Agora que a poeira começa a assentar sobre a mais recente crise entre os EUA e o Irão é a oportunidade para reflectir, com ponderação e objectividade, se há a possibilidade de uma saída negociada para pôr fim ao conflito.
Por muito surpreendente que isto possa parecer há, neste momento, uma convergência dos objectivos de cada uma das partes, que pode levar a um entendimento para a resolução pacífica das principais divergências.
Os principais objectivos do Presidente dos EUA, Donald Trump, que importa referir para o caso vertente são:
- ser reeleito;
- vencer o Prémio Nobel da Paz;
- não envolver-se em mais guerras intermináveis;
- acabar com ou, pelo menos, diminuir a presença norte-americana no Médio Oriente;
- impedir a obtenção de armas nucleares e o desenvolvimento de mísseis balísticos pelo Irão;
- e parar ou mesmo reverter a expansão da influência e interferência da República Islâmica na vizinhança.
Por parte do Irão os seus principais objectivos são:
- a manutenção do regime teocrático; a retirada dos EUA da região, principalmente do Iraque;
- obter armas nucleares e mísseis balísticos;
- alargar a sua área de influência;
- e o levantamento das sanções.
Considerando que o objectivo primário, ao qual todos os outros subordinam-se, de cada um é, no caso de Trump, ser reeleito e no iraniano, a sobrevivência do seu regime, existem convergências possíveis. Os EUA podem trocar a sua retirada, mesmo que faseada, da região e o levantamento das sanções pelo abandono do nuclear, do programa de mísseis e da acção externa mais agressiva por parte do Irão.
Um entendimento com os iranianos permitiria a Donald Trump conseguir satisfazer uma das suas bandeiras de campanha, o fim dos envolvimentos dos Estados Unidos em guerras sem fim à vista. Poderia, assim, apresentar-se como um Presidente que cumpre com as suas promessas. E, além disso, que consegue, devido às suas capacidades pessoais de negociador, acordos melhores que aqueles que o seu antecessor conseguiu. Sublinhe-se que este tem sido um dos seus maiores desejos, como pode verificar-se pelos seus esforços em chegar a um entendimento com o líder da Coreia do Norte. Sendo este acordo fechado por si, ser-lhe-ia muito difícil quebrá-lo, pois passaria por um mau negociador. Mesmo tendo em conta que poderá haver um novo Presidente nos EUA pelo final do ano, dificilmente este teria condições para romper o acordado. Uma acção dessas não seria compatível com as críticas que tem sido desferidas contra Trump por ter abandonado o anterior acordo P5+1 com o Irão.
Para os dirigentes iranianos conseguir trocar o seu programa nuclear e de mísseis balísticos e a expansão regional pela retirada dos Estados Unidos e pelo levantamento das sanções, pode ser também um bom acordo. A situação económica do Irão é má e tem sido uma das causas do descontentamento popular, que tem-se traduzido em manifestações contra o regime. É de referir que o empenhamento na Síria e no Iraque é percepcionado pelos iranianos como um desperdício de recursos, tão necessários para o desenvolvimento do país. Também neste aspecto, o desaparecimento do gen. Qassem Soleimani pode ser benéfico, pois ele era o principal operacional do envolvimento do Irão no exterior.
Apesar de as eventuais negociações entre norte-americanos e iranianos parecerem condenadas ao fracasso, devido às divergências que à primeira vista parecem existir, uma avaliação mais objectiva, baseada nos fins de cada um, mostra que um eventual acordo é praticável. E se EUA e Irão chegarem a um entendimento é possível que Donald Trump consiga um dos seus maiores desejos, o Nobel da Paz.