A obra do artista plástico Magritte documentada em filme, o hoolywoodiano “Ágora” e o brasileiro “Rodantes”
Quando você assiste a um documentário como este “Magritte ou La leçon des choses”, você não está assistindo ao cinema ou à arte do cinema. Estamos assistindo, no caso, a obras artísticas que tanto podem ser pintura ou simples cartaz ou mesmo performance. E não arte do cinema. Esse instrumento que é o cinema é apenas o elemento com que documentamos uma realidade criada pelo artista.
E, assim, o documentário serve para divulgar a obra plástica criada pelo artista Magritte, e ele mesmo declara não saber o que realmente está pintando. Não é a realidade, diz, quando pinta um cartaz com um cachimbo e desenha em baixo: isso não é um cachimbo. Não é uma pera ou uma maçã nem o homem e nem Deus com d grande.
O documentário foi feito na Bélgica e foi dirigido pelo cineasta Luc de Heusch. E isso não tem a menor importância para o espectador. Porque o que interessa é que está sendo representado algo que foi criado pelo artista Magritte e não pelo cineasta. E precisamos tomar a legenda e ler a legenda parada, pois senão ela não é percebida com toda a clareza. Entretanto, é sem dúvida o cinema a melhor forma para divulgar as artes, principalmente as visuais. E foi a partir delas que o filósofo alemão Walter Benjamin criou o conceito de quebra total da aura das artes plásticas.
“Magritte ou A lição das coisas” está disponível no portal Making Off.
Olinda, 04. 12. 21
O hollywoodiano Ágora
É um filme que está no Mubi, “Ágora”, mas não passa de uma mera produção hollywoodiana feita pelo cineasta chileno-espanhol Alejandro Amenábar. Está dentro dessas produções que se apresentam como de grande valor artístico, mas não passam de artefatos cinematográficos para estar no mercado exibidor.
Penso que esse cineasta Amenábar tem sempre cumprido tarefas cinematográficas para o mercado exibidor. E no caso, eu vi como um para mim exercício de análise crítica de um produto que se faz passar por arte e não vai além de artefato. Nem mesmo simples artesanato. Como se fosse uma obra histórica sobre a dança política na Roma antiga. É claro que não é histórica. É pura ficção. Não é ciência social. É o específico produto feito em algum lugar, porém com a estrutura industrial de Hollywood. Tanto que mesmo sendo espanhol é falado em inglês. A língua internacionalizada. Pode servir como distração, se alguém ainda precise disso hoje.
Olinda, 29. 11. 21
Rodantes é um filme ou o quê?
Minha posição crítica é de que o cineasta tem total liberdade para sua criação. Entretanto, existem especificações para a arte, inclusive a cinematográfica. E no caso do cinema, me parece que não se pode dizer que se trata de um filme, se o domínio estético e dramático está no som e não na imagem. A arte cinematográfica sempre precisou do som, o cinema nunca foi mudo como se fala, entretanto, é na imagem onde temos a dimensão principal dessa arte. Como a literatura não pode existir sem a palavra escrita. E nesse filme “Rodantes”, o som pode não ser predominante sobre a imagem, mas tem total autonomia. Os diálogos em geral não saem da boca do personagem, mas são falados desligados de uma boca. Saem os diálogos do espaço. E o som no seu roteiro geral é mais forte do que a imagem, embora esta também seja forte e tenha sem dúvida uma excelente dimensão estética.
O cineasta Leandro Lara é de Minas Gerais, e tem formação num curso de Arte e Comunicação da PUC de Belo Horizonte. É também formado em Direção de Fotografia no curso de cinema que existe em Cuba. Na sua história de criação tem curtas e documentários, inclusive um sobre música, que foi feito em colaboração com um DJ. “Rodantes” é seu primeiro longa de ficção e já passou no Festival de Brasília.
No roteiro, consta a existência de três personagens, um deles um imigrante haitiano. Mas não será assistindo ao filme que o espectador se informará diretamente sobre esses personagens. Porque embora o som esteja totalmente presente, não informa explicitamente e a imagem muito menos. Daí a minha pergunta acima, porque temos drama e dimensão estética, mas não temos na verdade um drama narrado. Temos muito mais um poema dramático misturando sons e imagens e ambos os elementos são, vamos dizer, nublados por uma aura que se contrasta quase sempre com a própria realidade. Realmente, o diretor procurou mais criar um drama poético do que uma narrativa dramática. Claro que para mim, como espectador, não está importando que conte ou não a estória dos personagens. Mas para a estrutura da obra faz muita distinção.
Temos certamente uma obra audiovisual que fala do nosso país e particularmente de Rondônia, onde foi rodada segundo as informações. E mostra momentos bem distintos, mas sempre com muito autonomia dos sons. E a imagem se apresenta com menos agressividade. Enfim, um belo filme, digamos.
Olinda, 15. 10. 21
por Celso Marconi, Crítico de cinema mais longevo em atividade no Brasil. Referência para os estudantes do Recife na ditadura e para o cinema Super-8 | Texto em português do Brasil
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