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Terça-feira, Dezembro 24, 2024

Desmontando os argumentos de Carlos César sobre o CETA

No âmbito do colóquio “CETA – desafios e oportunidades para os Açores”, realizado a 15 de Maio em Ponta Delgada, o presidente do PS e líder do grupo parlamentar, Carlos César, enalteceu o acordo comercial assinado entre a União Europeia e o Canada (CETA).

José Oliveira, activista da Plataforma Não ao Tratado Transatlântico, contrapõe e esclarece, em forma de contraditório, as afirmações de Carlos César e de outros participantes no colóquio:

Carlos César: “É o acordo mais progressivo, moderno e inovador negociado pela UE…ajudando a regular e controlar alguns aspectos mais perversos da globalização”.

José Oliveira: É verdade que o CETA é inovador em muitos aspectos, mas sempre no pior dos sentidos. Trata-se do 1º tratado assinado pela CE que contém as “listagens negativas”, as Comissões Regulatórias, o ICS (Investment Court System; ver adiante), entre outras disposições perniciosas. Estabelece ainda que uma parte importante do acordo permanecerá em vigor por mais de 20 anos, mesmo no caso de o acordo vir a ser eventualmente reprovado pelos parlamentos nacionais. Isso refere-se ao mecanismo de protecção do investimento, precisamente a parte mais controversa e contestada do acordo.

Para as grandes corporações transnacionais, as únicas beneficiárias do CETA, o ICS constitui-se como um verdadeiro maná, pelos privilégios que lhes concede, sem qualquer contrapartida.

Quanto a controlar os pontos perversos da globalização, bastará dizer que o capítulo sobre Desenvolvimento Sustentável se limita a fazer apelos a consensos, diálogo e medidas voluntárias, mas sem prever nenhum mecanismo para a sua aplicação. Pior ainda a ausência do Princípio da Precaução, pedra basilar dos valores europeus, em todo o texto do tratado.

Carlos César discorda que os acordos de livre-comércio causem mais desemprego e afirma que esse flagelo tem outras causas, como as transformações tecnológicas.

José Oliveira: Naturalmente que as novas tecnologias e a automatição produzem desemprego, mas tal pouco tem a ver com os tratados. Basta verificar as consequências do NAFTA, o tratado entre o México, os EUA e o Canadá, para compreender que estes acordos potenciam o desemprego, embaratecem e precarizam a força de trabalho e aceleram a deslocalização para aumentar os lucros, mesmo que à custa do empobrecimento generalizado e da destruição ambiental. O México é hoje um país devastado pelo NAFTA. Cerca de 2 milhões de empregos foram destruídos, a pobreza aumentou, os salários baixaram, os camponeses foram expulsos das suas terras, a fome é endémica, a corrupção, o crime organizado e a emigração dispararam também.

Do lado dos EUA, o impacto não é brilhante. 700.000 desempregados por via da deslocalização, os salários de miséria e a precarização alastraram, rareiam os sindicatos e os direitos, o nº de pobres disparou.

– Outros conferencistas declararam que “todos os acordos são benéficos” porque “abrem hipóteses de exportação”.

José Oliveira: Claro que a eliminação das tarifas alfandegárias cria algumas oportunidades de negócio para empresas exportadoras, neste caso, para os laticínios dos Açores, até porque os preços praticados no Canadá são em geral superiores aos europeus. Mas é fundamental ver a questão na sua abrangência. Isto é, essas oportunidades chegam com um elevado preço a pagar por toda a sociedade. As grandes empresas do outro lado do Atlântico cavalgam a exacerbação da concorrência, trazem a precariedade e o desemprego, trazem produtos de inferior qualidade e até perigosos (OGM, carnes com hormonas e antibióticos, químicos e pesticidas venenosos, destruição ambiental…).

Como já foi referido acima, o CETA inclui um novo mecanismo de resolução de litígios de investimento, o ICS, através do qual as grandes empresas podem processar os estados – mas não o contrário – sempre que os seus lucros sejam ameaçados por medidas dos governos, ainda que no interesse público.

  • Listagens negativas: são listados os sectores em que o tratado não vai actuar. Subentende-se que tudo o mais será abrangido pela liberalização, incluindo actividades que ainda não existem hoje, mas que poderão desenvolver-se no futuro. Essas já estão também abrangidas;
  • Comissões Regulatórias: fóruns em que representantes das corporações e dos burocratas de Bruxelas podem introduzir alterações ao tratado, já depois de aprovado. Nenhum mecanismo democrático as controla.

Plataforma Não ao Tratado Transatlântico

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