Entrevista com Wilson Tavares, jovem cientista angolano, sobre vacinas e curas do Covid-19
O Covid-19 está a espalhar-se pelo mundo, há mais de 96 mil infectados, o número de casos irá aumentar de forma significativa e os cientistas procuram vacinas e possíveis curas. Wilson Tavares, investigador angolano, disse o que pensa sobre o Coronavírus.
O Centro de Controlo e Prevenção de Doenças da China refere que a taxa de mortalidade provocada pelo Covid-19 varia de acordo com a idade, género e condição de saúde. A maior percentagem de casos mortais atinge pessoas idosas e com doenças cardiovasculares, diabetes, doenças respiratórias e hipertensão.
Diversos especialistas consideram que do ponto de vista da saúde pública, a questão colocada pelo COVID-19 é a elevadíssima taxa de contágio. Até ao dia 5 de Março (19 horas de Angola), em vários continentes, o maior número de casos confirmados já é superior a 96 mil e estima-se que rapidamente irá aumentar muito, muito mais.
Lista de países com mais casos confirmados de Covid-19 até ao dia 5 de Março de 2020
China | 80,409 |
Coreia do Sul | 6,088 |
Irão | 3,513 |
Itália | 3,089 |
Diamond Princess (navio cruzeiro) | 706 |
França | 377 |
Alemanha | 349 |
Japão | 317 |
Espanha | 200 |
EUA | 129 |
Singapura | 117 |
Reino Unido | 115 |
Total | 96,483 (em 5 minutos passou para 97,252) |
Genomas devem ser sequenciados para compreensão dos mecanismos da disseminação e identificação de potenciais mutações
O Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT) da Universidade Nova de Lisboa, actualmente dirigido pelo angolano Doutor Filomeno Fortes, especialista em malária e doenças tropicais, envolve vários investigadores da lusofonia.
Nesse grupo de investigadores está incluído o angolano Wilson Manuel Lima Tavares, um jovem com apenas 29 anos de idade, que decidiu realizar o doutoramento em Ciências Biomédicas no prestigiado Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT) da Universidade Nova de Lisboa. O Jornal Tornado também tomou conhecimento de que o mesmo se candidatou ao Concurso de Bolsas de Mérito do Top 600 das melhores universidades do mundo oferecido pelo Governo de Angola.
Wilson tem um percurso muito peculiar. Jovem muito alegre, simples, íntegro e sempre optimista, foi sempre um estudante de excelência.
Licenciou-se em Biomedical Sciences (Ciências Biomédicas) pela Coventry University (Inglaterra), onde realizou uma investigação coordenada pelo Prof. Yvonne Elliott. Ainda em Inglaterra, concluiu o mestrado em Biomedical Blood Sciences (Ciências Biomédicas do Sangue) pela Keele University, Stoke-On-Trent (Inglaterra) com uma dissertação intitulada “The growth of cochlear fibrocites for potential cellular transplantation therapy”, sob coordenação do Prof. David Furness (Professor de Cellular Neuroscience).
Após muita insistência, Wilson Tavares aceitou expressar a sua opinião sobre o Covid-19, mas, antes, começou por defender o imperativo de que os países, nomeadamente os africanos, deviam investir mais na investigação científica:
É extremamente importante que os vários países sintam a necessidade de investir em investigação científica para contribuir para a elucidação de fenómenos de natureza biológica.
Por intermédio da publicação de livros e artigos científicos, participações em conferências e congressos estas divulgações podem ser usadas para implementar políticas de saúde de forma a maximizar a esperança de vida dos cidadãos, dos seus respectivos países.
Entrevista
Quer fazer algum comentário pontual sobre a investigação científica na Europa?
Na Europa, nomeadamente em países como Alemanha, Reino Unido, Finlândia, Suécia, Dinamarca e Noruega, verifica-se a existência de uma certa complexidade inerente entre a tomada de decisão política e a investigação científica.
Na minha opinião, Portugal é um exemplo a seguir, após cerca de 40 anos de democracia e 30 anos de integração europeia, este país tem vindo a superar o atraso científico estrutural dos últimos 20 anos.
