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Sábado, Novembro 2, 2024

Egito: risco de execução após julgamentos injustos

Novo comunicado sobre o risco de execução de 36 homens após julgamentos em tribunais de emergência no Egito.

O estado de emergência, que estava em vigor desde abril de 2017, permitiu a criação destes “tribunais de emergência para a segurança do Estado”, que são intrinsecamente injustos. Apesar do levantamento do estado de emergência do Egito, estes 36 homens continuam a correr perigo depois de terem sido condenados na sequência de julgamentos profundamente injustos. Vão também prosseguir os julgamentos em curso de centenas de pessoas, entre as quais defensores de direitos humanos e manifestantes pacíficos.

Philip Luther, diretor de Investigação e Advocacy da Amnistia Internacional para o Médio Oriente e Norte de África, refere que “até ao momento, o Egito já executou pelo menos 83 pessoas este ano, algumas na sequência de condenações em processos onde não foi visto um relance de justiça”. Acrescenta ainda que “o presidente egípcio deve anular imediatamente todas as sentenças de morte proferidas pelos tribunais de emergência e ordenar novos julgamentos à luz de tribunais regulares sem recurso à pena de morte. Impor a pena de morte em julgamentos extremamente injustos, em que é recusado aos arguidos o direito de recurso, constitui uma privação arbitrária do direito à vida”.

Nos julgamentos destes tribunais de emergência, os arguidos são frequentemente sujeitos a múltiplas violações do direito a um julgamento justo. É-lhes impedido terem direito a tempo e instalações adequadas para a preparação da sua defesa, direito de comunicar com advogados da sua própria escolha e o direito a uma audiência pública.

“Até ao momento, o Egito já executou, este ano, pelo menos 83 pessoas, algumas na sequência de condenações em processos onde não foi visto um relance de justiça”

Philip Luther

O comunicado especifica o caso do julgamento de al-Behira, onde a decisão do juiz se fundamentou apenas em “confissões” obtidas por meio de tortura e testemunhos de polícias. Aos advogados de defesa, foi-lhes impedido interrogar as testemunhas de acusação, assim como analisar provas que poderiam ter exonerado os arguidos.

Vários arguidos disseram ter sido torturados durante a detenção. Uma fonte verificada pela AI relatou que um homem condenado à morte afirmou ter sido espancado e que lhe tinham sido dados choques elétricos durante o interrogatório, até que ele se viu obrigado a dar uma “confissão” que foi gravada em vídeo, e que mais tarde tentou retirar.

Apesar do levantamento do estado de emergência no Egito, pelo menos 36 homens continuam em risco de execução, na sequência de condenações extremamente injustas por tribunais de emergência, relatou a Amnistia Internacional. A organização tem ainda conhecimento de dois homens que foram executados após julgamentos indevidos nos últimos três anos e apela a que sejam concedidos, a estas 36 pessoas, novos julgamentos que cumpram as normas internacionais de julgamento justo sem recurso à pena de morte.

O estado de emergência, que entrou em vigor em abril de 2017, permitiu a criação destes “tribunais de emergência para a segurança do Estado”, que são intrinsecamente injustos. Mesmo com o fim do estado de emergência no país, prosseguem os julgamentos em curso de centenas de pessoas, entre as quais defensores de direitos humanos e manifestantes pacíficos.

“O presidente egípcio deve anular imediatamente todas as sentenças de morte proferidas pelos tribunais de emergência e ordenar novos julgamentos à luz de tribunais regulares sem recurso à pena de morte. Impor a pena de morte em julgamentos extremamente injustos, em que é recusado aos arguidos o direito de recurso, constitui uma privação arbitrária do direito à vida”, afirmou Philip Luther, diretor de Investigação e Advocacy da Amnistia Internacional para o Médio Oriente e Norte de África.

“Até ao momento, o Egito já executou, este ano, pelo menos 83 pessoas, algumas na sequência de condenações em processos onde não foi visto um relance de justiça. As autoridades do país deveriam estabelecer imediatamente uma moratória sobre a aplicação da pena de morte, com vista à abolição definitiva deste castigo cruel, desumano e degradante”.

Uma manifestante faz o sinal de vitória no dia 12 de fevereiro de 2011 durante uma manifestação de solidariedade global para a mudança política no Egipto, na praça Trafalgar, em Londres (© CARL DE SOUZA/AFP via Getty Images )

As autoridades egípcias executaram Ibrahim Ismail em dezembro de 2019 e Moataz Hassan em julho de 2021. Ambos foram condenados por homicídio e condenados à morte em dois julgamentos distintos por tribunais de emergência. Nenhum dos dois foi autorizado a apresentar um recurso.

Nos julgamentos destes tribunais de emergência, os arguidos são frequentemente sujeitos múltiplas violações do direito a um julgamento justo, não usufruindo, por exemplo, do direito a tempo e instalações adequadas para a preparação da sua defesa, do direito de comunicar com advogados da sua própria escolha e, até, do direito a uma audiência pública.

