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Quinta-feira, Outubro 24, 2024

Diferença entre dizer e fazer

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

A diferença entre o que disse Montenegro no Congresso do PSD e os atos (o “Acordo Plurianual de Valorização dos Trabalhadores da Administração Pública, para o período 2025 a 2028”) do seu Governo sobre a valorização das remunerações dos trabalhadores da Função Pública

Neste estudo analiso (dados DGAEP e INE) a perda de poder dos trabalhadores das Administrações Públicas entre 2011 e 2024 e a proposta de aumento de remunerações para 2025/2028 do ““Acordo Plurianual de Valorização dos Trabalhadores da Administração Pública, para o período 2025 a 2028”apresentada pelo Ministério das Finanças aos sindicatos que , se ele fosse aceite, determinaria nova perda de poder. E comparo as afirmações de Montenegro no Congresso do PSD de que os objetivos do seu governo eram ”defender os serviços públicos em risco” e “valorizar muito quem trabalha no Estado”, mostrando que elas não correspondem à pratica do governo em relação à Administração Pública. Mais uma vez tenta-se enganar os portugueses.

Estudo

A diferença entre o que disse Montenegro no Congresso do PSD e os atos (o “Acordo Plurianual de Valorização dos Trabalhadores da Administração Pública, para o período 2025 a 2028”) do seu Governo sobre a valorização das remunerações dos trabalhadores da Função Pública

Durante o congresso do PSD realizado no fim de semana de 19/20 de outubro de 2024, Montenegro afirmou que eram objetivos do seu governo ”defender os serviços públicos em risco”, “valorizar muito quem trabalha no Estado”, e que “eram diferentes e estavam a fazer a diferença”. Mas corresponderá estas afirmações à verdade ou será mais um “malabarismo” do governo que Montenegro acusou na sua intervenção os governos que o antecederam?

 

A PROPOSTA DO GOVERNO DE MONTENEGRO APRESENTADA AOS SINDICATOS MANTEM NÃO SÓ A PERDA DO PODER DE COMPRA DAS REMUNERAÇÕES ILIQUIDAS (antes dos descontos) e LÍQUIDAS (após descontos) DOS TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DESDE 2011 COMO ATÉ DEVE AUMENTAR ESSA PERDA

Como se pode dizer que são objetivos do governo “defender os serviços públicos em risco”, “valorizar muito quem trabalha no Estado” e que “são diferentes e vão fazer a diferença” quando o Ministério das Finanças apresentou aos sindicados da Administração Pública (AP) uma proposta a que chamou “Acordo Plurianual de Valorização dos Trabalhadores da Administração Pública, para o período 2025 a 2028” de aumento de remunerações de “55,26€ ou um mínimo de 2,1% para 2025 e 2026 e, 57,89€ ou um mínimo de 2,2% para 2027 e 2028”, ou seja, aumentos tão reduzidos que não serão certamente superiores à inflação que se verificará até atendendo ao contexto geopolítico com guerras e sanções que encarecem tudo, e não permitem recuperar qualquer parcela do enorme poder compra que os trabalhadores perderam desde 2011? Como se pode dizer que se quer “valorizar muito quem trabalha na Administração Pública” e ao mesmo tempo continuar a pagar remunerações indignas e a desvalorizar o seu trabalho? Como se pode dizer que se quer defender os “serviços públicos em risco” quando não se garantem remunerações dignas que evitem o abandono e a falta de atração dos trabalhadores com as qualificações e competências que ele necessita no SNS, na escola pública, na digitalização dos serviços, e em muitos outros serviços públicos para servir melhor a população? O objetivo da proposta do governo parece ser o de empurrar os trabalhadores da Função Pública mais qualificados (ex. médicos, enfermeiros, informáticos, etc.) para o setor privado apoiando o seu desenvolvimento e degradar os serviços públicos.

Mas para que o leitor possa ficar com uma ideia clara, e tirar as suas próprias conclusões, da situação atual dos trabalhadores Administrações Públicas (Central, Local e Regional) elaborou-se o quadro seguinte com as remunerações base medias mensais ilíquidas ou brutas, portante antes de quaisquer descontos, dos trabalhadores em 2011 e em 2024 e a variação do seu poder de compra. Os dados utilizados são oficiais e são os últimos disponibilizados (DAGAEP e INE).

