É urgente moralizar o Montepio para recuperar a confiança dos associados e garantir a segurança das poupanças dos associados que estão aplicadas na Associação Mutualista.
Neste estudo analiso não só a forma como decorreu a assembleia geral realizada de 17 de maio a 16 de junho de 2021 (teve quatro sessões que realizaram em semana sucessivas) como aponto várias práticas que existem no grupo Montepio, que considero que não se coadunam com a ética mutualista que deviam ser rapidamente erradicadas pois estão a causar danos materiais e reputacionais ao Montepio.
E essas praticas, que confrontei o presidente da Associação Mutualista na assembleia, são nomeadamente as seguintes:
- O enorme numero de administradores que existe no Banco Montepio (16) que é igual ao da CGD, mas esta é 4,8 vezes superior ao Banco Montepio (contratam-se mais administradores e despede-se centenas de trabalhadores);
- A compra, em sistema de leasing, de viaturas de alta gama cujo custo ronda os 100.000€ para os administradores do Banco Montepio, um banco que tem apresentado prejuízos e que há 14 anos não transfere quaisquer dividendos para a Associação Mutualista quando esta tem aplicado no banco cerca 1900 milhões €;
- A falta de transparência que existe no banco e na Associação Mutualista que não divulgou nos relatórios e contas de 2020 a remuneração de cada um dos seus administradores, o que é feito pela CGD e pelo próprio BCP;
- A nomeação como “chairman” da companhia de seguros que o Montepio tem em Moçambique do ex-presidente da Lusitânia SA que causou enormes prejuízos ao Montepio e que foi afastado da seguradora do Montepio pelo regulador (ASF), garantindo assim a ele uma remuneração certamente igual aquela que antes recebia, parecendo como um verdadeiro premio aos danos causados à Associação Mutualista.
Estudo
É urgente moralizar o Montepio para recuperar a confiança dos associados e garantir a segurança das poupanças dos associados que estão aplicadas na Associação Mutualista
Este estudo tem como base as intervenções que fiz em duas das quatro sessões da Assembleia Geral da Associação Mutualista que se realizou entre 17 de maio e 16 de junho de 2021, em que participaram cerca de 300 associados. E decidi publicá-lo, por um lado, porque é importante que todos os associados saibam o que se passa no Montepio pois o conselho de administração pouco faz para os informar e, por outro lado, para que a nova administração que será eleita em setembro de 2021 ponha cobro rapidamente a estas práticas que estão a causar danos ao Montepio.
A Associação Mutualista e o Banco Montepio, que é o principal ativo da Associação Mutualista onde estão investidas a maior parte das poupanças dos associados, continuam a acumular prejuízos, mostrando que as respetivas administrações são incapazes de inverter a situação.
Em 2019, a Associação Mutualista teve 408,7 milhões € de prejuízos e, em 2020, mais 17,8 milhões € de prejuízos. Em dois anos apenas acumulou 426,5 milhões € de prejuízos. Como consequência, os seus Capitais Próprios (ATIVO, ou seja, o que possui, menos PASSIVO, ou seja, o que deve que inclui as poupanças dos associados) diminuíram, entre 2018 e 2020, em 449 milhões €. E isso ainda só foi possível com a consideração de 816,7 milhões € de Ativos por impostos diferidos em 2018 e de 867,5 milhões € de Ativos por impostos diferidos em 2020 que, como se sabe, não correspondem a qualquer ativo real não servindo para reembolsar as poupanças aos beneficiários.
Em relação ao Banco Montepio, situação não é diferente. Em 2020, os resultados foram negativos no montante de 80,6 milhões € a nível das contas consolidadas, que inclui os resultados das suas empresas, mas a nível de contas individuais, que se referem só à atividade do banco, os prejuízos atingiram 116 milhões €. No 1º trimestre de 2021, o Banco Montepio divulgou também resultados negativos no montante de 15,9 milhões €. Como consequência, os Capitais Próprios (diferença entre o Ativo e Passivo) do Banco Montepio diminuiu entre dez.2019 e março.2021 em 146,9 milhões €, o que agravou os seus rácios de capital criando dificuldades adicionais à concessão de crédito, ou seja, ao negócio bancário. Há 14 anos que o Banco Montepio não transfere quaisquer dividendos para a Associação Mutualista, o que significa que cerca de 60% das poupanças dos associados investidos no banco (1900 milhões €) têm tido rentabilidade nula ou mesmo negativa.
E o presidente da Associação Mutualista, em autêntico estado de negação total, ainda teve a coragem de afirmar na assembleia geral que tanto a Associação Mutualista como o Banco estavam a cumprir os seus planos de negócios e que a sua recuperação seria certa. Planos de negócios que preveem prejuízos elevados não deixa de ser insólito. Parafraseando Camões, eu diria como o fiz na assembleia, uma administração fraca faz fraca uma forte organização como é o Montepio. É neste contexto que certas práticas existentes no grupo Montepio, que denunciei na assembleia, ainda se tornam mais imorais e inaceitáveis à luz da ética mutualista, que agora divulgo para conhecimento dos associados, e que uma nova administração terá de erradicar.
