A comunidade internacional tem ouvidos e olhos, lê, assiste – não pode ignorar. E nessa plateia comprometida Portugal não constitui exceção.
Não é eficaz encher as redes sociais com lágrimas inquietas do tipo Je suis Alepo ou equivalente, nem escrever como estamos – estamos? – todos chocados com a brutalidade que nos chega via uma comunicação social muito condicionada (convém não esquecer que a censura opera sempre de forma drástica em cenário de guerra e, fora desse cenários, como se movimenta ao serviço dos grandes interesses que mobilizam e algemam os mesmos órgãos de comunicação que, ou são propriedade dos interessados ou estão prisioneiros das formas de se financiarem, que resultam quase sempre dos interessados ou dos seus sócios diretos).
Tanto suspira com a foto da criança morta em Alepo, como procura o Pokemón
Interroga-se mesmo se estaremos assim tão chocados com as imagens brutais que se vão somando, vindas das origens mais intensas – esquecendo tantas vezes a enorme brutalidade das frentes mais débeis. É que o consumidor ocidental tanto olha para o ecrã da TV e muda de canal, como tem os olhos fixos no ecrã do seu telemóvel; tanto suspira com a foto da criança morta em Alepo ou na praia onde muitos refugiados como ela acabaram os seus dias, como procura o Pokemón, cumprindo coordenadas fornecidas por um Big Brother sinistro que raciona o pão, mas não o circo, e aposta com firmeza na manipulação de todos nós.
As imagens que nos chegam são sempre parcelares. Uma coisa é apreciar o elevado grau de destruição da cidade de Alepo, ou entrever a brutalidade dos combates (que envolvem tantos lados e fações, e apenas uma vontade, a de alcançar a posse de um território, dos canais da riqueza possível, do cumprimento dos objetivos de quem patrocina armas, equipamentos e fardas, enquanto fica na trincheira cómoda da distância) outra é conseguir perceber realmente o que se passa. Entendemos a razão da guerra. Sabemos porque se trava. Na Síria ou em qualquer outro ponto em que ela tem interesses.
Propaganda… conduz a mais massacres
Vergadas à vergasta da propaganda, as notícias vão-nos confundindo e acabamos a concordar com aqueles que pedem mais apoios internacionais (o que normalmente conduz a mais massacres, amplificação dos dramas que levam sempre, prioritariamente, e nunca ao desfecho da guerra.
A guerra só acaba nos territórios quando deixa de dar lucro – para passar a dar outro tipo de lucros, obviamente. É ela quem dita os grandes negócios industriais, do armamento ao fardamento, dos veículos aos equipamentos de rotina, da gestão dos combustíveis à construção civil, é ela quem cria a velha lenda de que a Paz não traz desenvolvimento e que as grandes conquistas da Humanidade foram operadas ou alavancadas pelos conflitos (não há lenda mais falsa e contudo mais alimentada).
Ao olharmos para o que vemos em Alepo, a mentira é muito evidente: russos e americanos (os principais protagonistas) lutam no terreno, matando civis e fazendo as suas fortunas, cumprindo metas de poder.
A ilusão de que o grupo de assassinos que se autointitula um Estado e ainda mais abusivamente islâmico e as tropas de Assad têm objetivos diferentes, deve também ser denunciada.
Não há imagens de pormenor destes “exércitos” a fazerem o que melhor fazem: matar, proteger-se cobardemente com escudos humanos civis e verificarem nas suas contas bancárias o produto da sua dedicação.
A comunidade internacional pode vencer as guerras. Pode boicotar apoios, retirá-los, denunciar os assassinos que governam os países envolvidos.
Mas é uma luta muito desigual
Quem irá derrotar Donald Trump quando ainda agora celebra a vitória e faz planos de piorar os cenários conhecidos?
Todos nós teremos de definir o papel que nos cabe nas urgentes missões de paz que podem, in extremis, salvar o mundo. É uma missão arriscada – como normalmente são todas as missões pelo que queremos pacífico.
Este artigo respeita o AO90