Quadro 1 – Remunerações Base Médias Mensais (RBMM) ilíquidas (antes dos descontos para GA/SS, ADSE e IRS) dos trabalhadores da Administração Pública em 2011 e 2024 e perda do seu poder de compra

Excetuando 3 grupos profissionais – assistentes operacionais, técnicos diagnostico e terapêutica, e policiais municipais – em todas as restantes categorias profissionais o poder de compra das remunerações medias brutas mensais em 2024 é inferior ao de 2011 e, em algumas categorias, é muito mesmo. Os assistentes operacionais é que viram o seu poder de compra aumentar em 12,5% devido ao efeito do salário mínimo nacional. Mas uma coisa são as remunerações ilíquidas ou brutas (antes dos descontos) e outra coisa são as remunerações líquidas (após todos os descontos) ou seja, o rendimento disponível do trabalhador (o que ele leva para casa) para ele e família viverem. E a redução foi maior.

O quadro 2, também elaborado utilizando dados da DGAEP sobre remunerações médias e o IPC do INE mostra que a perda de poder de compra na remuneração base média líquida foi maior do que na ilíquida (bruta).

Quadro 2 – Remunerações Base Médias Mensais (RBMM) ILIQUIDAS (antes de descontos) e LÍQUIDAS (após descontos para CGA/SS, ADSE e IRS) dos trabalhadores da Administração Pública em 2011 e 2024 e perda do seu poder de compra

Como mostram os dados do quadro 2, a nível das Remunerações Base Médias Mensais (RBMM) LÍQUIDAS (após descontos) dos trabalhadores das Administrações Públicas , ou seja, o rendimento disponível que o trabalhador leva para casa para viver, a quebra de poder de compra foi ainda maior entre 2011 e 2024 do que a verificada nas RBMM ILIQUIDAS (antes de descontos), chegando a atingir -20% a nível de dirigentes (como é que pode ter bons dirigentes pagando tão mal?); -30,8% no pessoal de investigação cientifica (como é que pode haver inovação no país tratando tão mal os investigadores científicos?); -10,2% no pessoal de informática essencial à digitalização de serviços que neste momento, a sua maioria, estão entregues a empresas privadas incluindo os seus sistemas de informação altamente sensíveis bem como a cibersegurança; entre -10,6% e -13% professores e médicos em falta em serviços essenciais ao desenvolvimento do país e ao bem estar da população, etc. Só os assistentes operacionais é que viram o poder de compra das suas remunerações líquidas aumentarem porque estão colados ao salário mínimo nacional, aumentando este, elas aumentam automaticamente. Face a esta realidade, que Montenegro devia conhecer, como é que ele pode dizer, como o fez no congresso do PSD que, com aumentos de remunerações entre 2,1% e 2,2% até 2028,são objetivos do seu governo ”defender os serviços públicos em risco” e “valorizar muito quem trabalha no Estado”? É enganar.

 

A PERDA DE PODER DE COMPRA DA REMUNERAÇÃO BASE MÉDIA LÍQUIDA DAS FORÇAS ARMADAS E DE SEGURANÇA

Também as Forças Armadas e a Força de Segurança (PSP e GNR) foram lesadas pela política de austeridade salarial dos sucessivos governos como revela o quadro 3 e não são os suplementos que mudam isto pois não são incluídos na RBMM.

Quadro 3 – Remunerações Base Médias Mensais (RBMM) ILIQUIDAS (antes de descontos) e LÍQUIDAS (após descontos) das Forças Armadas e das Forças de Segurança em 2011 e 2024 e perda do seu poder de compra

Os comentários são desnecessários já que as conclusões são evidentes, pois confirmam (mutatis mutandis) as conclusões tiradas nos pontos anteriores. Mas uma conclusão é já clara: quanto mais elevada é a patente maior é a perda de poder de compra da remuneração líquida.

 


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