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Quarta-feira, Julho 17, 2024

Efeitos das guerras que estão em curso na Europa

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

A guerra económica feita à custa dos europeus está a destruir as empresas e a vida das famílias e a promover a especulação devido à inercia dos governos que nada fazem

Neste estudo analiso os efeitos das 2 guerras que estão em curso na Europa – a guerra que utiliza armas e a guerra económica ignorada pelos media- mostrando que ambas têm efeitos devastadoras , sendo na 1ª sacrificados os ucranianos e na 2ª guerra utilizados os europeus. Analiso a escalada dos preços nos combustíveis mostrando que ela se deve ao aumento das margens de refinação e comercialização das empresas e que apesar de existir uma lei que permite ao governo controlar essas margens ele tem-se recusado a fazer. E termino afirmando que devemos apoiar humanitariamente no que for possível os refugiados ucranianos mas o governo não pode esquecer e não apoiar os 2 milhões de portugueses pobres que já estão a sofrer enormemente devido à escalada de preços causada pela guerra económica.

Estudo

A guerra económica feita à custa dos europeus está a destruir as empresas e a vida das famílias e a promover a especulação devido à inercia dos governos que nada fazem

Embora seja incomodo falar de coisas de que ninguém se atreve a falar nesta altura, porque pode ser acusado de apoiar Putin, no entanto é preciso ter a coragem de lembrar que os europeus estão a ser confrontados com os efeitos de duas guerras, qual delas a mais devastadora. A 1ª guerra, é aquela que os media só falam, como fosse a única, que é a invasão e agressão da Ucrânia pela Rússia que está a destruir a Ucrânia e causar a fuga em massa da sua população. A 2ª guerra, não menos devastadora, é a guerra económica que se está virar contra os próprios europeus, que resulta das decisões dos seus próprios governos através da multiplicação de sanções à Rússia, muitas delas decididas à pressão por imposição dos EUA, e sem avaliar o seu impacto real e global que, por efeito de bumerangue, estão a atingir e mesmo a destruir também as economias e a própria condições de vida dos europeus, nomeadamente as mais frágeis e débeis como é a portuguesa, e cujos efeitos dramáticos a população só agora começou a sentir. A escalada dos preços, em que os dos combustíveis é o ex. mais visível, a paralisação de empresas e mesmo de setores de atividade económica, devido a custos incomportáveis, as ruturas no abastecimento, o disparar previsível do desemprego, a quebra acentuada da atividade económica, o aumento da pobreza e das desigualdades são consequências da guerra económica. Na 1ª guerra estão a ser sacrificados os ucranianos, nesta segunda guerra estão a ser utilizados os próprios europeus.

 

A especulação nos preços dos combustíveis que está a destruir as empresas e a vida dos portugueses, mas o governo não quer controlar apesar de existir uma lei para isso

Uma das consequências mais visíveis da guerra económica é o vertiginoso aumento do preço da energia, causado pelas sanções aplicadas a um dos maiores produtores de petróleo e gás do mundo (a Rússia) e também devido à forte especulação que se apoderou deste mercado. O quadro 1, com dados divulgados pela Direção Geral de Energia e Geologia do Ministério da Economia mostra a variação preços, taxas e impostos dos combustíveis entre 21 de dezembro de 2021 e 23 de março de 2022 no nosso país.

Entre dez.2021 e março.2022, os preços de venda ao público (PVP) aumentaram 34,6 cêntimos por litro no gasóleo e 25,7 cêntimos por litro na gasolina 95. Nestes aumentos totais, 88,3% no gasóleo, e 87,7% na gasolina têm como causa o aumento dos preços sem impostos e taxas segundo a DGEG, ou seja, a parcela que reverte na sua totalidade para as empresas (aumento nas margens de refinação e de comercialização). A guerra está a ser uma grande manancial de lucros para as petrolíferas devido à inercia e à recusa do governo em defender os consumidores. E como tudo isto já não fosse suficiente as gasolineiras já anunciaram novos aumentos de 15 cêntimos por litro no gasóleo e de 8 cêntimos por litro na gasolina, o que determinará mais um aumento de 838,7 milhões € de despesa que os consumidores terão de suportar por ano. A solução defendida pela U.E. e pelos governos europeus de substituir o petróleo e gás russo por petróleo e gás americano não resolve o problema pois o gás e o petróleo americano, que é extraído do xisto, é muito mais caro o que tornará a economia europeia menos competitiva em relação as que terão acesso a energia mais barata (China, India, Turquia, etc.) e a vida mais cara para os europeus, e é insuficiente para suprir a totalidade das necessidades da Europa. A dependência em relação à Rússia passará para os EUA que ditará os preços pois já não tem a concorrência de um grande produtor de gás e petróleo. A vassalagem da Europa aos EUA aumentará e a submissão aos interesses americanos acentuar-se-á deixando a U.E. de ter uma voz independente e respeitada no mundo, o mesmo acontece à ONU que desapareceu.

