Notícias do último fim-de-semana, como a do DINHEIRO VIVO anunciando que o «Deutsche Bank avança com plano de reestruturação e corta 18 mil empregos» ou a do JORNAL DE NEGÓCIOS dizendo que o «Deutsche Bank lança plano de reestruturação de 7,4 mil milhões», vieram apenas confirmar que o maior banco de investimento da Europa está em apuros.
O anúncio desta grande reestruturação é também um prenúncio de um problema maior com os bancos europeus em geral, que estão atulhados de biliões de euros em empréstimos bancários em situação de incumprimento que não conseguiram resolver desde a crise iniciada em 2008.
O Deutsche Bank, o maior de todos e que tentou rivalizar com os gigantes bancos de investimento americanos Goldman Sachs e Morgan Stanley, confirma-se agora numa situação conhecida dos especialistas, mas sistematicamente negada até ao anúncio do corte de quase duas dezenas de milhar de empregos e da venda de activos para concentrar a sua actividade nos clientes empresariais alemães. Os sinais das dificuldades há muito que se avolumavam, nomeadamente quando foi tentada e abandonada a fusão com outro grande banco alemão, o Commerzbank, não faltando na altura quem lembrasse que a junção de dois coxos nunca criou um corredor de maratonas, nem que as realizadas fusões do Dresdner Bank com o Commerzbank e do Postbank com o Deutsche Bank tivessem reforçado a solidez dos sobreviventes ou permitido grande recuperação após a crise de 2008, embora tenham levado à destruição de mais de 30.000 postos de trabalho.
A solução de venda de activos agora ensaiada não é senão outra forma de resgate, completada com o anúncio da criação de um ‘banco mau’ com activos no valor de 74 mil milhões de euros, na tentativa de se libertar dos activos não produtivos, solução que pode não se revelar suficiente caso o preço das acções do banco caia ainda mais rapidamente ou os especuladores apostem em levá-lo para um valor próximo de zero, como aconteceu na ocasião do colapso do famigerado Lehman Brothers.
Tal como aconteceu em 2008 com este banco americano, outro grande problema do Deutsche Bank é a composição da sua carteira de activos de risco, onde o elevado peso de contractos de derivados e o seu potencial para precipitar um “efeito de contágio global”, caso sua situação financeira continue a piorar.
Já em meados de 2018, quando se tornou público que a filial norte-americana do Deutsche Bank chumbou nos testes de stress da Reserva Federal, foi ensaiada uma solução que credibilizasse a instituição e eliminasse os receios dos investidores revelados quando a cotação das suas acções caiu 11% e com volume de negócios acima do normal, ficou bem patente o interesse de alguns especuladores na queda das acções (através de estratégias de short selling ou outras) e na tendência para agravar a sua desvalorização, algo que no passado já precipitou a queda doutros bancos por esse mundo fora e levou o FMI a considerar aquela que há pouco mais de dez anos, era uma instituição de retalho, e que acabou, na prática, por se transformar num banco de investimento global, como um dos grupos com maior risco sistémico para o sector financeiro internacional.
Estima-se que o Deutsche Bank, que em finais de 2018 apresentava um património líquido estimado em 69,5 mil milhões de dólares, detenha actualmente 45 biliões de dólares em operações com derivados negociados com outras instituições, não sendo pois de estranhar que algumas fontes e analistas comecem a comparar esta situação com a do colapso do banco de investimento Lehman Brothers nem que atribuam uma elevada probabilidade a um eventual colapso do banco numa próxima crise, pois aquela exposição aos produtos derivados é a melhor via pela qual o colapso do contágio e da desvalorização dos activos é transmitido para outras instituições financeiras (especialmente se estas também se apresentarem financeiramente frágeis), arrastando o conjunto do sector para uma nova vaga de congelamento generalizado de crédito nos diversos mercados financeiros da Europa.
Além das óbvias dúvidas sobre a dimensão e composição da sua carteira de derivados – a maioria destes contractos, com excepção dos swaps de taxa, não são objecto de qualquer registo nem de controlo pelas diferentes autoridades financeiras nacionais (são os chamados fora de bolsa ou “over the counter”) – fica ainda a grande questão de saber se o BCE pode ou não socorrer o Deutsche Bank com sucesso, numa conjuntura menos favorável a este tipo de intervenção (veja-se o que aconteceu com o BES) e quando se prepara a substituição de Mario Draghi por Christine Lagarde, pois um resgate do BCE iria injectar ainda mais liquidez no sistema bancário europeu e pressionar significativamente as taxas de juros para valores negativos, quando mais de 50% das dívida públicas europeias já apresentam taxas de juro negativas.
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