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Quinta-feira, Novembro 21, 2024

Crónica do Quotidiano Inútil, de J. Chrys Chrystello

Yvette Centeno
Yvette Centeno
Licenciou-se em Filologia Germânica, e e doutorou-se com uma tese sobre A alquimia no Fausto de Goethe. É desde 1983 Professora Catedrática da Universidade Nova de Lisboa, onde fundou o Gabinete de Estudos de Simbologia, actualmente integrado no Centro de Estudos do Imaginário Literário.

ed. Calendário de Letras

Recebo, com alguma impaciência do autor, o livro demorou mais de 15 dias a chegar, esta crónica que celebra os seus 40 anos da vida literária, começada em 1971 e durando até estes dias, a última data que leio é 2012.

É um belo volume, de belo design na capa e na concepção gráfica, com fotos e ilustração no interior. É agradável, para um leitor, ter na mão um edição cuidada.

A conclusão a que se chega, à medida que se avança, é que nada foi inútil no quotidiano descrito pelo autor, muito pelo contrário: os dias estão marcados por viagens e memórias que os poemas conservam e devolvem, em estilo ora mais evocativo (pelo momento em que são escritos) da revolta e da originalidade quase agressiva de muito da década de setenta, até à descrição, quase de narrativa realista, de um país que se prolonga para lá do continente, nos Açores, em primeiro lugar, mas de Macau, por exemplo, por onde se deambula, ou como depois se divide, em planetas poéticos de anos sucessivos: planeta Chrys (o seu mundo, com Daniel Filipe, grande poesia), planeta Macau, planeta Timor, planeta Galiza, planeta Açores (iremos ver Natália Correia, a Grande voz do nosso e de outros mundos), um conjunto maior, recuperando Eduíno de Jesus, poeta que conheci como colega na UNL, e com quem se prepara um final expressivo.

Retomo o final dum poema que quase resume o que é a experiência, ou a vivência, deste autor:

cantarei o arquipélago da escrita
sem títulos nem honrarias
sem adjectivos telúricos
sem versos de rima quebrada
não é açoriano quem quer
mas quem o sente. 
(p.222)

No fundo, como a Modernidade já tinha proposto, e evoco o grande Vitorino Nemésio, como poderia evocar Fernando Pessoa (que a todos nós marcou) o que se pretende é alcançar um novo discurso, despojado, que pulse ao bater do Sentimento, mais feliz ou mais desesperado (Antero de Quental), o sentimento de que todo o poético é real, e imaginária é a vida, o quotidiano que se definiu como inútil. Do início da década de 70, e dos exercícios de associação livre, de inspiração surrealista, até à mais recente, reflexiva e moderada, vai um longo percurso, que um bom leitor gostará de acompanhar. Viajar pela mão de um poeta por dentro dos seus países é uma experiência única, e que nos ajuda a crescer, a ampliar o que somos.

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