 

É necessário apoiar os ucranianos que abandonaram o seu país para salvar as suas vidas, mas é preciso que o governo não se esqueça dos dois milhões de pobres que existem em Portugal e não os trate desigual

O gráfico 1, com dados do INE, dá bem uma ideia da dimensão da pobreza em Portugal, os grupos populacionais mais atingidos por ela, e como ela está a crescer rapidamente.

Já em 2020, 18,4% da população do país, o que correspondia 1.910.000 de residentes, estava a viver abaixo do limiar da pobreza,  e isto após receber todos os apoios sociais. Mas existiam grupos da população importantes em que a taxa de pobreza era muito mais elevada, como os desempregados (46,5% eram pobres) e “Outros inativos” (30,8% eram pobres). Neste mesmo ano (2020) a pensão média de invalidez era apenas de 401€ por mês, a de velhice 477€ e da sobrevivência de apenas 245€/mês. Em 31 de dezembro de 2020 o número total de pensionais (invalidez, velhice e sobrevivência) era 2.969.728 (em 26 março de 2022 eram 2.974.293).

Para apoiar os 2 milhões de portugueses pobres, cuja situação está-se a agravar enormemente com a escalada dos preços mesmo dos bens essenciais à vida, o atual governo pretende fazer o pagamento de uma prestação social de 60€, feita apenas uma vez (em abril), o que é desumano, e só para as famílias abrangidas pela tarifa social de eletricidade, que são 760.000, menos de metade dos que estão no limiar da pobreza. Era necessário que o governo não fizesse discriminação na forma como apoia os refugiados ucranianos e os portugueses pobres que estão a sofrer os efeitos dramáticos da guerra económica, que também mata pela forme e pela doença, até para que a extrema-direita não cresça ainda mais. E que não se esqueça também dos pensionistas e trabalhadores cujas pensões e salários e poder de compra estão a ser “devorados” pela escalada de preços.

 

Um presidente americano que vem à Europa para fazer declarações incendiárias e irresponsáveis, que depois têm de ser corrigidas até pelo próprio departamento de estado, e que só sabe anunciar que vai ser uma guerra prolongada e o espectáculo dos líderes europeus a prestarem vassalagem

Biden veio à Europa não para ajudar os europeus a encontrar uma solução para a guerra, mas sim para criar mais obstáculos a que se ponha termo à guerra. As declarações de Biden irresponsáveis e incendiárias sem sentido de Estado, ou fruto de limitações cognitivas, visando acirrar Putin, só confirmaram que os EUA estão interessados em prolongar a guerra (“É uma guerra prolongada”, afirmou Biden, como  Zelensky que procura arrastar a NATO para um confronto nuclear), e para isso os EUA não se importam de sacrificar os ucranianos para pôr a Europa de joelhos e dependente dos EUA. Biden mostrou que está mais interessado em vender/fornecer armas do que dar ajuda humanitária. Em 26/3/2022, o número de ucranianos que abandonaram o país para escapar aos horrores da guerra e para salvar a vida, eram já 3,77 milhões, que não para de aumentar, que merecem todo o apoio e solidariedade humana possível. Este enorme número de refugiados tem consequências económicas, sociais e políticas muito pesadas para os países que os acolhem que é necessário não ignorar. Para se avaliar a hipocrisia do EUA, no gigantesco esforço humanitário que é necessário fazer, basta comparar as declarações incendiárias e irresponsáveis de Biden que só criam obstáculos a um acordo com a Rússia que acabe rapidamente com a guerra, evitando a destruição total de um país e sofrimentos enormes à sua população, com a “oferta” de Biden da disponibilidade dos EUA para receber apenas 100.000 refugiados ucranianos, o que corresponde a menos de 2,7% do total de refugiados até este momento, e prometeu uma “esmola” de 1000 milhões de dólares, o que dividido pelo total de refugiados daria apenas 265 dólares (241€) a cada refugiado. Estes atos dos EUA e os que levaram ao cerco da Rússia pela NATO, que foi o pretexto utilizado por Putin pata iniciar a guerra são esclarecedores e devem merecer profunda reflexão de todos.


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