Um Banco que se tornou uma agência de empregos bem pagos para um número enorme de Administradores e que, ao mesmo tempo destrói o emprego de centenas de trabalhadores
Em dezembro de 2020, a CGD tinha 16 administradores, e o Banco Montepio, que é 4,8 vezes mais pequeno, tinha também o mesmo número de administradores (16). E como isto já não fosse suficiente, na Informação do 1º Trimestre de 2021, em que o Banco Montepio divulga novamente resultados negativos (-15,9M€) pode-se ler a seguinte noticia:
“foi aprovada a nomeação de Jorge Paulo Almeida e Silva Baião como Administrador Executivo do Conselho de Administração do Banco Montepio para o período remanescente do mandato 2018/2021, tendo iniciado funções como Vogal Executivo em 22 de fevereiro de 2021”.
Agora já não são apenas 8 administradores executivos, passaram a ser 9, quando a CGD tem apenas 8. E os administradores executivos auferem uma remuneração muito superior aos dos não executivos como iremos ver. Ao mesmo tempo, só no período compreendido entre março.2020 e março.2021, o número de trabalhadores do banco é reduzido em 229 trabalhadores, e já foram anunciados mais centenas de despedimentos devido à incapacidade revelada pela administração que pensa que assim conduzirá o banco a lucros, o que tem o apoio do presidente da administração da Associação Mutualista.
A opacidade existente nas remunerações recebidas pelos membros dos Conselhos de Administração do Banco Montepio e da Associação Mutualista
No Banco Montepio e na Associação Mutualista verifica-se uma grande opacidade e falta de transparência em relação à remuneração recebida por cada um dos membros dos respetivos conselhos de administração que não são divulgadas, contrariamente ao que sucede no banco publico, a CGD, e mesmo em bancos privados, como o BCP em que elas constam dos respetivos relatórios e contas de 2020 (CGD na pág. 597, BCP na pág. 805). Nos Relatórios e contas quer da Associação Mutualista quer do Banco de 2020, tal informação é omitida, o que para além de ser contrário aos princípios de transparência que caraterizam o mutualismo revela também que esses administradores têm medo que os associados conheçam as remunerações e benefícios que auferem, certamente por serem excessivos. Apresenta-se, a seguir, um quadro com as remunerações fixas recebidas pelos administradores da CGD, um banco 4,8 maior que o Banco Montepio, para que os associados possam comparar com a pouca informação que consta do relatório e contas do Banco Montepio sobre esta questão e com dados que conseguimos obter.
Quadro 1 – Remunerações fixas do conselho de administração da CGD em 2020
No Relatório e contas do Banco Montepio de 2020 não se encontra qualquer quadro com a lista das remunerações de cada um dos administradores. O que existe são quadros com a despesa global com o conselho de administração de 2019 e 2020 que a seguir se transcrevem (págs. 225 e 226).
Quadro 2 – Gastos com o conselho da administração e outros do Banco Montepio em 2019
Em 2019, Banco Montepio gastou com o conselho de administração 3,812 milhões €, sendo 3,1 milhões € com remunerações e outros benefícios. Em 2020 foram os valores que constam do quadro 3.
Quadro 3 – Gastos com o conselho da administração e outros do Banco Montepio em 2020
Em 2020, os gastos com conselho de administração do Banco Montepio atingiram 4,792 milhões €, mais 25,7% do que em 2019, e os gastos com as remunerações 3,2 milhões €. Se fizermos as contas com a informação adicional que conseguimos obter, concluímos que no Banco Montepio um administrador não executivo ganha 6000€/mês (e se fizer parte de uma comissão recebe 9000€/mês), um administrador executivo 18.000€/mês, o presidente da comissão executiva 24000€/mês e o “chairman” 28000€ (o da CGD por opção não recebe nada). E isto num banco 4,8 vezes mais pequeno que a CGD. E há ainda os gastos em espécie (viatura de alta gama, gasolina, etc.).
Para que os associados possam compreender a despesa de 892.000€ com os custos de pensões de reforma e 681.000 com encargos com a Segurança Social dos administradores em 2020, que consta do quadro 3, é importante que saibam que, segundo os Estatutos quer da Associação Mutualista quer do Banco Montepio, os administradores, desde que tenham mais de 5 anos de serviço, têm direito a uma pensão de reforma paga por um Fundo de pensões financiado apenas pelo Montepio (os administradores não descontam nada) cuja formula de cálculo é a seguinte: por cada ano de serviço têm direito a uma pensão que é igual a 5% (se tiverem menos de 5 anos a percentagem é 4%) da remuneração que recebem. Isto para além da pensão da Segurança Social por descontarem a que o banco também contribui como dispões a lei.
