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Na sua meditação sobre o género wuxia (artes marciais), o cineasta de Taiwan Hou Hsiao-Hsien serve-se das suas habituais longas sequências e planos fixos, em vez dos movimentos acrobáticos que popularizaram o género com alguns filmes de enorme sucesso de público. Essa poderá ser para muitos uma surpresa, embora menos para quem Hou não é um cineasta desconhecido. E a verdade é que raros têm sido os seus filmes que não foram premiados num festival internacional.
Em Cannes, onde a ‘A Assassina’ foi exibido pela primeira vez, foi recebido com aplauso por uns, bem como interrogações de outros, apesar de arrecadar o prémio de realização, afinal de contas, o maior galardão que poderia obter, dada o seu irrepreensível papel.
Ora essa será mesmo uma marca que acaba por ganhar espessura em ‘A Assassina’, um filme de género, mas sem rendição às modas. E onde acabamos por ter o melhor de dois mundos, ou seja, todo o contorno sublime do rigor histórico, ainda que observado de um ponto de vista realista e não fantasioso. Onde a dimensão poética acaba por combinar bem com uma acção que se adequa à sua mise em scène.
Aqui se segue a narrativa hipnótica e belíssica da hitwoman (Qi Shu) após a missão falhada de abater um governador. Sem a preocupação de agradar a feudos ou clãs, Hou envolve-nos num manto de fascinante linguagem visual, ainda que muito fiquem despistados à procura da estrutura habitual da narração.
Hou pede-nos que procuremos essa razão também por aquilo que nos mostra. Aqui captado por uma imensa e rigorosíssima dimensão etérea. Quase como um sonho. Talvez seja assim que encara a dinastia Tang, de onde lhe chega a história de Yinniang (Qi Shu), uma implacável assassina com a missão de eliminar o governador da província Weibo, Tian Ji’na (Chen Chang), figura de revelo no equilíbrio do poder imperial da China no século XIX.
O problema, ou a agradável surpresa, é que ‘A Assassina’ não segue o indiciado perfil do filme de artes marciais, sugerindo antes uma via bem menos evidente, ainda que bem mais sedutora. Onde a violência de Yinniang é encarada quase como uma dança, mas que se funde com a natureza de uma forma arrebatadora.
Lá está, ‘A Assassina’ não é ‘O Tigre e o Dragão’ (2000), de Ang Lee, ou ‘Herói’ (2002), de Zhang Yimou, mas ainda bem. Em vez da acrobacia, temos a arte. Ficámos a ganhar.
Nota: A nossa avaliação de * a *****