O Instituto Dr. Ricardo Jorge é uma instituição de referência no espaço da lusofonia. Nesta instituição, não só se desenvolve investigação, como também se promove o rastreio de portadores de determinadas patologias. Em concreto, qual é o trabalho que desenvolve no Instituto?
Para além do que referiu, neste Instituto também se presta apoio ao diagnóstico pré-natal e clínico, genotípico e fenotípico na população.
Eu exerço funções na unidade de investigação e desenvolvimento do Departamento de Genética Humana, e sou responsável pela identificação e caracterização de mutações em genes associados com o metabolismo do ferro e hemoglobinopatias (talassémias, anemia das células falciformes e variantes da hemoglobina).
Actualmente, há muitas versões, ou mesmo especulações sobre as vacinas e possíveis curas do coronavírus. Uma vez que, a título de exemplo, há países que usam vacinas como H1N1. Quer acrescentar mais alguma coisa sobre esta matéria?
No fórum científico que conta com a presença de especialistas em saúde pública, virologistas e epidemiologistas, ainda se sobrepõem algumas incógnitas relativamente ao novo coronavírus, o SARS-CoV-2, que causa a forma do covid-19.
Os cientistas, de forma incansável, tudo fazem para maximizar os seus conhecimentos baseando-se nas sequências específicas de ADN do vírus que foram disponibilizadas pelos próprios chineses, que publicaram a sequência completa do genoma viral.
Em todos os indivíduos com resultados positivos para o coronavírus, os seus genomas devem ser sequenciados de imediato, para se compreender os mecanismos da disseminação e para identificar potenciais mutações que possam influenciar a evolução do vírus.
(nota do Jornal:genoma é toda a informação hereditária de um organismo que está codificada no ADN de um ser vivo)
Mas, não é isso que fazem as indústrias farmacêuticas e instituições de pesquisa?
Actualmente, indústrias farmacêuticas e instituições académicas e de investigação abraçam este desafio que é de desenvolver protótipos de vacinas e aplicá-los em animais, nomeadamente em camundongos para testar os seus efeitos. Se assim os resultados forem bem-sucedidos, testes pré-clínicos serão implementados, e somente por último é que serão testados em humanos.
Consegue assegurar-nos em que ano teremos no mercado uma vacina para o coronavírus?
Possivelmente no ano 2021, contudo, a existência de diversas vacinas em desenvolvimento é uma realidade, mas os primeiros ensaios clínicos deverão iniciar no mês de Junho.
Devido à complexidade das características deste vírus, e a facilidade que tem em adquirir mutações, cientistas estudam a possibilidade de se usar mARN (o ARN mensageiro), o material genético que é proveniente do ADN, que é necessário para produção de proteínas do coronavírus.
Este produto é injectado no organismo dos pacientes que contraíram o vírus, é o objetivo das vacinas, e para o coronavírus não é excepção, que é a estimulação de células imunitárias para reconhecerem a presença dos vírus com a finalidade de se desencadear uma resposta imunitária, de forma a combatê-lo mais eficazmente.
A ministra da saúde de Angola assinou um despacho a proibir a entrada em Angola de cidadãos estrangeiros provenientes de quatro países com casos registados de coronavírus (COVID-19). Enquanto investigador africano, o que aconselharia aos países que ja contraíram casos de coronavírus?
Na minha opinião não existe necessidade de se entrar numa onda de alarmismo, mas também não se deve deixar de tomar as medidas de segurança aconselhadas e previstas nos protocolos.
Enquanto durar a epidemia, há necessidade de se evitar viagens turísticas para os países mais afectados, o cancelamento de grandes eventos desportivos e culturais, e evitar espaços de lazer como praias, idas a conferências e congressos, naturalmente, e as medidas de higiene pessoal (lavar bem as mãos, etc.).
A todo custo, devem ser monitorizadas as entradas e saídas dos respectivos países, e esforços devem ser feitos para se identificar o paciente zero, com a finalidade de se conter o vírus, se for um caso importado, pois, o objetivo principal é evitar que não aconteça uma transmissão local, como decorreu na China e em outros países.
Dr. Wilson Tavares, muito obrigado pelo seu valioso testemunho. Votos de muitos sucessos no âmbito do seu doutoramento em Ciências Biomédicas.
Ora essa. Eu é que agradeço a vossa simpatia.
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