Os homens e mulheres de direita estão tão tristes e, até irritados, que acordam às quatro e meia da manhã com um pesadelo horrível: Marcelo beija na boca Jerónimo e depois acaricia os filhos de ambos, gerados em barriga de aluguer e apadrinhados em baptismo pelo padre Melícias. No fim cantam José Mário Branco em cima de um porco, em direcção ao sol, ao amanhã que canta.
Há eleitores órfãos e ninguém os quer, pessoas boas que até dão gorjas e dizem bom dia, que estão muito tristes. Querem votar em Marcelo Rebelo de Sousa mas este está renitente em assumir que é de direita. Para o povo e até para os comentadores Marcelo é um centrista e um “fazedor” de consensos.
Deve tranquilizar-se esta gente e dizer-lhes que podem dormir descansados. Marcelo é igual a eles. As pessoas de direita em Portugal andam há anos, desde o Cavaquismo, a dizer que “a diferença entre esquerda e a direita não existe”. Insistiram tanto nisto que até Passos Coelho ou Cavaco afirmaram sem pudor estar “à esquerda” do PS ou do PCP em determinados momentos. Foram os eleitores e simpatizantes de direita que se suicidaram nesta discussão.
Agora, há claramente uma consequência. A direita quer que o candidato de direita diga qualquer coisa de direita. Mas esquecem-se que já disse. Andou a dizê-lo durante 44 anos e vai continuar. Não diz tudo e o seu contrário – Marcelo é um conservador simpático, um homem de direita com nuances sociais caritativas, não solidárias.
O problema é que em Portugal há gente que se colou tanto ao neoliberalismo e ao conservadorismo acéfalo (esses que estão muito órfãos) que desejam que Marcelo diga que vai fechar fronteiras aos refugiados e defender as barbaridades que Passos fez. A angústia de Nanni Moretti em Aprile está agora posta ao contrário. É bem feita. A radicalização ideológica da direita que nunca o assume ser deu nisto. Mas descansem. Há gente em barda para votar Marcelo, sem sequer pensar no que pensa Marcelo. Ele será o grande vencedor da “Quinta”.
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