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Sexta-feira, Novembro 1, 2024

Desemprego atinge trabalhadores de forma desigual

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

O desemprego está a atingir de uma forma desigual os trabalhadores aumentando as desigualdades e a pobreza dos que têm salários mais baixos e menores qualificações: a grave crise que enfrentamos não está a ser igual para todos

Neste estudo analiso, utilizando os últimos dados do emprego publicados pelo INE, a destruição do emprego em Portugal, não da forma global com é feita normalmente pela comunicação social, o que oculta realidades importantes, mas sim por níveis de escolaridade, por qualificações e por tipo de contratos, ou seja, fazendo uma análise fina, o que chega a conclusões mais dramáticas do que aquelas que se tiram quando se trata do emprego e do desemprego  como é normalmente feito.

As conclusões que se tiram é que, mesmo entre os trabalhadores, as consequências da grave crise económica e social causada pela pandemia é muito desigual. Isto porque a destruição do emprego de trabalhadores com baixa escolaridade e baixo nível de qualificação e com contratos precários tem sido enorme, muito superior ao que se obtém dos números globais, e o emprego de trabalhadores com o ensino superior e com qualificações elevadas tem aumentado significativamente mesmo durante a pandemia.

Para além disso o apoio aos desempregados é reduzidíssimo, e mesmo antes da pandemia a principal causa da pobreza era o desemprego (42 em cada 100 já estavam no limiar da pobreza). Portugal é um país cada vez mais desigual e com a pobreza a alastrar, que os números globais das estatísticas oficiais utilizados normalmente pela comunicação social, ocultam.

 


Estudo

O desemprego está a atingir de uma forma desigual os trabalhadores aumentando as desigualdades e a pobreza dos que têm salários mais baixos e menores qualificações: a grave crise que enfrentamos não está a ser igual para todos

A enorme crise económica e social causada pela pandemia está a atingir de uma forma desigual os próprios trabalhadores, agravando ainda mais pobreza daqueles que recebiam baixos salários e tinham menor escolaridade e qualificação , o que não é revelado pelos números globais do emprego e do desemprego que constituem os títulos das “caixas” habituais dos media. Só uma análise mais fina é que revela  verdadeiramente a dimensão da crise e quem está a sofrer mais com ela. E é isso que se realiza neste estudo utilizando os últimos dados oficiais disponibilizados pelo INE.

 

A destruição de empregos ocupados por trabalhadores de baixa escolaridade foi superior em 85,9% à verificada em todo o país

O quadro 1, com dados divulgados pelo INE, mostra que a crise está a atingir também de uma forma desigual os trabalhadores incidindo mais sobre os mais frágeis.

 

Quadro 1 – Destruição desigual de emprego atinge mais os trabalhadores com menor escolaridade

Em 6 meses (1ºT/3ºT2020) a redução de empregos foi de 66.000 no país (INE), mas a destruição de empregos ocupados por trabalhadores com o ensino básico atingiu 122.700, ou seja, mais 85,9% que a registada em todo o país. Enquanto isso se verificava com os trabalhadores com mais baixa escolaridade, a redução do emprego dos com o ensino secundário foi de apenas 10.000, tendo mesmo aumentado o emprego dos trabalhadores com ensino superior em 66.800 em plena pandemia. Somos todos iguais, mas não a nível de perda de emprego.

 

Quanto mais baixa é a qualificação da profissão maior é destruição, registando-se mesmo o aumento de emprego nas profissões de maior qualificação

O quadro 2, também com dados do INE, ilustra bem a forma desigual como a crise económica causada pela pandemia está a afetar os próprios trabalhadores com níveis de qualificação diferentes.

 

Quadro 2 – Variação do emprego em profissões importantes durante a pandemia

Também a nível de profissões se verifica efeitos desiguais da crise económica e social causada pela pandemia. Enquanto nas profissões mais qualificadas se verifica até um aumento significativo do emprego durante a própria pandemia, como aconteceu com a “Especialistas das atividades intelectuais e cientificas”, cujo emprego aumentou em 80.100 em apenas 6 meses, em profissões como menor qualificação, como “Trabalhadores dos serviços pessoais, de proteção e segurança e vendedores” a destruição de emprego atingiu 57.100; na de “Operadores de instalações e maquinas” foram destruídos 33.800 empregos, e na de “Trabalhadores não qualificados” desapareceram 48.200 empregos.

Os efeitos da crise num país cujo reduzido crescimento económico verificado nos últimos anos assentava em empregos de baixa escolaridade e qualificação estão a ser dramáticos como os números do INE mostram de uma forma clara, o que não é detetado pelas análises habituais dos números globais do emprego.

Também em relação ao tipo de contrato que o trabalhador tem verificam-se consequências diferentes causadas pela crise económica e social devido ao COVID 19.

 

Quadro 3 – Variação do emprego de acordo com o tipo de contrato do trabalhador

Num período de apenas de 6 meses, o emprego a tempo completo diminuiu em 66.200, mas o dos  trabalhadores com contrato sem termo aumentou em 32.000, enquanto os com contratos a prazo reduziu-se em 65.000. Os trabalhadores precários são, numa crise, os principais a perderem o emprego. O que já se sabia é confirmado pelos dados divulgados pelo INE.

 

O aumento da subutilização do trabalho em Portugal e a dimensão da riqueza não criada (perdida) causada pela crise económica e social

As consequências económicas e sociais que a crise está a causar são enormes a nível da “subutilização do trabalho” com revelam os dados do INE que estão no quadro seguinte.

 

Quadro 4 – A dimensão da subutilização e do “desperdício” do trabalho em Portugal

Em apenas 6 meses o número de trabalhadores “subutilizados”, para utilizar os termos do INE; aumentou em 119.000, atingindo o total de 813.700, o que corresponde a 14,9% da população ativa do país, segundo o próprio INE.

Enquanto o subemprego a tempo parcial forçado inclui trabalhadores que fazem ainda alguns biscates, os desempregados e os inativos disponíveis e não disponíveis, que são desempregados mas que não aparecem nos números oficiais de desemprego apenas porque no período em que foi feito o inquérito pelo INE não procuraram emprego, embora estivessem desempregados (por isso o desemprego real no 3ºT de 2020 não foi 404.100 como o numero oficiais de desemprego dizem, mas sim 655.100); repetindo, estes 813.700 trabalhadores não produziram riqueza, embora o país bem precisasse dela para se desenvolver.

E como cada trabalhador produziu em média, em 2019, riqueza no valor de 42.873€, aqueles 813.700 trabalhadores, se tivessem a trabalhar, produziriam riqueza no montante de 34.885 milhões €, ou seja, 16,4% do PIB de 2019. Estes valores dão bem uma ideia da dimensão da riqueza perdida devido à subutilização do trabalho em Portugal, que já era muito grande antes da pandemia – 649.700 – tendo aumentado com a crise para 813.700.

 

O reduzido apoio aos que perderam o emprego e o aumento da pobreza no país

Para aumentar ainda mais a pobreza a que estão sujeitos estes 813.700 trabalhadores e suas famílias o apoio aos desempregados em Portugal continua a ser muito reduzido. Segundo a Segurança Social, que é a entidade que paga o subsídio de desemprego, no fim do 3ºT de 2020 estavam a receber o subsídio de desemprego (em média 494,85€) apenas 230.303 e, em dez.2020, somente 241.324, ou seja, 35,1% (apenas 35 em cada 100 recebiam subsídio de desemprego). Os comentários são desnecessários, mas é evidente que a pobreza é já enorme e está a alastrar.



 


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