Confissões de uma mulher à deriva.A última vez que me reencontrei, vagueava pelo universo, flutuando entre os astros e planetas, não me lembro se sorri para mim… pois sabe a amargo, sabe bílis, sabe a fel… este interior paludicamente crónico. Esta alma ambulante que vagueia nua pelo cosmo da sobrevivência… máximas como o importante é saúde, o amor vale mais que o dinheiro, o que não tem remédio remediado está, deixaram de fazer sentido.
Como ter saúde quando se tem fome? O que é a saúde? Diz o meu o meu dicionário que é o estado de equilíbrio e bom funcionamento do organismo. Será salutar uma mulher e mãe de quatro filhos separada e desempregada?
E como fazer uma declaração ou demonstração de amor a uma criança que foi expulsa da escola por falta de um caderno ou lápis, senão comprando (com dinheiro) o que ela necessita para suprir as suas necessidades? E como se remedeia quando não se tem mesmo nada?
Estava eu passando pelo Plutão, quando uma luz no fundo, denunciava a presença de vestígios do meu amor-próprio, estilhaçado na velocidade da luz, a catedral do meu eu, invadida por ilusão a quem chamei de bem emocional… como consegui distinguir uma frustração que me causou tantos danos morais?
Hoje decidi ir ao ginásio, não antes de cortar o cabelo de dois dos meus meninos, lavar roupa, ir ao mercado e fazer o almoço… ainda tive de trocar uma lâmpada… depois questionei-me se ainda precisava de exercícios… exercitar propriamente o quê?
Chego ao ginásio tão cansada, mas exercito; exercito a mente e a auto estima e aí consigo alguns minutos para mim. Tenho sonhos. Às vezes consigo ser fria e fingir que não sinto a carência adulando meu ego. E me adapto ao surreal… o facto de ainda respirar. E então minha necessidade adequa-se ao momento. Eu sou essa voz que fala dentro de ti, cobrando por empréstimos não feitos. Vagueio de orgasmo em orgasmo tentando abafar a carência que insiste em adulterar a minha auto-lealdade… na cabeceira o relatório médico da filha que aguarda por uma amnistia ou talvez um milagre na barriga do porquinho onde amealho esta minha magra esperança.
O que é ser pobre?
Voltei a consultar o dicionário…
- que não tem recursos (quando me falta energia eu oro)
- que inspira compaixão (nunca demonstrei tristeza)
- pouco produtivo (não paro de plantar)
- com poucas condições de desenvolvimento (ainda assim continuo a regar)
Depois consultei pobreza:
- falta de meios a subsistência humana (só luto para que o dia amanheça)
- ausência de recursos financeiros; carência (não te ter, me deixa carente, quem tem o teu amor tem tudo?)
- falta de inteligência, ou de qualidade (não sou nada medíocre)
A ultima vez que me reencontrei… não me reconheci…
Continua…
A autora escreve em PT Angola