Na Associação Mutualista verifica-se falta de transparência pois também não são publicadas as remunerações dos 4 administradores. Em 2020 (Relatório e contas, pág. 109), os órgãos de gestão da AMMG receberam 1,5 milhões € de “remunerações e outros benefícios”, o que dá um valor médio de 26.982€ por mês. Previsivelmente o presidente ganha um pouco mais (Tomás Correia recebia 31981€/mês), e os vogais um pouco menos que o valor médio (os vogais de Tomás Correia recebiam 28253€/mês). Os atuais não devem ganhar menos, mas urge esclarecer.
Viaturas de 100.000€ disponibilizadas aos Administradores do Banco Montepio
Na 4ª sessão da assembleia geral da Associação Mutualista confrontei o presidente do conselho da administração da Associação Mutualista com a seguinte imoralidade: Como é o Banco Montepio, com um desmesurado número de administradores, a quase totalidade deles sem qualquer experiência de banca comercial de retalho, e a apresentar prejuízos, estava a adquirir, em sistema de leasing, viaturas de alta gama, com preço que rondavam os 100.000€ para os administradores. Qual era a razão para a administração da AMMG, acionista dominante (99,9% do capital), aceitar tal imoralidade? Titubeando, não negou, mas respondeu que pensava que o preço rondava os 80.000€. Sejam viaturas de 100.000€ ou de 80.000€ que tem custos fiscais acrescidos (tributação autónoma de 35%) não deixa de ser imoral para um banco que tem apresentado prejuízos e despedido centenas de trabalhadores. Na Administração Pública, onde estou como gestor público, o governo fixou, e bem, o preço de aquisição para as viaturas utilizadas pelas chefias inferior a 30000€ e centraliza a sua compra. No grupo Montepio, apesar das graves dificuldades que enfrenta, que põem em risco as poupanças dos associados devido à acumulação de prejuízos, não há quaisquer limites e assiste-se a estas imoralidades. O mesmo se verifica na Associação Mutualista. É necessário que a nova administração ponha cobro a tudo isto.
Um Presidente da Lusitânia SA afastado pelo regulador (ASF) foi nomeado pela Administração do Montepio “Chairman” da seguradora do Montepio em Moçambique certamente a receber a mesma remuneração que tinha na Lusitânia SA, como premio pelos danos causados ao Montepio
Mas as imoralidades no grupo Montepio que urge por cobro não se limitam aos casos referidos. Durante a assembleia confrontei o presidente da Associação Mutualista com mais uma situação escandalosa que ele não respondeu. E essa situação é a seguinte: o ex-presidente da Lusitânia SA, que acumulou prejuízos durante os 7 anos em que esteve nela, obrigando o Montepio a recapitaliza-la com 170 milhões € (registados em instrumentos de capital), que vendeu património valioso (na praça de Espanha e na Avª Augusto de Aguiar) a preços que pouco tempo depois quem comprou vendeu com milhões € de lucro, cujas praticas de gestão levou a CMVM a aplicar uma coima de 20 milhões € à Lusitânia SA, e cuja continuidade na seguradora foi recusada pelo regulador (ASF), foi nomeado, pela administração da Associação Mutualista, como “chairman” da seguradora que o Montepio tem em Moçambique certamente com uma remuneração muito igual à que recebia na Lusitânia SA. Confrontado com esta imoralidade na assembleia, o presidente da Associação Mutualista manteve-se mudo, incapaz de a justificar.
Uma Assembleia Geral da Associação Mutualista insólita
Há um aspeto positivo nesta assembleia, diferente do passado, que não se pode deixar de referir. Contrariamente ao que acontecia com Tomás Correia, nas poucas assembleias de associados realizadas, qualquer debate era impedido com uma moção apresentada por um dos seus apoiantes para passar logo à votação. Nesta isso não aconteceu. Daí a razão de ela se ter alongado por 4 sessões em semanas sucessivas. É certo que as matérias eram muitas, pois incluía o Regulamento eleitoral, o PAO-2021, o Relatório e Contas de 2020, e a apreciação da gestão da administração. No entanto, não deixaram de acontecer factos insólitos que é importante que os associados conheçam para poderem formular uma opinião sobre a situação na Associação Mutualista.
O 1º facto insólito diz respeito ao ponto 5 da Ordem trabalhos. “Apreciação da gestão e da fiscalização”. Na sessão de 9.6.2021, o presidente da mesa da assembleia geral considerou que esta matéria, por envolver a apreciação de pessoas, tinha que ser feita por voto secreto. Na sessão seguinte da assembleia, já com a presença do padre Melícias como presidente, este considerou que não era necessária qualquer votação.
O 2º facto insólito, fora da ordem de trabalhos, mas com cobertura da mesa, foi o aparecimento de um diretor da Associação Mutualista (de nome Pitacas) que leu um extenso artigo teórico (de revista) sobre o mutualismo atacando a supervisão do regulador (ASF). Na linha da administração, para ele a segurança das poupanças dos associados, que só é possível com um regulador forte, é uma questão menor, o que é importante é a retórica sobre o mutualismo. Mas assim vai o mutualismo e a Associação Mutualista.