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João de Sousa

Domingo, Novembro 3, 2024

Um retrato da saúde mental no Japão

Kazuhiro Soda é um cineasta japonês de 50 anos, que mora de modo tradicional em Nova York, mas trabalha no Japão. Vi agora o seu documentário Mental, que tem duração de 135 minutos. O filme está em exibição no site Mubi, onde vi outros filmes de Soda.

De um ponto de vista da globalização social, até que estamos indo muito bem, pois é isto que está acontecendo: você pode morar muito bem em qualquer cidadezinha de Pernambuco e trabalhar visando atingir o mundo. Então a sua linguagem cinematográfica fica livre para ser parecida com quem você queira. É claro, porém, que a maioria tende a acompanhar os caminhos do cinema de Hollywood, pois assim consegue fazer o que é mais interessante, que é atrair o chamado grande público, a principal meta da indústria do cinema.

Não é isso, porém, que acontece com Kazuhiro Soda. Ele, nos seus trabalhos, mostra uma linguagem nada hollywoodiana, e poderíamos encontrar muito mais aproximação com cineastas da periferia cinematográfica, inclusive do século passado no Brasil, como um Leon Hirszman ou um Nelson Pereira. Para começar, Soda escreve seus roteiros, produz, dirige e edita seus filmes. Dessa forma, consegue os caminhos mais pessoais possíveis. Certamente não será nunca um campeão de bilheteria. Mas poderá deixar um acervo importante de filmes que falam sobre a realidade social e psicológica da humanidade.


Cena de Mental, um filme sem atores em que todos são pessoas documentadas

Em Mental, o diretor japonês entrou numa clínica média da cidade de Tóquio e lá trabalhou com os princípios do “cinéma verité”, sem censura. Nem autocensura, nem censura dos proprietários e funcionários da clínica. Assim, vai registrando o que está acontecendo, em uma sessão de tratamento de uma, cliente com um psiquiatra, ou nas discussões entre equipes de trabalho, ou um professor fazendo uma revisão com uma equipe de estagiários. Ou mesmo a cena que se tornou a final de um perturbado mental.

Como espectador, quase que sentimos uma certa estranheza, pois nos choca a extrema liberdade que a câmara mostra ter com os filmados. Na divulgação do filme, ninguém realmente é dito como ator participante. Não há ator nesse filme. Todos são pessoas documentadas e, nesse aspecto, penso que Kazuhiro Soda vai além dos mais tradicionais documentaristas.

Antes, Soda fez um filme que se chama Peace, que mostra uma cidadezinha onde existem centenas de gatos que lá são criados pelos habitantes numa relação sem dúvida muito íntima. Ele também tem um documentário sobre uma campanha política, e o tipo de filmagem caminha numa grande junção com os participantes. Ele tem outro filme que mostra a vida de um rapaz desajustado.


O cineasta japonês Kazuhiro Soda, que escreve, produz, dirige e edita seus filmes

Em todos os seus filmes, essa forma de conseguir eliminar as diferenças entre a equipe de filmagem, que é mínima, com dois ou três participantes, e os filmados é total. Kazuhiro é o anti-Hollywood, é o cineasta que mora nos Estados Unidos, mas faz arte no sistema da periferia.

Pelo que li sobre Kazuhiro Soda, a sua formação se fez em grande parte em Tóquio, onde estudou Religião na universidade. Em Nova York, estudou Artes Visuais. Vivemos claramente numa época em que residir numa cidade e trabalhar em qualquer outra traz vantagens. É sempre bom quebrar tabus.

 

Documentário Mental

 


por Celso Marconi, Crítico de cinema, referência para os estudantes do Recife na ditadura e para o cinema Super-8  | Texto original em português do Brasil

Exclusivo Editorial PV / Tornado


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