perante a entidade patronal; à eliminação da separação entre vida profissional e vida privada/familiar do trabalhador; a intromissão do patrão na privacidade do trabalhador; à destruição de direitos fundamentais (horários trabalho, descanso, etc,.), à sobre exploração e também a uma quebra acentuada da produtividade. É a este país em crise, altamente desorganizado, com medo que impede a reativação da economia, que o governo reduz ainda o investimento publico do Estado à espera do milagre dos milhões de “Bruxelas” que quando chegarem, se chegarem, levarão anos para utilizar como acontece no “Portugal 2020”.



 

 


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