Piada sobre holocausto, comportamento abusivo e comentários sexistas levam personalidades que teriam papel central na organização dos jogos olímpicos a serem demitidas, afastando o público japonês da festa.
O diretor da cerimônia de abertura das Olimpíadas de Tóquio 2020 foi demitido, às vésperas da cerimônia, após reportagens na imprensa, de que ele já havia feito piadas sobre o Holocausto. A notícia é a última de uma série de constrangimentos para os organizadores de Tóquio que geraram indignação em casa e no exterior.
O presidente da Tóquio 2020, Seiko Hashimoto, disse em uma entrevista coletiva na quinta-feira que Kentaro Kobayashi, que participou de um ato cômico na década de 1990, foi demitido por causa de comentários que zombavam da tragédia nazista.
Antes desse escândalo, um músico famoso foi forçado a deixar o cargo de compositor para a cerimônia, após relatos de seu comportamento agressivo e abusivo também expostos. Em fevereiro, Yoshiro Mori, que já foi primeiro-ministro japonês, foi forçado a se demitir por causa de comentários sexistas. Um mês depois, o chefe criativo dos Jogos, Hiroshi Sasaki, também teve que renunciar após fazer comentários depreciativos sobre uma popular artista japonesa.
Além disso, os jogos que deveriam ser festivos e “divertidos” se tornaram palco para protestos inconvenientes para a organização, que tenta proibí-los. Atletas árabes, por exemplo, se recusam a disputar com israelenses, em apoio à Palestina.
Teve também a cerimônia de abertura, considerada sombria, triste e limitada pela pandemia. Apenas uns poucos oficiais e dignitários estavam nas arquibancadas do local para 68.000 lugares, assim como o desfile de atletas também foi reduzido. Os torcedores estrangeiros foram banidos, pela primeira vez na história dos Jogos, e os espectadores domésticos só podem assistir aos eventos em uns poucos locais.
Equipes do Quirguistão, Tajiquistão e os porta-bandeiras do Paquistão desfilaram sem máscara em um contraste estranho com o protocolo e a grande maioria dos outros atletas na cerimônia. Muitos chegaram logo antes de suas competições e saindo logo depois para evitar infecções.
Massacre os judeus
Em um videoclipe de sua atuação em 1998, Kobayashi foi visto brincando sobre um jogo que chamou de “vamos jogar: massacre os judeus”, causando risos na platéia.
O Simon Wiesenthal Center, uma organização internacional judaica de direitos humanos, divulgou anteriormente uma declaração condenando o comportamento anterior de Kobayashi.
“Qualquer associação dessa pessoa às Olimpíadas de Tóquio insultaria a memória de seis milhões de judeus e zombaria cruelmente da Paraolimpíada”, disse Abraham Cooper, rabino, reitor associado e diretor de ação social global do centro.
O próprio Kobayashi disse que lamentava o que chamou de uma “escolha estúpida” de palavras.
Gafes sexistas
Yoshiro Mori, o presidente do comitê organizador, renunciou ao cargo por causa de seus comentários sexistas que causaram protestos internacionais com menos de seis meses para os Jogos. A gestão de Mori como primeiro-ministro também foi marcada por gafes e erros grosseiros do mesmo tipo.
Mori, o ex-primeiro-ministro de 83 anos, gerou polêmica depois de reclamar que as mulheres do Comitê Olímpico Japonês (JOC) falam demais. As parlamentares do partido da oposição compareceram à sessão da Câmara dos Deputados vestidas de branco para protestar contra Mori. As roupas brancas simbolizam a luta das mulheres pela igualdade no Japão. Os deputados da oposição mostraram sua solidariedade colocando rosas brancas nos bolsos de seus ternos.
“Minha declaração inadequada causou muito caos … Desejo renunciar ao cargo de presidente a partir de hoje”, disse ele em uma reunião do conselho da Tóquio 2020 e do conselho executivo convocados para discutir seus comentários depreciando a participação das mulheres na organização dos Jogos.
Seu sucessor, Saburo Kawabuchi, que atualmente atua como prefeito da vila olímpica, também desistiu de ser nomeado depois que outros membros do Comitê Olímpico Japonês questionaram o papel de Mori na escolha. Fontes do governo teriam dito à imprensa que havia a pressão pela nomeação de uma mulher ou de uma pessoa mais jovem, já que Kawabuchi foi criticado por ser “outro homem mais velho”.
Faltou o Mário
Enquanto isso, a emissora pública NHK informou que o ex-primeiro-ministro japonês Shinzo Abe decidiu não comparecer à cerimônia, devido a desaprovação da população japonesa à realização dos jogos em meio ao avanço da pandemia. Abe, que se vestiu como o encanador titular do videogame Super Mario nos Jogos do Rio para representar o Japão, teve enorme protagonismo ao atrair as Olimpíadas para Tóquio.
Em uma pesquisa recente do jornal Asahi, 68% dos entrevistados expressaram dúvidas sobre a capacidade dos organizadores das Olimpíadas de controlar infecções por coronavírus, com 55% dizendo que se opunham à realização dos Jogos.
O governo japonês já havia declarado estado de emergência e restrições a vírus em Tóquio, em um esforço para minimizar os riscos à saúde entre residentes e visitantes. Os escândalos e contratempos da pandemia esfriaram completamente o clima de renascimento econômico e recuperação do desastre de Fukushima de 2011, que o ex-governante queria imprimir aos jogos.
Apenas um terço dos japoneses recebeu pelo menos uma dose da vacina, levantando a preocupação do público de que as Olimpíadas possam se tornar um evento de disseminação do vírus.
Para piorar, dezenas de participantes do evento testaram positivo para covid, forçando a retirada de atletas e técnicos de equipe ao isolamento. Tudo contribui para sobrecarregar o sistema hospitalar de Tóquio.
A pandemia não foi o único soluço, com escândalos que vão desde corrupção durante o processo de licitação até alegações de plágio no design do logotipo Tóquio 2020.
por Cezar Xavier | Texto em português do Brasil
Exclusivo Editorial PV / Tornado