Condenados à morte, sem direito a recurso

Destes 36 homens que correm atualmente risco de execução, dezasseis viram a sua pena de morte ser atribuída por um tribunal de emergência em Rashed, a 29 de julho de 2021.Nove foram condenados por homicídio devido a um ataque a um autocarro da polícia em al-Behira, localizado a noroeste do Cairo, em agosto de 2015, que matou três polícias e feriu outros, anos antes de o estado de emergência ser declarado. Os restantes sete foram condenados por terem ajudado nesse homicídio. Os outros 22 homens condenados à morte foram condenados por homicídio, bombardeamentos e filiação em grupos terroristas pelos tribunais de emergência entre 2019 e 2021.

No julgamento de al-Behira, a decisão do juiz fundamentou-se apenas em “confissões” obtidas por meio de tortura e testemunhos de polícias. Aos advogados de defesa, foi-lhes impedido interrogar as testemunhas de acusação, assim como analisar provas que poderiam ter exonerado os arguidos. Além disto, o juiz reconheceu no veredicto que os advogados dos arguidos não estavam presentes durante o interrogatório dos seus clientes pelos procuradores.

Vários arguidos disseram ter sido torturados durante a detenção. Uma fonte verificada pela AI relatou que um homem condenado à morte afirmou ter sido espancado e que lhe tinham sido dados choques elétricos durante o interrogatório, até que ele se viu obrigado a dar uma “confissão” que foi gravada em vídeo, e que mais tarde tentou retirar.

Dois irmãos condenados à morte neste processo – Ahmed al-Zarea, de 31 anos, e Al-Motaseem al-Zarea, de 28 anos- foram mantidos incontactáveis desde a sua detenção a 31 de agosto e 4 de setembro de 2015, respetivamente, até 14 de setembro de 2015. Uma fonte familiarizada com o seu caso referiu à Amnistia Internacional que os dois irmãos foram sujeitos a espancamentos e choques eléctricos por polícias da Agência Nacional de Segurança (NSA), uma agência policial secreta, durante o período de detenção.

Os agentes da NSA ignoraram a ordem de um juiz para os libertar na pendência de investigações a 26 de fevereiro de 2018. Em vez de o cumprirem, transferiram os irmãos para um local secreto, sujeitando-os assim a desaparecimento forçado. A 7 de abril do mesmo ano, foram levados a um procurador e interrogados sobre acusações de “pertencer a um grupo terrorista” e “protestar ilegalmente”. Foram novamente colocados em prisão preventiva até um juiz ordenar a sua libertação provisória a 9 de junho de 2018. A NSA forçou-os a apresentarem-se semanalmente nos seus escritórios como parte de uma medida de liberdade condicional extrajudicial referida pelas vítimas e pela agência como “vigilância”.

Os irmãos foram detidos separadamente nas conhecidas prisões “Tora Maximum Security 1 ‘al-Aqrab’” e “Maximum Security 2” e proibidos de receber visitas familiares. No total, a NSA acusou Ahmed al-Zarea em cinco casos separados e Al-Motaseem em dois casos separados, com todas as acusações relacionadas com a pertença a um grupo terrorista e manifestação ilegal. No único caso que passou a julgamento, dois tribunais distintos absolveram Ahmed al-Zarea de todas as acusações.

“Ahmed Al-Zarea e Al-Motaseem Al-Zarea foram sujeitos a variadas violações de direitos humanos, incluindo tortura repetida, desaparecimento forçado, detenção arbitrária prolongada e graves violações dos seus direitos a um julgamento justo. Atualmente, as suas vidas estão em risco. As autoridades devem assegurar que as “confissões”extraídas através de tortura ou coerção nunca sejam utilizadas como prova em tribunal, investigando ainda  todas as alegações de desaparecimento forçado e tortura”, declarou Philip Luther.

Contexto

A 25 de outubro de 2021, o Presidente Abdel Fattah Al-Sisi anunciou que não prolongaria o estado de emergência do Egito, em vigor desde abril de 2017 devido ao duplo bombardeamento de duas igrejas que matou 45 pessoas.

O artigo 19º da lei que rege o Estado de emergência estipula que os julgamentos em curso devem continuar mesmo depois de o Estado de emergência já não estar em vigor. O presidente, contudo, mantém o poder de autorizar, anular ou comutar veredictos, e ainda de ordenar um novo julgamento.

Em setembro de 2021, o Egito lançou uma estratégia nacional de cinco anos em matérias de direitos humanos, que estipula que o direito à defesa em casos de pena de morte está profundamente ligado ao direito à vida. A estratégia também assinalou a necessidade de implementar o requisito constitucional de permitir aos réus recorrer das sentenças de todos os tribunais penais.

O Egito executou pelo menos 83 indivíduos em 2021, muitos dos quais foram condenados em julgamentos injustos. Alguns foram executados em segredo, com membros da família e entes queridos deliberadamente mantidos desinformados e sem poderem realizar uma última visita, o que infringe a lei egípcia.

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